quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

OPINIÃO DO DIA – Barack Obama

Não podemos confundir absolutismo com principio, ou substituir espetáculo por política, ou ainda aceitar xingamentos como um debate fundamental.

Barack Obama, no discurso de posse do segundo mandato

Manchetes de alguns dos principais jornais do país

O GLOBO
Corrida por internações de crack surpreende SP
Detran não se mexe para lei das motos
Rei da soja no Meio Ambiente
Oi troca comando, e ação cai 12%
Nova estação na Antártica

FOLHA DE S. PAULO
Direita vence eleição, mas perde espaço em Israel
Empresário brasileiro está entre os mais otimistas
Ceará dá R$ 650 mil a Ivete Sangalo para inaugurar hospital
Brasileira diz que ataque no Bolshoi é fruto da ambição
Premiê britânico promete referendo sobre saída da EU

O ESTADO DE S. PAULO
PMDB de Renan 'controla' programa Minha Casa em AL
Projeção mostra que dívida pode elevar risco da Petrobras
Para cumprir lei, País precisa de 130 mil bibliotecas
Parcerias firmadas

VALOR ECONÔMICO
Cade dá início a fase de grandes julgamentos
Eletrobras estuda vender distribuidoras
Só 122 cidades brasileiras são atendidas por voos regulares
Ação do Estado prejudica fundo quantitativo

BRASIL ECONÔMICO
Dilma convoca Tombini e define agenda para a reunião de Davos
Santander nega venda e diz que aumentará investimento
Receita vai além dos tributos ao multar empresas
Desembolsos do BNDES somaram R$ 156 bilhões
Bancos europeus serão fiscalizados com mais rigor

CORREIO BRAZILIENSE
Mercado quer aposentado e exclui jovem
Congresso: Temas internos monopolizam a eleição da Mesa
Voluntariado

ESTADO DE MINAS
Fábrica de caminhões no sul de MG
Vítimas da chuva e da seca
Rumo a Brasília: 600 prefeitos endividados e desconfiados

O TEMPO (MG)
Cargos viram negócio de família
Dez das 12 sedes da Copa têm atrasos nas obras de energia
Valério é condenado por sonegação de Imposto de Renda

GAZETA DO POVO (PR)
Caixa da Urbs está negativo em cerca de R$ 100 milhões
ANTT analisa a conclusão do Contorno Norte
Aparelho em stand by eleva conta em até 20%
Oi substitui presidente e ações caem

ZERO HORA (RS)
Conselhão vai liderar debate sobre pedágios
Toma lá, dá cá: Novo consulado mira negócios entre EUA e RS

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Brasil construirá uma nova base na Antártida


O que pensa a mídia - editoriais de alguns dos principais jornais do país

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Rei da soja no Meio Ambiente

Candidato mais forte a presidir o Senado, Renan Calheiros já negocia cargos. Blairo Maggi, rei da soja e vencedor do Motosserra de Ouro, presidirá a Comissão de Meio Ambiente

Renan loteia cargos no Senado; Blairo ficará com meio ambiente

Candidato mais forte a presidir o Senado, peemedebista já distribui comissões

Fernanda Krakovics, Cristiane Jungblut

BRASÍLIA - O provável futuro presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ainda nem oficializou sua candidatura à sucessão de José Sarney (PMDB-AP), mas já costurou acordos para a formação de um chapão: além dos cargos da Mesa Diretora da Casa, inclui ainda negociação de indicações para as comissões mais importantes. Os cargos são ocupados proporcionalmente, com base no tamanho das bancadas. Nessa costura, já está certo, por exemplo, que o eterno ex-líder do governo Romero Jucá (PMDB-RR) será reabilitado com um cargo na Mesa. E que o senador Fernando Collor (PTB-AL), seu conterrâneo, comandará a poderosa comissão de Infraestrutura, hoje com o PSDB. Já o senador Blairo Maggi (PR-MT), ganhador em 2005 do troféu "motosserra de ouro", do Greenpeace, - mas depois redimido pelos ambientalistas - vai para a Comissão do Meio Ambiente.

Maggi teria caído nas graças dos verdes depois que passou a produzir soja certificada e de ter colaborado com o Ministério do Meio Ambiente para a redução do desmatamento.

