quinta-feira, 19 de junho de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Governo fraco, Congresso destrutivo

Folha de S. Paulo

Diante da falta de liderança de Lula, parlamentares rejeitam propostas de ajuste fiscal e derrubam vetos corretos

Se havia alguma dúvida quanto à fraqueza política do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Congresso Nacional, esta semana tratou de dissipá-la.

A tentativa parlamentar de derrubar os decretos presidenciais de aumento do IOF tramitará em regime de urgência. Houve ainda ameaças abertas de que dificilmente será aprovada a medida provisória que elenca providências com o objetivo de diminuir, de modo precário, o déficit das contas do Tesouro Nacional.

Na terça-feira (17), foi instalada Comissão Parlamentar Mista de Inquérito destinada a investigar o roubo de parte de aposentadorias e pensões do INSS. Ademais, uma série de vetos presidenciais foi derrubada com facilidade, para não dizer com escárnio pelos interesses do país.

A debilidade política da administração petista, de fato, é evidente desde as eleições de 2022.

O presidente venceu a disputa por margem mínima de votos; no Congresso, é francamente minoritário em termos numéricos e ideológicos. Jamais conseguiu firmar coalizão que levasse para o governo apoios bastantes dos partidos que receberam ministérios e outros cargos. A articulação política foi desde sempre inábil.

A estratégia de elevar despesas de forma temerária e, a seguir, tentar obter receitas suficientes mostrou-se inviável desde meados de 2024, o que tornou a Fazenda muito dependente de medidas pontuais e da boa vontade decrescente dos parlamentares.

O governo fica cada vez mais acuado —situação que apenas se deteriora com a falta de vontade de apresentar um programa fiscal capaz de redundar em acordo político que ao menos atenue o perigo do endividamento.

A querela judicial das emendas parlamentares e a voracidade de deputados e senadores por recursos escassos, se não inexistentes, emparedam Lula 3, que, além do mais, padece de taxas baixas de aprovação do eleitorado.

Na terça (17), o Congresso não só derrubou vetos presidenciais. Também afrontou a racionalidade econômica e o planejamento da produção de energia elétrica, insumo essencial. Os parlamentares restabeleceram subsídios, reservas de mercado e outros favores a fontes de energia ditas alternativas ou mais caras, a fim de beneficiar lobbies empresariais.

A conta de luz aumentará para consumidores. Será gravemente prejudicado um planejamento que possa levar em consideração a demanda real de energia, preços de mercado, impactos ambientais, novidades tecnológicas e conveniências operacionais. Dificultou-se a gestão de um setor já regulado de modo caótico.

O governo Lula desperdiçou a oportunidade de início de mandato para formar uma aliança partidária forte, com divisão efetiva de poder, e tomar medidas mais difíceis para o equilíbrio orçamentário. Na falta de liderança, o Congresso já se entrega a cálculos para as eleições de 2026, cuida de seus bilionários interesses paroquiais e deixa a economia do país à própria sorte.

Quem precisa de mais deputados?

Folha de S. Paulo

Datafolha mostra que 76% são contra ampliação de cadeiras na Câmara; projeto é distorção de exigência constitucional

O brasileiro pode estar calejado pelo corporativismo do Congresso Nacional, mas ainda demanda sensatez por parte dos parlamentares.

O projeto de lei complementar que amplia de 513 para 531 o total de assentos na Câmara dos Deputados —e força um gasto adicional de R$ 64,6 milhões ao ano pelo erário— é uma dessas medidas rechaçadas pela população, como mostra o Datafolha.

Segundo a pesquisa, publicada na terça-feira (17), 76% dos brasileiros são contra a expansão e apenas 20% a aprovam.

No mesmo dia em que esses resultados foram divulgados, o Senado pautou a votação do texto, já aprovado pela Câmara. A deliberação acabou suspensa, mas a decisão do presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), de programá-la para a próxima semana sinaliza que interesses dos parlamentares tendem, mesmo sob algum embaraço, a prevalecer sobre os do país.

O projeto não passa de interpretação distorcida da determinação do Supremo Tribunal Federal para que as cadeiras sejam redistribuídas de acordo com os dados do Censo 2022.

A decisão do STF é correta por cumprir a exigência do artigo 45 da Constituição, ignorada há duas décadas pelo Congresso, que estabelece a proporcionalidade entre o tamanho das bancadas e as populações dos estados.

