segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Celso Rocha de Barros - Política por trás do teto deu errado

Folha d S. Paulo

Ministro Paulo Guedes, da Economia, virou um Pazuello de pé chato

Em 2016, Michel Temer ganhou o troféu "assim, até eu" por criar um teto de gastos que só valeria para seus sucessores.

Foi como se dissesse: "Então é isso, pessoal, sejam responsáveis com o dinheiro, é muito importante ser responsável com dinheiro, agora me deem licença que eu vou jantar com o Naji Nahas".

O teto de gastos morreu semana passada. Não morreu na mão de um ministro heterodoxo do PT, morreu na mão de um Chicago boy.

Não morreu porque era preciso gastar mais com pobre, morreu porque continua sendo necessário gastar mais para gastar com pobre. Ninguém conseguiu aumentar imposto de rico, ninguém conseguiu cortar gasto com setores não-pobres, quem decide eleição é pobre, o gasto aumenta.

O projeto político proclamado do teto era forçar a sociedade a discutir suas prioridades.

Só tem esse dinheiro para gastar: vocês querem gastar com escola, com isenção fiscal para rico ou com aumento para os militares? Se os poderosos que capturam o Orçamento resistissem a mudanças, seriam expostos ao público.

Não deu certo. Os ricos conseguiram barrar a progressividade na reforma tributária.

Sob a vigência do teto, vimos uma transferência gigante de dinheiro para uma corporação pública poderosa, os militares. Quem mandava no Orçamento passou a mandar mais.

Esse fracasso tem uma explicação. O programa liberal para a economia brasileira deixa todo o trabalho duro para os políticos.

Se você acha que a solução para a economia brasileira é só baixar os juros ou desvalorizar o real, faz sentido eleger qualquer idiota desde que o Ministério da Economia e o Banco Central fiquem na sua mão: as decisões relevantes serão tomadas por você.

Mas se você acha que o papel da macroeconomia é só evitar um desastre, e que o importante são as reformas que os políticos precisam fazer, seu programa depende de uma boa estratégia política.

Pois bem. Desde 2015, os liberais brasileiros tomaram duas decisões políticas relevantes.

A primeira, em 2016, foi amarrar seu programa ao chefe do PMDB na Câmara no auge da Lava Jato e torcer para ele não ser pego em nenhum escândalo.

A segunda foi votar no Bolsonaro. Aí fica difícil, filho. Me ajude a te ajudar.

A ideia era fazer as reformas enquanto a sociedade falava de outra coisa: a corrupção, o Foro de São Paulo, o que fosse.

Mas a proposta política do teto dependia fortemente de um debate público estritamente econômico.

Se falta dinheiro porque os políticos roubaram tudo, como o público acreditou durante a Lava Jato, se falta dinheiro porque a esquerda gastou com ‘kit gay’, Cuba e Lei Rouanet, como diz Bolsonaro, por que o cidadão comum aceitaria se aposentar mais tarde para equilibrar as contas?

Por outro lado, sem a intervenção da opinião pública, qual era o plano para modificar o equilíbrio político em que o Orçamento é capturado por grupos de pressão?

Quem iria modificar isso, o Joesley? O Queiroz?

Parte da equipe econômica pediu demissão. Guedes, que entrou se achando todo Pérsio Arida, acabou um Pazuello de pé chato.

No fim das contas, o sujeito que ia zerar o déficit em um ano vendendo todos os imóveis da União por um trilhão era uma fraude, vejam só. Só falta agora me dizerem que o cara para quem eu mandei minha senha do banco também não é filho do rei da Nigéria.

 

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