A negociação de Renan passa pela ida de Eunício Oliveira (PMDB-CE) para o cargo de líder da bancada; Vital do Rêgo (PMDB-PB), cogitado para a vaga de Sarney, presidirá a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a mais importante do Senado; e Jucá (PMDB-RR) ocupará a 2ª vice-presidência da Mesa Diretora.

Jucá está sendo compensado por ter perdido o cargo de líder do governo no Senado. No ano passado, ele já havia recebido a relatoria-geral do Orçamento da União. Já o PT pretende usar a 4ª secretaria da Mesa Diretora para compensar José Pimentel (PT-CE) pela sua provável destituição da liderança do governo no Congresso.

Pré-candidato ao governo do Rio, Lindbergh Farias (PT-RJ) presidirá a Comissão de Assuntos Econômicos. E Jorge Viana (PT-AC) ocupará a primeira vice-presidência do Senado. No rodízio implementado pelo partido, Ana Rita (PT-ES) irá para a presidência da Comissão de Direitos Humanos.

Na escolha do comando das comissões, o PSDB, pelo tamanho da bancada, é o terceiro a fazer a escolha. Os tucanos farão uma reunião no dia 31 para definir suas prioridades. A princípio, nessa dança das cadeiras, devem abrir mão da Comissão de Infraestrutura e optar pela Comissão de Relações Exteriores, que iria para o senador Aloysio Nunes Ferreira (SP). O partido também cogita escolher a Comissão de Educação e Esporte, por causa da Copa do Mundo e das Olimpíadas.

- Costumávamos escolher a de Infraestrutura por causa do PAC (um dos principais programas do governo), mas chegamos à conclusão que não é tão importante assim - disse o líder do PSDB, senador Álvaro Dias (PR).

O PSDB manterá a 1ª Secretaria da Mesa Diretora, espécie de prefeitura do Senado. O cargo é cobiçado por movimentar milhões em contratos de administração da Casa. O senador Flexa Ribeiro (PA) deve ser indicado para a função.

A exemplo do Senado, na Câmara o também favorito Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) também loteia sua chapa e indicações para comissões, inclusive com partidos da oposição, como o PSDB. Apesar das denúncias contra o peemedebista, os tucanos já anunciaram que continuam apoiando sua candidatura.

PSD e PSDB brigam por cargo na mesa

O PSDB briga com o PSD, de Gilberto Kassab, pelo comando da 1ª Secretaria, um dos cargos mais cobiçados da Mesa, por gerenciar o orçamento da Câmara, comparado ao de uma prefeitura. Os dois partidos afirmam ter o mesmo número de deputados: 51. Por isso, pleiteiam a 1ª Secretaria. Essa questão será decidida pelo atual presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), que precisa definir o critério a ser usado.

O mais provável é que o PSDB fique com a vaga, se o critério for o de antiguidade. O PSD ameaça recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), caso isso ocorra. Apoiando a campanha de Henrique Alves, o PT ficará com a 1ª vice-presidência. O cargo deverá ser ocupado pelo secretário nacional de Comunicação do PT, deputado André Vargas (PR), que tem acompanhado o candidato peemedebista em seu périplo pelo país. O PT ainda terá outro cargo. No entendimento com os partidos, o PMDB ainda prometeu ao PR a 4ª secretaria e ao DEM, a procuradoria da Casa.

Mas haverá disputa dentro dos partidos. No PSD, por exemplo, Fábio Faria (RN) é o indicado para qualquer cargo, mas os deputados Átila Lins (AM) e José Carlos Araújo (BA) prometem disputar. No PR, o deputado Inocêncio Oliveira (PE) avisou que vai ser candidato avulso, se não for o indicado pelo partido na composição da Mesa. Na Câmara, é comum haver candidatos avulsos.

Fonte: O Globo

Sarney diz que STF não deve intervir em rateio a Estados

Mesmo sob pressão, Congresso não tem solução para nova divisão de recursos

Prazo para definição de novas regras do FPE acabou em 2012, mas nenhum dos 21 projetos tem apoio da maioria

Gabriela Guerreiro, Márcio Falcão

BRASÍLIA - Em resposta a uma ação patrocinada por quatro Estados no STF (Supremo Tribunal Federal) pedindo a prorrogação do prazo para a fixação de novas regras de distribuição do Fundo de Participação dos Estados (FPE), o Congresso negou ontem ser omisso na discussão do tema.

O presidente da Casa, senador José Sarney (PMDB-AP), ainda descartou a possibilidade de o Supremo intervir para resolver a questão.