A equação seria simples: as sete unidades da federação que registraram decréscimo populacional perderiam assentos a partir das eleições de 2026. Outras nove, nas quais se apurou aumento do número de habitantes, ganhariam novos postos. O total de deputados seria mantido em 513.

Contudo não foi essa a conta paroquial da Câmara, onde o projeto nasceu. Seu presidente, Hugo Motta (Republicanos-PB), preferiu a artimanha de ignorar o corte de parlamentares de estados com população em queda e de acrescentar 18 novos postos na Casa —o que gera, em efeito cascata, mais 34 assentos nas Assembleias estaduais.

Já existem assimetrias representativas na Câmara. Num exemplo, a imposição constitucional do teto de 70 deputados por unidade federativa condenou os eleitores de São Paulo, o estado mais populoso do país, à sub-representação. Essa distorção permanecerá intocada.

Ao ordenar que o Congresso deliberasse sobre a correção do tamanho das bancadas até 30 de junho, o STF não contemplou a hipótese de elevação do total de cadeiras. Ao Senado, agora, cabe ouvir a sensata contrariedade dos brasileiros com uma resoluta negativa a tal embuste.

Nova alta da Selic reflete posição cautelosa do BC

O Globo

Riscos inflacionários persistem, por isso juro deverá ficar mais tempo nas alturas para contê-los

A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC), de elevar a taxa básica de juros, a Selic, em 0,25 ponto para 15% não chegou a ser surpresa. É o sétimo aumento consecutivo desde setembro. Por certo a inflação medida pelo IPCA desacelerou em maio, recuando 0,17 ponto percentual para 0,26%. Em abril, o ritmo da atividade econômica registrou retração de 0,4% em relação a março, segundo indicador da Fundação Getulio Vargas (FGV), maior queda mensal desde outubro de 2024. Mas, apesar desses sinais, o desemprego, em 6,6%, segue baixo, sem variação significativa. A produção industrial registrou queda, mas o setor de serviços segue aquecido. Desde março, a previsão de analistas para o IPCA de 2026 está estacionada em 4,50%, teto da meta. Por tudo isso prevaleceu, na reunião do Copom, a posição mais cautelosa, segundo a qual a intensidade do aperto monetário precisava aumentar para manter a inflação sob controle.

A situação externa é também preocupante, com a guerra tarifária deflagrada por Donald Trump e o conflito entre Israel e Irã. Até o momento, a alta no barril do petróleo foi tímida, e o dólar tem perdido valor ante o real. Mas tudo pode mudar rapidamente. Os bombardeios no Oriente Médio não afetaram até agora o transporte de petróleo do Golfo Pérsico. Mas o risco é concreto. Cerca de 21 milhões de barris de Irã, Iraque, Kuwait, Arábia Saudita, Catar e Emirados Árabes Unidos (um terço do transporte marítimo global de óleo) passam diariamente pelo Estreito de Ormuz. Embora a chance de o Irã fechá-lo seja baixa, é uma possibilidade que não pode ser descartada. Na eventualidade de alta expressiva do petróleo, a capacidade da Petrobras de adiar remarcações no preço dos combustíveis será limitada.

Desde que começou a ventilar e a pôr em prática suas teses protecionistas, Trump tem protagonizado inúmeros vaivéns na política tarifária. As previsões mais catastrofistas para a economia global podem não se realizar, mas é difícil acreditar que o efeito será inócuo. Em maio, as vendas no varejo americano caíram 0,9% em relação a abril, maior queda em dois anos. Nesta quarta-feira, o banco central americano, o Fed, manteve os juros em 4,5%, sem dar ouvidos aos pedidos de Trump por cortes. Suas trapalhadas têm puxado o dólar para baixo e, dada a diferença entre os juros no Brasil e noutras economias, o real vem se valorizando. Esse desenlace positivo não elimina o perigo de qualquer desaceleração mundial acarretar danos por aqui.

Sem grandes sobressaltos à frente, o atual ciclo de aperto monetário pode ter chegado ao pico com a alta da Selic desta quarta-feira. Saber com exatidão por quanto tempo esse patamar será mantido ainda é motivo de debate. Enquanto o governo não conseguir debelar a crise fiscal por meio de um programa robusto e confiável de controle de gastos, persistirão dúvidas sobre sua credibilidade. Isso naturalmente leva os investidores a exigir retorno maior para lhe emprestar dinheiro — portanto, um juro maior. A sensação, em razão disso, é que a Selic ainda permanecerá um bom tempo nas alturas.

