quinta-feira, 18 de março de 2021

Gabriela Prioli -Sua natureza é a traição

- Folha de S. Paulo

Bolsonaro não consegue evitar

Muito se discutiu sobre qual seria a reação do presidente Bolsonaro ao fato de seu maior adversário político voltar à arena. Alguns esperavam a eterna moderação que nunca vem, já que agora Bolsonaro teria um incentivo de cortejar os setores empresariais que detestam Lula. Outros temem que a presença de um líder cujo governo ainda é lembrado pelos projetos sociais faça o presidente deixar de lado uma pretensa austeridade e focar no populismo que consiga votos.

Seu egocentrismo transforma em estratégia governar para os poucos que o idolatram cegamente. Sem remorso, queimará todos os outros aliados de ocasião na fogueira: centrão, militares, empresários ou policiais.

É como na fábula do sapo e do escorpião. Os dois afundam, pois o escorpião não consegue ir contra os seus instintos. A verdade é que ele adota a sua natureza como método e reluta em se distanciar dela.

Bolsonaro precisa de Arthur Lira mais do que Arthur Lira precisa de Bolsonaro. Apenas com ele será possível bloquear um impeachment, manter uma base de governo, para acalmar os empresários que ainda acreditam em reformas, e impedir que busquem outra solução para 2022. No entanto, ele resolve fritar a indicação de Lira para o Ministério da Saúde, que a tinha defendido publicamente nas redes. Por quê?

Porque seu ego inflado não permite que ele assuma que é uma peça altamente substituível. No fundo, ele sabe que continua sendo um deputado do baixo clero e, por isso, precisa continuar se reafirmando como o dono da caneta bic.

Se o poder verdadeiro é silencioso, a estridência do presidente torna transparente a sua limitação. A fragilidade de Bolsonaro é a mistura de sua vaidade com sua insegurança. Ao mesmo tempo em que se pavoneia para os fanáticos como grande líder, ele sabe que não se reelegerá ao som apenas daqueles que estouram fogos de artifício no STF. A cada passo em falso, fica mais perto de voltar às suas raízes: do nada para o nada.

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