"Não há omissão inconstitucional do Congresso como apontam os requerentes [Estados], já que têm curso regular nas Casas Legislativas projetos destinados a disciplinar a forma de distribuição dos recursos do FPE", afirmou o peemedebista em ofício encaminhado ao Supremo.

"Não havendo, portanto, inércia do Poder Legislativo a justificar qualquer intervenção do Poder Judiciário em suas atividades típicas, em atenção ao princípio da separação dos Poderes", disse.

Um dia após receber ação protocolada por governadores (de MA, MG, PE e BA) que tentam evitar a suspensão dos repasses, o presidente interino do Supremo, Ricardo Lewandowski, pediu explicações ao Congresso.

Horas depois de receber o pedido, Sarney justificou que se trata de um tema complexo e que vem sendo discutido nos últimos dois anos e oito meses. "A matéria legislativa não é apenas complexa, mas politicamente sensível, revelando um verdadeiro embate entre Estados, Distrito Federal e municípios."

Mesmo sob pressão do STF, o Congresso não tem solução à vista para a questão.

Distantes de um consenso, senadores e deputados disputam uma maior fatia dos R$ 50 bilhões do fundo para seus Estados. Com isso, nenhum dos 21 projetos em tramitação -13 na Câmara e 8 no Senado- tem apoio da maioria dos congressistas.

O problema começou há dois anos, quando o STF considerou as atuais regras de rateio desatualizadas e ilegais, dando até 2012 para que o Congresso aprovasse uma nova maneira de partilha. Sem acordo, ela não foi aprovada.

Dada a importância dos repasses -representam ao menos 40% das receitas de oito unidades da federação-, ministros do Supremo dizem que é muito difícil impedir que o fundo seja pago, apesar da falta de amparo legal. Mas cobram solução rápida.

Pelos critérios atuais, Norte, Nordeste e do Centro-Oeste ficam com 85% do dinheiro do fundo. Os outros 15% são repassados às demais unidades federativas, que reivindicam fatia maior.

Autor de proposta que tinha o objetivo de ser "consensual", o senador Walter Pinheiro (PT-BA) manteve os valores repassados atualmente para cada Estado até 2015. O restante seria distribuído de acordo com a renda per capita e a população de cada unidade da Federação -quanto menores os índices, maiores os repasses.

O petista não tem apoio dos colegas. Os principais líderes criticam o fato de Bahia, Maranhão e Ceará receberem uma parte maior segundo os critérios atuais.

Fonte: Folha de S. Paulo

Oposição vai ao Supremo contra medida provisória

DEM e PSDB afirmam que governo usurpou funções após Congresso adiar Orçamento

BRASÍLIA - O DEM e o PSDB protocolaram ação no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo para ser declarada inconstitucional a medida provisória que liberou crédito extraordinário de R$ 42,5 bilhões para investimentos neste ano.

O Planalto recorreu em dezembro à medida provisória após o Congresso adiar para fevereiro deste ano a votação da proposta orçamentária.

Para a oposição, o governo está usurpando atribuições do Legislativo e ferindo a Constituição porque não há urgência e relevância para a liberação desses recursos.

O vice-líder do DEM na Câmara, Ronaldo Caiado (GO), acusa o governo de tentar inflar o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre deste ano.

"O governo mais uma vez tenta retirar do Congresso o poder de aprovar o Orçamento", afirmou o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP).

Segundo o governo federal, os recursos vão servir para a execução de gastos em obras de infraestrutura.

O impasse em relação ao Orçamento ocorreu após a confusão em torno da derrubada dos vetos presidenciais à lei que muda a distribuição dos royalties do petróleo, que tomou quase todas as sessões do Congresso no fim de 2012.

Sem Orçamento, o governo poderia gastar com despesas obrigatórias, como salários e "restos a pagar" - mas não com investimentos.

O líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE), disse, em nota, que "sem a edição da MP (medida provisória) haveria enormes prejuízos para a economia do país, comprometendo a continuidade da execução de investimentos prioritários".

