Correio Braziliense
O governo não é uma coalizão, é um
arquipélago partidário, cujo centro é controlado pelo PT, que o considera
"em disputa". Isso não ajuda a estruturar a base e isola o governo
Para não dizer que não falei das pesquisas
que avaliam o governo Lula, aqui vai um resumo da ópera. Datafolha (10-11 de
junho): aprovação, 28%; desaprovação, 40%. Ipsos Ipec (junho): ruim/péssima,
43%; ótima/boa, 25%; regular, 29%; forma de governar: aprovação, 39%;
desaprovação, 55%; confiança no presidente: confiável, 37%; não confiável, 58%.
CNT/MDA (17 de junho): aprovação, 40,7%; desaprovação, 52,9%.
Qualquer que seja a pesquisa, variando entre 25% e 40% , a aprovação se mantém num patamar que coloca em risco a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sua rejeição está entre 40% e 53%, o que dificulta muito uma avaliação generosa do tipo "copo pela metade": ninguém pode afirmar que está quase cheio.
Segundo as pesquisas, os principais fatos que
afetam a popularidade do presidente são a crise do INSS (31% culpam o governo,
segundo a Genial/Quaest), o custo de vida (inflação de alimentos, café por
exemplo) e questionamentos em relação a saúde, idade e projeção de liderança
para o próximo mandato. É uma mistura difícil de lidar, porque não há solução
de curto prazo para os dois primeiros problemas; o terceiro é uma contingência
pessoal, nem o próprio Lula pode prever.
Entretanto, Lula não é um cachorro morto. No
DataFolha, nas pesquisas eleitorais de primeiro turno, lidera a disputa com
37%, contra 21% de Jair Bolsonaro (PL) e do governador de São Paulo, Tarcísio
de Freitas (Republicanos). Como o ex-presidente está inelegível e o governador
paulista não assume sua candidatura, as projeções para o segundo turno apontam
como principais concorrentes Michelle Bolsonaro (PL) e Ratinho Junior (PSD).
Lula leva vantagem de 46% a 42% contra eles. Caso Tarcísio seja candidato com apoio
de Bolsonaro, o cenário muda completamente e já começa empatado tecnicamente.
Esse cenário eleitoral aberto, porém,
fragiliza o governo no Congresso, que já começa a tratar Lula como um
"pato manco". O exemplo é a derrota acachapante nesta semana na
Câmara, com a aprovação da urgência para derrubada do aumento do Imposto sobre
Operações Financeiras (IOF), por 346 a 97 votos. Os "aliados" do
Centrão votaram em massa contra o governo, que ficou confinado ao campo
minoritário da esquerda. Não foi um fenômeno episódico, que possa ser atribuído
a um cochilo dos articuladores do governo. As derrotas no Congresso são
recorrentes, apesar de os partidos do Centrão ocuparem pastas importantes na
Esplanada. Das 150 medidas provisórias (MPs) que editou no atual mandato, Lula
viu pelo menos 92 perderem a validade, ou seja, 61% foram derrubadas.
Dissonância
Há uma dissonância entre o Palácio do
Planalto e sua base de sustentação no Congresso. A psicologia descreve a
dissonância cognitiva como um desconforto mental, que surge quando uma pessoa
tem crenças, valores ou comportamentos que entram em conflito e criam uma
sensação de tensão e mal-estar, levando a pessoa a buscar maneiras de reduzir
essa dissonância, muitas vezes por meio de justificativas ou mudanças em suas
atitudes ou comportamentos.
É mais ou menos o que está acontecendo entre
Lula e o Congresso, cuja maioria não concorda com as urgências e prioridades do
governo. A derrubada de medidas provisórias é o melhor termômetro. O governo
Lula não é uma coalizão, é um arquipélago partidário, cujo centro é controlado
pelo PT, que o considera "em disputa". Isso não ajuda a estruturar a
base congressual e isola o governo. Sim, como bem definiu o ex-ministro da Casa
Civil José Dirceu, em entrevista à Globo News na terça-feira, a base do governo
é de centro-direita.
Entretanto, o Congresso pôs o ministro da
Fazenda, Fernando Haddad, de joelhos. Perdeu completamente a capacidade de
negociar a proposta de ajuste fiscal com os presidentes da Câmara, Hugo Motta
(Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). A equipe econômica
não teria dificuldades de encontrar saídas para o deficit fiscal, mas Lula se
recusa a cortar gastos, e o Congresso não aceita aumentar impostos. Resultado:
mais uma elevação da taxa de juros, que subiu para 15%, o maior patamar em 20
anos, conforme a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) desta
quarta-feira.
Nesta semana, entre as decisões desfavoráveis
ao governo, destaca-se a instalação de uma CPI Mista para investigar as fraudes
do INSS, uma casa de caboclo para Lula, porque o escândalo somente veio à luz
no terceiro ano de mandato e envolve dezenas de associações de aposentados,
muitas dela de fachada. Por mais que o governo tenha razão quanto ao fato de
que as fraudes começaram durante o governo Bolsonaro, a demora para acabar com
os descontos indevidos nas aposentadorias está sendo uma tragédia para a imagem
do governo.
Dirceu é um sobrevivente de suas próprias
vicissitudes, mas preservou sua liderança junto aos militantes do PT. Segundo
ele, "Lula é candidatíssimo" e tem um ano e meio de governo para
resolver todas essas questões. "A eleição de 2022 não foi uma vitória da
esquerda. Foi uma vitória do antibolsonarismo", avalia. Dirceu critica o
discurso da legenda ("muitas vezes, é de um Brasil que não existe
mais") e avalia que o governador de SP pode ser o adversário de Lula em
2026: "Tudo indica que os partidos de direita vão buscar um candidato
único, se o Bolsonaro permitir, que seria o Tarcísio de Freitas. Mas o Tarcísio
não é invencível".
Nenhum comentário:
Postar um comentário