Folha de S. Paulo
O problema no Brasil não é falta de
alimentos
No celeiro do mundo, uma multidão de 20 milhões de desvalidos passa fome. Feito um bicho qualquer, homens, mulheres e crianças reviram o lixo em busca de sobras de comida, numa demonstração triste e vexatória do fracasso do Estado brasileiro.
Nas duas últimas décadas, o país tornou-se o quarto maior produtor de grãos —soja, arroz, milho, trigo e cevada— do planeta e o segundo maior exportador, abocanhando 19% do mercado internacional. É o que revela estudo da Embrapa intitulado "O Agro no Brasil e no Mundo: uma síntese do período de 2000 a 2020".
Em 2020, o rebanho bovino brasileiro
correspondia ao maior do mundo, com 217 milhões de cabeças, equivalentes a
14,3% do rebanho mundial, sendo o Brasil o principal exportador desse tipo de
carne. O rebanho de galináceos era o quarto maior da Terra, equivalente a 1,5
bilhão de cabeças, e o de suínos, com 41 milhões de cabeças, o terceiro do
mundo. No mesmo período, o Brasil foi o terceiro maior produtor de frutas do
globo, com uma colheita de 58 milhões de toneladas.
Diante do contraste entre os números majestosos
do setor agrícola e os milhões de miseráveis garimpando restos de comida no
lixo para sobreviver, fica evidente a constatação de que o problema no Brasil
não é falta de alimentos.
Falta reduzir drasticamente as
desigualdades. Falta emprego para que os milhões que se encontram sem ocupação
possam comprar comida. Faltam políticas públicas que permitam ao povo viver com
o mínimo de dignidade. A pandemia agravou o cenário, agregando mais um
componente perverso: o luto em escala nacional.
Em meio a isso tudo, surgiu um deplorável
mercado da fome, criado por gente que enxergou na penúria alheia uma
oportunidade de fazer algum dinheiro cobrando pelo
que usualmente era doado ou descartado. Assim o quilo do osso
de boi foi precificado e colocado à venda.
Além de miserável, o mercado da fome é mesquinho e se alimenta da violação de direitos.
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