Portaria restringindo trabalho aos feriados deve ser esquecida

O Globo

Adiada pela quinta vez, medida foi capaz de desagradar a empregadores, empregados e consumidores

O governo faz bem em adiar a entrada em vigor da portaria restringindo trabalho no comércio durante feriados sem que haja acordo coletivo com sindicatos. Faria melhor ainda se abandonasse essa ideia estapafúrdia, que desagrada a empregadores, empregados e consumidores. Nem o Ministério do Trabalho e Emprego parece ter convicção sobre a utilidade da medida, pois é a quinta vez que a adia, como mostrou reportagem do GLOBO. A previsão era que a norma vigorasse a partir de julho, agora foi postergada para março de 2026.

Editada no fim de 2023, ela regula o funcionamento de supermercados, farmácias, lojas de departamento e outros estabelecimentos nos feriados. Revoga portaria do governo Jair Bolsonaro que reduzia a burocracia para abertura do comércio aos domingos e feriados (para domingos, há lei específica). O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, afirmou que o novo adiamento visa a garantir um prazo técnico “para consolidar as negociações”. Será que mais de um ano e meio não foi tempo suficiente para perceber o equívoco das novas regras?

Desde o início, o que se viu foi uma sucessão de trapalhadas. O governo tomou a decisão que tem impacto na rotina de milhões de brasileiros sem ouvir representantes do setor. A repercussão foi a pior possível. A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) disse que a medida afetaria o consumo e a geração de empregos. A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) afirmou que traria insegurança jurídica. Somente depois da grita geral, Marinho recuou e decidiu ouvir a sociedade. Pelo visto, não resolveu.

À época, ele disse que a portaria atendia a reivindicação dos sindicatos. Nada há de errado em entidades de classe levarem pautas ao governo. Mas há outros envolvidos. O Planalto precisa ter em conta os interesses de toda a sociedade, e não apenas dos grupos de pressão sindicais.

É certo que muitas cidades, como Rio de Janeiro e São Paulo, já dispõem de acordos e legislações próprias que permitem o trabalho do comércio nos feriados. Mas isso não torna a portaria menos equivocada. Tampouco a lista de exceções prometida pelo governo, para ao redor de 200 atividades, anula o retrocesso. É um contrassenso criar burocracia para o funcionamento do comércio num momento em que o governo quebra a cabeça para aumentar a arrecadação e trazer mais dinamismo à economia.

Da crise fiscal à segurança pública, há inúmeros problemas no Brasil para os quais o governo deveria dar mais atenção. A abertura do comércio nos feriados, já consolidada no país, certamente não é um deles. Em vez de criar obstáculos descabidos a um setor que dá certo, o Planalto deveria se preocupar com o que dá errado — e não é pouco. O melhor que o Ministério do Trabalho tem a fazer é esquecer a portaria.

Enfim, a CPI do INSS

O Estado de S. Paulo

Instalação da comissão para investigar roubalheira que atingiu milhões de aposentados era um imperativo moral. O poder público tem o dever de impedir que casos como esse se repitam

Quase dois meses após a deflagração, pela Polícia Federal e pela Controladoria-Geral da União (CGU), da operação que descobriu a fraude que atingiu milhões de aposentados e pensionistas do INSS, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), finalmente leu o requerimento que cria a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar o caso. Trata-se de um imperativo político e moral: comissões parlamentares existem justamente para investigar fatos de interesse público como este e encaminhar propostas legislativas para que tais escândalos não se repitam. É muito provável que a oposição aproveite a CPMI para fustigar o governo, mas isso faz parte do jogo democrático e em nada desabona, em princípio, o trabalho da comissão. Seria uma vergonha se o Congresso se omitisse diante de tão vergonhosa falha do Estado em sua relação com cidadãos tão vulneráveis, como os aposentados roubados pela quadrilha que atuou no INSS aproveitando-se de inadmissíveis falhas de fiscalização.

A CPMI se tornou inevitável sobretudo depois que os números da auditoria da CGU, segundo a qual 97,6% dos beneficiários entrevistados não haviam autorizado o débito em favor de entidades associativas, foram corroborados pelo INSS. Segundo o órgão, apenas 91 mil pessoas, de um total de quase 3,4 milhões, reconheceram ter autorizado o desconto.