Fonte: Folha de S. Paulo

Contra Renan, oposição quer pulverizar a disputa

Além de Randolfe Rodrigues (PSol), Pedro Taques (PDT) deve entrar na briga pela presidência do Senado. Ideia é forçar segundo turno contra o peemedebista

João Valadares

Diante da expectativa de larga vitória do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) na disputa pela presidência do Senado — a votação ocorre no início de fevereiro —, a oposição armou uma estratégia para pulverizar a eleição e tentar forçar um segundo turno ao lançar mais de um candidato. Além do senador Randolfe Rodrigues (PSol-AP), Pedro Taques (PDT-MT), que pertence ao mesmo grupo político, também deve concorrer. Ele já recebeu o apoio dos senadores Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) e Cristovam Buarque (PDT-DF). Em campanha por vários estados, Randolfe explicou como vai funcionar a tática: “O Pedro é companheiro de causas e de ideias. Quanto mais candidaturas, melhor. Aumenta a possibilidade de chegarmos ao segundo turno. Tem gente que não vota em mim, mas pode muito bem votar no Taques, por exemplo”, afirmou.

O senador fez campanha ontem em São Paulo. Além de encontros políticos, visitou algumas redações de jornais. Hoje, estará no Rio de Janeiro e, depois, vai ao Recife para um encontro com Jarbas Vasconcelos. “Permaneço como candidato e estou em plena campanha. Eu e Pedro Taques estamos no mesmo barco. É bom para o Senado. Não há de se falar em consenso. O melhor que poderia acontecer seria a eleição não ser resolvida no primeiro turno. Se o Renan não alcançar a metade dos votos mais um, vamos ao segundo turno. Tenho um diálogo fraterno com o Taques”, explicou.

Na tarde de ontem, Pedro Taques endossou a estratégia do colega socialista. “O que repito é que o Senado Federal precisa ter mais de um candidato para disputar a presidência da Casa. Estou estudando o Regimento Interno do Senado. Coloquei meu nome à disposição e continuo firme nesse propósito. Eu ainda vou conversar pessoalmente com o senador Randolfe Rodrigues, a quem eu admiro bastante e é o meu irmão de causa”, salientou.

Críticas

Randolfe Rodrigues aproveitou a campanha para criticar a postura do Senado diante do impasse em relação ao Fundo de Participação dos Estados (FPE). Na tarde de ontem, o presidente em exercício do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, enviou pedido de informação ao Senado para saber o motivo pelo qual a Casa descumpriu a determinação de criar uma nova lei para a partilha (leia mais sobre o FPE na página 6). “A opção do Congresso Nacional de se omitir completamente em relação ao FPE é o maior exemplo de que as coisas não vão bem e precisam mudar. Como é que o Supremo Tribunal Federal determina um prazo de dois anos e a gente não tem competência ou capacidade para cumprir a ordem da Justiça? O Congresso, agora, vai ter que encontrar um jeitinho para que metade da Federação não fique na penúria”, ressaltou.

O parlamentar avaliou o cenário como catastrófico se os recursos do FPE não forem repassados aos estados. “Se o FPE for suspenso, mais da metade da Federação brasileira virá a Brasília entregar a chave dos estados à presidente Dilma Rousseff, porque não haverá nenhuma condição de governabilidade. No Amapá, por exemplo, 72% da receita é proveniente do FPE. Milhões de crianças ficariam sem escola e outros milhões morreriam sem hospital. O Senado não votou para manter as regras da lei que já foi declarada inconstitucional”, finalizou.

“O melhor que poderia acontecer seria a eleição não ser resolvida no primeiro turno. Se o Renan não alcançar a metade dos votos mais um, vamos ao segundo turno. Tenho um diálogo fraterno com o Taques” - Randolfe Rodrigues, senador do PSol-AP

“O que repito é que o Senado Federal precisa ter mais de um candidato para disputar a presidência da Casa. Estou estudando o Regimento Interno do Senado. Coloquei meu nome à disposição e continuo firme nesse propósito” - Pedro Taques, senador do PDT-MT

Fonte: Correio Braziliense

Rumo a Brasília: 600 prefeitos endividados e desconfiados

Caravana de gestores mineiros vai ao encontro de prefeitos com a presidente Dilma e ministros, entre os dias 28 e 30, conhecer possíveis parcerias com a União. Mas eles foram orientados a só aceitar convênios que incluam verba para custear os serviços que forem criados.

