Porque
chegamos a esta situação?
Qual
a responsabilidade de cada um de nós frente a esta tragédia que estamos vivendo?
Qual
a responsabilidade dos que governam, da cidadania e da sociedade em geral?
A
maneira como o Brasil enfrentou e está enfrentando a pandemia é causa e/ou
consequência da sociedade brasileira historicamente construída ou é
responsabilidade dos atuais governantes da Federação?
São
estas as questões a ser enfrentadas por cada um e por todos nós se quisermos
efetivamente superar a trágica realidade vivida atualmente, em plena pandemia,
por toda a sociedade brasileira.
Desde
o início da pandemia, a sociedade brasileira foi desafiada a mudar a sua
maneira de viver, de se comportar nas suas relações políticas, econômicas e
sociais frente aos desafios colocados para o enfrentamento da pandemia, causada
pelo Covid 19.
Então,
a atuação governamental e os resultados obtidos até agora no combate à pandemia
no Brasil ficaram muito a desejar: não estão comprometidos com as agendas
sociais, econômicas e ambientais necessárias para o enfrentamento dos desafios
trazidos pela pandemia à sociedade brasileira, particularmente na área da
saúde.
Ainda
não temos um Programa Nacional de Vacinação confiável, com metas e cronogramas
estabelecidos que tranquilize e passe confiança à sociedade brasileira,
demonstrando a incapacidade governamental de planejar ações básicas de combate
à pandemia – caso explícito da compra de vacinas: as evidências demonstram que
o Governo Federal foi e está sendo negligente – não planejou a compra, e o
processo de vacinação em curso é a mais completa tradução da tragédia. O ritmo de vacinação continua lento por falta
de vacinas, diferente da situação de muitos países da América Latina, cuja
população já tem disponibilidade de vacinas de diferentes países, inclusive da
China e da Rússia.
Assim, a ideologização da questão e a falta de planejamento caminharam juntos, com consequências graves para a sociedade brasileira. Aqui a maior responsabilidade é do Governo Federal, que minimizou e minimiza a gravidade da situação vivida pela população, desde o início da pandemia. Some-se a isto a desconstrução e as inúmeras mudanças acontecidas nesse período na área de saúde, inclusive com a nomeação de três Ministros no período, o que retrata a maneira como o Governo Federal enfrentou e está enfrentando a situação. O comportamento bipolar de Bolsonaro, no dia-a-dia no exercício da Presidência, vem agravando a situação.
O
cenário político atual é de judicialização da Saúde entre os entes federativos:
os governadores foram ao Supremo Tribunal Federal para terem o direito de
comprar as vacinas. Ao mesmo tempo foi deflagrado um movimento de governadores
e prefeitos para a compra direta de vacinas – aumentando a pressão de toda a sociedade
que quer ter a vacina como o único instrumento efetivo de combate à Covid 19.
A
situação atual é caótica e preocupante frente à crise econômica e de saúde
pública que vive o Brasil. Cenas de horror, de mortes por falta de leitos
hospitalares e de oxigênio, da falta de assistência médica em geral, inclusive
na área privada, coloca, após um ano de pandemia, a dimensão real da tragédia
brasileira – a incapacidade do Governo Federal, dos Estados e dos Municípios de
construir um programa mínimo, em diálogo com a sociedade, para o enfrentamento
dos problemas urgentes provocados pela pandemia no Brasil.
Os
brasileiros estão aterrorizados. A insegurança é total. Os dados em relação à
contaminação e às mortes são assustadores. São milhões de contaminados e
milhares de mortos – colocando o Brasil no segundo lugar em relação a
contaminados e mortos pela Covid 19 no cenário internacional.
Qual
o limite da tragédia?
Banalizou-se
a morte pela Covid-19 como um fenômeno natural: “todo mundo morre”, segundo o presidente
Bolsonaro. A pandemia já faz parte do cotidiano da sociedade. As estatísticas
negadas pela área federal estão sendo sistematizadas e espetacularizadas por um
conglomerado da área de comunicação, chegando diariamente às nossas casas. Hoje,
já não existem leitos disponíveis na área pública, nem privada, na maioria das
capitais brasileiras.
Vivemos
o pior momento da pandemia no Brasil. A população continua desnorteada. O Governo
Federal, como principal responsável pela Política Nacional de Combate à
Pandemia, com sua política negacionista, só faz agravar a situação com falas
que agridem ao bom senso e à sociedade brasileira, e até a mundial.