Embora o esquema tenha começado na administração Temer e atravessado a de Jair Bolsonaro, foi sob Lula da Silva que a arrecadação das entidades sindicais explodiu. Tudo isso reforçou a necessidade de uma investigação que explique não só como ele nasceu, mas, sobretudo, como e por que continuou a despeito das inúmeras denúncias dos aposentados.

Para o cargo de presidente da comissão, Alcolumbre pretende indicar Omar Aziz (PSD-AM), senador que costuma atuar de maneira alinhada com o governo. Espera-se que, a despeito disso, o parlamentar atue no interesse dos aposentados e do aperfeiçoamento do INSS, e não no interesse do Palácio do Planalto.

Na Câmara, ainda não há informações sobre quem ficará com a relatoria da CPMI. Deputados do PL, partido que iniciou a coleta de assinaturas para instalar o colegiado e que é dono da maior bancada, devem lutar pela posição, mas a decisão caberá ao presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), que vive uma relação de morde e assopra com o Executivo.

O governo, por sua vez, aproveitou bem o tempo entre a eclosão do esquema e a instalação da CPMI e não ficou inerte na expectativa de que o problema morresse por contra própria. Até agora, a desculpa oficial do governo, de que coube a ele descobrir e investigar o caso, não colou, mas essa narrativa certamente será retomada nos próximos meses.

Além de já ter se articulado para ocupar cargos relevantes na comissão, o Executivo acelerou, nos últimos dias, o empenho e o pagamento de emendas parlamentares, o que tende a apaziguar os ânimos no Congresso. Ademais, os trabalhos da CPMI só devem começar no segundo semestre, após o recesso parlamentar, período em que os parlamentares já começam a se dedicar às suas bases de olho nas próximas eleições.

Para o governo, controlar os trabalhos da comissão é visto como algo fundamental para recuperar a popularidade do presidente Lula. O escândalo do INSS, afinal, interrompeu a incipiente recuperação nas pesquisas. A oposição, por outro lado, não tem interesse numa investigação que foque nas ações do governo Bolsonaro, que afrouxou as regras e permitiu a revalidação automática dos descontos nas aposentadorias e pensões.

Apostando em que o escândalo deve esmorecer assim que a compensação aos beneficiários for paga, a Advocacia-Geral da União (AGU) pediu ao Supremo Tribunal Federal, na semana passada, a suspensão dos processos e das decisões judiciais que tratem do assunto e a autorização para o uso de créditos extraordinários pela União para garantir o ressarcimento dos valores descontados aos aposentados e pensionistas.

O governo não faz mais que sua obrigação ao acelerar essa restituição. Mas, mesmo que cada centavo devido seja rapidamente devolvido, a CPMI continuará a ser necessária, pois a essência do problema permanece: é preciso responder como foi possível que os ladrões do INSS atuassem impunemente ao longo de três governos.

O resgate da vacinação infantil

O Estado de S. Paulo

Brasil enfrenta retrocesso na cobertura de imunização das crianças desde 2015, com o agravamento na pandemia. Será imenso o trabalho de reconstrução do PNI

A vacinação infantil enfrenta um retrocesso contínuo e generalizado no Brasil. Segundo o Anuário VacinaBR 2025, lançado pelo Instituto Questão de Ciência (IQC) em parceria com a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), com dados de 2000 a 2023, nenhum Estado atingiu a meta de vacinação contra todas as 17 doenças com imunização prevista no calendário nacional de dois anos atrás.

Além das metas não cumpridas, houve o abandono crescente dos ciclos vacinais com duas doses ou mais. E essa evasão supera 50% em alguns Estados. Considerados os dados por município, estima-se que, em 2023, 80% da população vivia numa área que não havia alcançado as metas do Programa Nacional de Imunizações (PNI). Nem São Paulo, o Estado mais rico do País, conseguiu atingir números satisfatórios. Pelo contrário. Dos 645 municípios paulistas, 628 estão fora das metas do programa nacional.

Esse quadro da vacinação no Brasil assusta, sobretudo quando os números mais recentes são comparados com os bons resultados já obtidos pelo PNI. Em 2014, por exemplo, todos os Estados haviam batido a meta de 95% para a primeira dose contra sarampo, caxumba e rubéola, ante apenas quatro unidades da Federação em 2023. E, desde 2016, o Brasil não atinge a meta de 95% da cobertura vacinal contra poliomielite, o vírus causador da paralisia infantil.

