Valor Econômico
Mensagem é que os juros vão ficar altos por
muito tempo, mas sem previsão de prazo
A decisão desta quarta-feira do Comitê de
Política Monetária (Copom) do Banco Central era menos sobre uma alta residual de juros e
mais sobre como convencer
os mercados de que está comprometido com a estratégia de
manter os juros altos por muito tempo.
É nesse contexto que devem ser entendidos
tanto a decisão de levar a taxa Selic para 15% ao ano, maior percentual em
quase duas décadas, como o tom conservador que permeia todo o comunicado
divulgado.
A mensagem é que os juros vão ficar altos por muito tempo. Quanto tempo? Os participantes do mercado financeiro vão fazer as contas, mas isso é algo em aberto para o Copom: vai depender de quanto tempo for necessário para levar a inflação à meta.
A alta de 0,25 ponto percentual faz pouca
diferença, na prática, para ajudar nessa baixa da inflação, ainda que esse
aperto adicional se prolongue no tempo. Mas a intenção conservadora do Copom
tem mais credibilidade com o aperto residual, que não era a aposta majoritária
dos analistas econômicos, do que com a manutenção dos juros.
A comunicação dos passos futuros, por outro
lado, tem vários componentes conservadores, que impõem um viés também de alta
na taxa Selic, não apenas de baixa.
Em quase todo fim de ciclo, o Copom avisa que
vai seguir vigilante, ou seja, que pode apertar mais se for necessário. Desta
vez, o colegiado vai um pouco além. Diz que, a partir de julho, fará uma
“interrupção” no ciclo de alta, o que é diferente de decretar o fim dele.
Mais: esclarece que essa interrupção é para,
depois de aparecerem os efeitos defasados das altas feitas até agora, “avaliar
se o nível corrente da taxa de juros, considerando a sua manutenção por período
bastante prolongado, é suficiente para assegurar a convergência da inflação à
meta”.
Dessa forma, o Copom coloca de forma mais
explícita a possibilidade de elevar os juros mais um pouco. Esse viés de alta
está ligado, provavelmente, a dois pontos que vêm sendo destacados pelos
membros do Comitê nos últimos meses.
Primeiro, o ciclo de alta foi feito de forma
mais rápida e intensa, com um choque na Selic anunciado em dezembro, que no
total somou 3 pontos percentuais. Como o ajuste nos juros foi feito de forma
mais concentrada no tempo, deve ser necessário esperar mais para ver os efeitos
aparecerem — e sempre há dúvidas sobre se sua repercussão na economia vai
repetir a observada no passado.
O outro motivo provável para manter a
possibilidade de alta de juros é que, hoje, o balanço de riscos para a inflação
tem o que se chama de “caudas gordas” — ou seja, riscos extremos maiores que o
usual.
Em particular, há o risco no cenário externo,
ligado à guerra tarifária de Trump, à política monetária nos Estados Unidos e à
guerra no Oriente Médio.
E também há o risco fiscal. Muitos analistas
receiam que o governo Lula faça uma expansão fiscal para se contrapor à
desaceleração econômica que será provocada pela alta de juros. O BC tem dito
que não pode agir de forma preventiva a um fato que é apenas um risco, mas tem
prometido fazer o que for necessário caso ele se concretize.
Tudo isso coloca um viés na taxa de juros,
que contribui para o mercado não concentrar as suas apostas apenas no lado da
baixa da taxa Selic. Mas há também a mensagem propriamente dita de manutenção
dos juros por um período longo.
O Copom já havia avisado que iria manter os
juros em patamar significativamente contracionista por período prolongado.
Agora, dá um passo além, dizendo que esse período, na verdade, é “bastante”
prolongado.
Não chega a ser surpresa a qualificação
adicional da mensagem. O presidente do BC, Gabriel Galípolo, havia dito que as
condições atuais demandam juros altos por mais tempo que em ciclos anteriores.
O diretor de organização do sistema financeiro e resolução do BC, Renato Gomes,
disse em entrevista ao Valor que
esse aperto prolongado leva em consideração o estado atual de desancoragem das
expectativas.
De fato, o Copom disse e repetiu nas atas que
um ambiente de desancoragem exige o aperto monetário por um período mais
prolongado do que numa situação em que as expectativas estejam ancoradas na
meta.
Em outros tempos, o BC daria pelo menos um
sinal indireto do tempo em que os juros teriam que ficar parados por meio de
uma projeção condicional de inflação com juros estáveis. No comunicado, há
apenas o cenário que incorpora o afrouxamento de juros previsto pelo mercado no
boletim Focus. Nesse cenário, a inflação fica em 3,6% em 2026, acima do alvo do
BC, que é de 3%.
Sem uma projeção – será preciso ver se haverá
novidades na ata e no Relatório de Política Monetária – o horizonte para o
afrouxamento fica em aberto. Isso está alinhado com a estratégia do BC de, num
ambiente de incertezas, não fazer indicações muito precisas sobre os seus
passos futuros, que inevitavelmente são entendidas como promessas.
No fim, o período de aperto deverá ser
determinado pela evolução do cenário, ou seja, se a inflação vai ou não
caminhar para a meta. O comitê deve reagir a essas informações que forem
aparecendo pelo caminho, ajustando-se às mudanças de cenário para, ao final,
fazer a meta de inflação ser cumprida.
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