Portanto,
os comportamentos políticos e sociais em questão refletem as disputas políticas
e as narrativas extremas que pouco ajudam a resolver a crise, manifestando-se,
por exemplo, no comportamento de uma parte considerável da população,
particularmente da juventude: no auge da pandemia, continua afrontando o uso de
máscaras e o isolamento social. Uma rebeldia inconsequente que está levando à
morte de jovens e, muitas vezes, dos entes mais velhos da própria família, que
mesmo isolados recebem a contaminação trazida das ruas pelos filhos e netos.
Como
racionalizar tais comportamentos?
O
que ainda pode acontecer?
As
narrativas construídas na conveniência de cada discurso político trazem embates
cotidianos sem nenhum foco na questão principal: o combate efetivo à pandemia
que deveria unir toda a sociedade brasileira. Os interesses são outros:
vislumbram a próxima disputa político-eleitoral de 2022 – em uma democracia
avançada, essa gente estaria respondendo na sua maioria a processos em tribunais
(alguns, a bem da verdade, já estão respondendo, principalmente por corrupção,
antes e durante a pandemia – inclusive governadores, senadores, deputados e
prefeitos).
Urge
a Federação funcionar como Federação e a Cidadania como Cidadania. As
narrativas hegemônicas no atual cenário político brasileiro e os embates entre
os entes federativos não resolveram e nem vão resolver a difícil realidade em
que estamos vivendo.
No
Brasil, como sempre, os que mais precisam do Estado, milhões de brasileiros,
estão abandonados à própria sorte - frente ao desemprego, à falta de uma renda
emergencial que lhes assegurem o mínimo de dignidade para atravessar a crise
social, agravada com as doenças trazidas pela
pandemia: já são milhões de contaminados e milhares de mortes durante o
ano e o pior: a falta de medidas governamentais para o enfrentamento real dos
problemas do cotidiano já existentes e os ampliados com a pandemia.
A
sociedade está desafiada a se unir a favor de um Programa Nacional de
Vacinação: vacinar com a urgência
devida toda a população é a única maneira de retornar à vida social com
segurança. São estas as questões imediatas a serem enfrentadas pelos que detêm
mandatos e toda a cidadania brasileira.
Nesta
perspectiva é possível enfrentar a pandemia, abrindo o diálogo necessário entre
as forças democráticas no caminho de uma pauta que leve a um efetivo
enfrentamento dos reais problemas econômicos, sociais e ambientais vividos hoje
pela sociedade brasileira.
O
protagonismo dos movimentos sociais em defesa de uma maior participação
política das mulheres, dos negros, dos indígenas, dos LGBT+, nas questões
sociais e ambientais em geral e no enfrentamento da pandemia em particular, são
aliados fundamentais nessa construção. Pode-se e deve-se trazer a voz rouca dos
excluídos da sociedade para o exercício da política, pressionando os que
governam a República para pautar os problemas urgentes da população, buscando a
melhoria da qualidade de vida dos milhões de excluídos, que vivem em condições
precárias de moradia, segurança, educação, saúde, saneamento e mobilidade
urbana no Brasil.
Assim
a Federação, a Sociedade e a Cidadania estão desafiados ao enfrentamento
sistemático destes graves problemas sociais, econômicos e ambientais, agravados
com a pandemia que deverá se estender por todo o ano de 2021. As polarizações
das narrativas hoje existentes na sociedade não resolveram e não resolvem, neste
ano de pandemia, as dificuldades cotidianas da população, muitas vezes,
agravam, dificultando a enfrentar os reais problemas sociais. O Brasil bipolar,
dos extremos, não conseguiu e nem consegue construir soluções para os complexos
desafios da realidade brasileira, nem a nível municipal, estadual, muito menos,
em escala nacional.
Finalmente,
há que se considerar a necessidade de uma visão sistêmica e de escolha de
prioridades para o combate à pandemia, através do diálogo permanente entre
governantes e governados, que garantam a implementação de políticas públicas voltadas
para a sustentabilidade, articuladas às políticas regionais, sob
responsabilidade municipal, estadual e federal, construindo uma efetiva
cooperação entre o Estado, o Mercado e a Sociedade Civil, através de redes
regionais e nacionais, com foco na melhoria do bem-estar da população,
ampliando a capacidade de diálogo e de construção de pactos políticos e sociais que façam avançar
e ampliar a democracia, no caminho da transformação da realidade brasileira.
São
os desafios atuais dos brasileiros, durante e pós-pandemia.
*George Gurgel de Oliveira, Universidade Federal da Bahia, da Oficina da Cátedra da UNESCO-Sustentabilidade e do Conselho do Instituto Politécnico da Bahia.
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