Esse refluxo começou a ser registrado a partir de 2015, ganhou força durante a pandemia de covid-19 e apresentou uma ligeira melhora nos anos de 2022 e 2023. Mas esse avanço foi insuficiente para reverter os sucessivos fracassos no cumprimento das metas do PNI.

Esse cenário é trágico e, ao mesmo tempo, vergonhoso, haja vista que o Brasil já foi uma referência em cobertura vacinal, exibindo ao mundo com orgulho os resultados do seu programa de imunização. Trata-se de um patrimônio brasileiro surgido há mais de 50 anos, que, sempre em contínuo aprimoramento, ajudou o País a erradicar inúmeras doenças, que agora voltam a ameaçar as crianças.

Existem algumas explicações para esse refluxo. O desestímulo à vacinação é um fenômeno global, não raro influenciado pela desinformação e a má-fé, que só pode ser combatido com mais informação – mas não só isso. Conforme relatório recente do Unicef, os fatores que podem determinar se uma criança será ou não vacinada vão desde exigir a caderneta de vacinação para matrícula escolar até exigir que a vacinação das crianças esteja em dia como contrapartida em programas sociais como o Bolsa Família. Pesam também a percepção dos pais sobre a importância da vacinação, a disponibilidade dos pais para levar as crianças a um posto de saúde, a oferta do imunizante no Sistema Único de Saúde (SUS) e o receio de efeitos adversos.

A credibilidade do PNI somente será retomada após muito trabalho das autoridades públicas das três esferas – a União, os Estados e o Distrito Federal e os municípios. Como apontou o Anuário VacinaBR 2025, experiências locais vão na direção de aumentar a cobertura vacinal, como uma lei da cidade do Rio de Janeiro que instituiu, em 2023, o Programa Vacina na Escola. Em São Paulo, desde 2020 uma lei estadual condiciona a matrícula escolar à apresentação de caderneta de vacinação.

Cabe ao poder público oferecer os imunizantes na rede pública, realizar a busca ativa pelos mais diversos canais de comunicação e adotar estratégias eficientes e criativas para convencer os pais a vacinarem seus filhos. Mas, não menos importante, são os pais que têm um papel central na universalização da vacinação. Deles se espera uma atitude responsável na proteção dos seus filhos.

Como afirmou a diretora da SBIm, Isabella Ballalai, a vacinação é negligenciada porque ninguém mais atualmente vê os riscos de doenças que deixaram sequelas no passado, “mas, se todos deixarem de se vacinar, não teremos sorte”. E não se pode contar com a sorte quando se trata de saúde pública.

Doação é ato de cidadania

O Estado de S. Paulo

Gestão de transplantes de órgãos é exemplar no SUS, mas solidariedade pode ser maior

O Sistema Único de Saúde (SUS) não é perfeito, mas poucos são os brasileiros, usuários ou não de seus serviços, que não o veem como um orgulho da Nação, como uma das grandes conquistas civilizatórias da sociedade na Nova República. E, no âmbito do próprio SUS, o Sistema Nacional de Transplantes (SNT) destaca-se como uma referência em política de saúde pública bem-sucedida, reconhecida como tal não apenas no Brasil, mas no mundo inteiro.

Ano após ano, o SNT, estrutura do Ministério da Saúde responsável por coordenar, normatizar e monitorar a realização de transplantes de órgãos, tecidos e células, consolida a merecida fama de ser uma ilha de excelência na prestação de serviços públicos no País. Em 2024, o Brasil bateu novo recorde de transplantes de órgãos, como mostrou o anuário da pasta publicado pelo Estadão há alguns dias. No ano passado, foram realizadas 30,3 mil cirurgias, cerca de 90% delas a cargo do SUS. Trata-se de um respeitável crescimento de 5,5% em relação ao total de transplantes em 2023.

O dado alvissareiro, porém, contrasta com o número de brasileiros que ainda aguardam na fila por um órgão: 78 mil pacientes, a grande maioria deles (42,8 mil) à espera de um rim. O cenário se desvela mais preocupante porque, de acordo com o balanço do Ministério da Saúde, o número de doadores de órgãos cadastrados caiu de 4.129 (2023) para 4.086 (2024).

A análise desses dados combinados – o recorde na realização de transplantes e a queda do número de doadores efetivos no mesmo período – revela que o SNT, de fato, é um serviço de excelência que faz muito com o que tem à disposição, mas muito mais poderia ser feito. Como reconheceu o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, o governo federal, em parceria com as administrações estaduais e municipais, tem o dever de realizar campanhas de conscientização para aumentar a doação de órgãos. “Nosso foco é reduzir a renúncia de doação pela família”, afirmou o ministro.

Essa redução está diretamente vinculada à qualificação da abordagem e da informação prestada às famílias que perderam entes queridos. Como bem ressaltou a coordenadora geral do SNT, Patrícia Freire, “a família brasileira é solidária” e, se “adequadamente entrevistada” para compreender o processo de morte encefálica, “ela doa”.

A qualificação da abordagem e a ampliação das equipes de captação de órgãos Brasil afora são passos fundamentais, mas não os únicos para reduzir a fila de espera por um transplante de órgãos no País. Em que pesem suas reconhecidas qualidades, o SNT não está imune a ineficiências, e é preciso resolvê-las. Uma das mais prementes é evitar a perda de órgãos doados por falta de insumos de conservação ou demora no transporte até o centro cirúrgico.

O Brasil já provou que sabe fazer transplantes de órgãos com excelência e em escala. O desafio, agora, é tornar esse sucesso ainda mais abrangente e sustentável. Para que o SNT continue sendo um orgulho nacional, é preciso tratá-lo como tal – com responsabilidade, investimentos e visão de longo prazo.

Indenizar vítimas do zika é dever do Estado

Correio Braziliense

Mais de 4,5 mil crianças nasceram com microcefalia desde 2015, e são recorrentes os casos de mulheres que foram abandonados pelos parceiros em razão do nascimento dos filhos com necessidades especiais

Na última terça-feira, o Congresso Nacional derrubou o veto ao Projeto de Lei 3.974/2015, que garantia indenização de R$ 50 mil e pensão especial no valor de R$ 8.157,41, o equivalente ao teto da Previdência Social, à pessoa com deficiência permanente decorrente de síndrome congênita associada à infecção pelo vírus Zika. A decisão é um alívio às famílias que, há quase 10 anos, enfrentam dificuldades para garantir atendimento adequado às necessidades dos filhos vítimas da epidemia ocorrida entre 2015 e 2017.

No ano passado, o governo Lula havia vetado o projeto e editado a Medida Provisória nº 1.287/2025, que garantia uma indenização de R$ 60 mil (parcela única) aos afetados pela doença. A iniciativa do Executivo foi considerada inadmissível tanto pelas famílias afetadas quanto pela autora do projeto, a senadora Mara Gabrilli, que, desde 2014, quando era deputada federal, defendia uma reparação às vítimas da epidemia, provocada pelo mosquito Aedes aegypti, vetor não só do Zika, mas também da dengue e da chicungunha. A derrubada do veto foi, segundo a senadora, acolhida pelo governo federal.

Segundo especialistas, não há uma estimativa do número total de casos de zika confirmados no país. O Ministério da Saúde informa que foram registradas ocorrências em Roraima, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Mato Grosso e Paraná. Mas os casos no Nordeste chamaram a atenção, colocando a região em evidência. A falta de saneamento básico adequado é visto como um dos principais fatores que facilitam a proliferação do vírus Aedes aegypti.

Para a senadora, a epidemia do Zika "não foi uma tragédia natural. Foi uma tragédia anunciada, consequência direta da omissão do Estado em oferecer o básico: água limpa, coleta de lixo e saneamento". No período entre 2015 e 2017, mais de 1,5 milhão de pessoas foram vítimas do vírus. Nesse intervalo de tempo, foram registrados 12.716 casos suspeitos de crianças que nasceram com a síndrome congênita do zika vírus. Pelo menos 3.500 bebês contraíram deficiências físicas, intelectuais, visuais, auditivas e neurológicas. A maioria das vítimas vive no Nordeste. Mais de 4,5 mil crianças nasceram com microcefalia desde 2015, e são recorrentes os casos de mulheres que foram abandonados pelos parceiros em razão do nascimento dos filhos com necessidades especiais.

No ano passado, mais de 340 mil brasileiros foram internados e 11.500 morreram vítimas de doenças adquiridas devido às condições inadequadas do ambiente em que vivem, segundo a pesquisa "Saneamento é saúde", divulgada pelo Instituto Trata Brasil.  Entre os diferentes protagonistas, estava o mosquito Aedes aegypti espalhando dengue pelo país. No início deste ano, o painel do monitoramento do Ministério da Saúde, contabilizou 493 mil casos nas primeiras semanas do ano, contra 1,6 milhão em igual período de 2024.

Está mais do que comprovado que a falta de saneamento básico compromete a saúde pública. Evitar que doenças sejam transmitidas às pessoas está entre as muitas responsabilidades do poder público com a população, entre elas a de garantir infraestrutura adequada às comunidades. Mas aos cidadãos cabe não só cobrar políticas públicas adequadas, como preservar as obras executadas e seguir a orientação das autoridades de saúde, como cumprir o calendário de vacinação.

A decisão do Congresso representa um alívio para as mães que têm filhos vítimas do zika, bem como os adultos que também foram afetados pelo vírus e, ainda hoje, sofrem com sequelas deixadas pela doença. Aos governos cabe garantir condições dignas de vida a todos cidadãos da população. A reparação, como estabelece a lei, ressuscitada com a derrubada pelo veto, não significa favor nem ato de misericórdia ante às vítimas. Entre as muitas responsabilidades do Estado a de garantir condições dignas de vida aos cidadãos, assegurando-lhes saúde, educação, moradia, segurança e tantos outros estabelecidos pela Constituição e as leis infraconstitucionais.

Polícia fecha empresas vinculadas ao crime

O Povo (CE)

A ação contra os donos de empresas de fornecimento de conexão à internet, ligados ao Comando Vermelho, é um bom exemplo do uso da inteligência para combater as facções criminosas

Operação da Polícia Civil do Ceará levou à prisão 15 donos de empresas de provedores de internet ligadas à organização criminosa Comando Vermelho. A facção tem origem no Rio de Janeiro, mas age em vários outros estados do Brasil, incluindo o Ceará.

Essa é a quarta fase da Operação Strike, com ações integradas das forças de segurança do Estado, para dar mais segurança às empresas legais de fornecimento de conexão à internet, além de promover uma ofensiva contra os grupos criminosos.

A ação começou depois de uma onda de ataques aos provedores de internet, entre fevereiro e março deste ano, quando criminosos do Comando Vermelho vandalizaram as sedes das empresas, visando impedir seu funcionamento para monopolizar o serviço em favor do crime.

Alisson Gomes, delegado titular da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco), disse que as empresas ligadas ao Comando Vermelho extorquiam dinheiro de clientes, tabelavam os preços e danificaram equipamentos de empresas legalizadas, para expulsá-las do mercado.

Por isso, é importante essa atuação da Polícia Civil, resultado de um trabalho de inteligência, que rende mais do que a política de confronto, que na maioria das vezes se mostra ineficaz, ao atingir apenas a baixa hierarquia do crime.

Afora que as ações espetaculares — de modo geral — costumam resultar em mortes, incluindo de policiais e civis, atingidos pelas chamadas "balas perdidas". Fazer o trabalho preventivo, evitar que uma iniciativa criminosa prospere e sufocar financeiramente as facções, é modelo mais adequado para enfrentar o crime organizado, no Ceará ou em qualquer outra região.

Com a segurança pública tornando-se uma das principais preocupações dos brasileiros, governadores de diversos estados investem em programas para combater a criminalidade.

No entanto, o problema também é capturado por discursos populistas, que enxergam a segurança pública somente pelo viés do confronto, fomentando o medo entre a população, muitas vezes com fins exclusivamente eleitoreiros.

É preciso ter claro que a segurança pública é um tema extremamente complexo, que não será resolvido do dia para a noite, nem apenas nos marcos de cada estado.

Para enfrentar o perigo das facções criminosas será necessária uma frente, que una estados, municípios e o governo federal, para implementar ações integradas das polícias, respeitadas as competências de cada ente.

Dos governadores e prefeitos, espera-se que analisem com um pouco mais de boa-vontade, a PEC da Segurança Pública, proposta pelo ministro da Justiça Ricardo Lewandowski, para que se encontre um denominador comum.

Quanto ao Ceará, a ação ora comentada, é um bom exemplo do uso da investigação e da inteligência para atingir exatamente o alvo escolhido, desestruturando as conexões criminosas, sem danos colaterais.

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