Prefeitos mineiros com o pé atrás

Cerca de 600 gestores do estado vão a encontro com a presidente Dilma e levam na bagagem uma dose de desconfiança em relação aos programas que geram despesas para os municípios

Juliana Cipriani

Uma legião de prefeitos desconfiados, endividados e cheios de cobrança na bagagem. É esse o perfil dos cerca de 600 gestores mineiros – entre novatos e veteranos – que a presidente Dilma Rousseff (PT) vai receber entre os dias 28 e 30 na segunda edição do Encontro Nacional com Novos Prefeitos e Prefeitas, em Brasília. Convidados a conhecer as possíveis parcerias com o governo federal em seus mandatos, eles foram devidamente orientados a só aceitar convênios que incluam no pacote verba para custear os serviços que forem criados. Isso porque, segundo a Associação Mineira de Municípios (AMM), vários prefeitos que aceitaram recursos para construir unidades de saúde, creches e outros projetos estão hoje com o orçamento estourado por terem de arcar sozinhos com o salário do funcionalismo e o custeio dos novos postos de atendimento à população.

Segundo a AMM, a União oferece aporte para investimentos que acabam gerando custos e compromissos para os prefeitos. No recente programa Pró-Infância, por exemplo, foi repassado até cerca de R$ 1,5 milhão por prefeitura para a construção de creches, mas, para se manter em funcionamento, as instituições precisam mais ou menos do mesmo valor anualmente para pagar funcionários, alimentação, equipamentos e outros encargos. "Os prefeitos têm de ficar muito atentos para avaliar o que realmente é um benefício e o que vai trazer novas obrigações que vão dificultar a gestão. Estamos orientando que observem. Tudo o que vier com fontes para sustentar a parceria ou a fundo perdido é muito bom, o que for gerar despesas não", explicou o presidente da AMM, Ângelo Roncalli.

A consequência dos convênios firmados anteriormente sem dinheiro para manutenção, segundo o dirigente, é que mais de 300 municípios mineiros estão próximos ao limite de gastos com pessoal, de 54% da receita, fixado pela Lei de Responsabilidade Fiscal. "Eles ficam comprometidos, porque construíram unidades de pronto atendimento, creches, ampliaram as equipes de saúde da família, e o financiamento para que isso funcione fica a cargo dos prefeitos", reclama Roncalli.

A crítica, acompanhada do pedido para que a metodologia mude, é reforçada pelo presidente da Frente Mineira de Prefeitos, Vladimir de Faria Azevedo (PSDB). "São programas compartilhados, mas o custeio fica quase 100% com a prefeitura. Queremos ajuda nessa manutenção também", afirmou. Prefeito de Divinópolis, no Centro-Oeste de Minas, ele conta que os restaurantes populares também recaem como despesas para os municípios. "São quase R$ 2 milhões ao ano, porque o prato que vai para a população não tem o valor real. O déficit é de quase R$ 4 por prato. É uma política que tem que ser compartilhada. Então, não nos interessam só investimentos, mas coisas perenes", explica.

Blindagem.  Reeleito em outubro, o prefeito nem teve tempo de saborear a vitória por causa da crise vivida pelos municípios. A redução do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e a retenção desses recursos para algumas prefeituras, em função de dívidas com a Previdência Social, deixaram os Executivos em grande dificuldade, pois essa é a maior fonte de arrecadação para muitos. A AMM e a frente mineira vão pedir a Dilma uma espécie de "blindagem" do fundo. Ou seja, que as isenções concedidas pelo governo federal não sejam sobre os impostos que compõem a cota dos municípios, que são o Imposto de Renda (IR) e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). As entidades pedem um piso nacional para o FPM. "Eles cobram planejamento, mas nunca sabemos se o que vamos receber é de acordo com a receita. Queremos que haja um fundo para garantir um valor mínimo com o qual poderemos contar", afirmou o presidente da AMM.

Outra bandeira dos mineiros no encontro será a redistribuição dos royalties do petróleo. Os prefeitos de Minas Gerais se sentem prejudicados pelo veto da presidente Dilma ao projeto que igualava a compensação financeira pela exploração da riqueza, desconcentrando-a dos estados produtores. Os municípios vão pedir ainda um encontro de contas para as prefeituras devedoras do INSS, alegando que a União também deve às prefeituras. Somente com uma decisão judicial, que entendeu que a prescrição dessas dívidas seria de cinco anos, metade do débito dos prefeitos seria quitado. "É uma dívida com juros astronômicos, praticamente uma agiotagem, sendo que os municípios têm muito a receber", afirmou Ângelo Roncalli.

Fonte: Estado de Minas

Municípios questionam 'bondades'

Caio Junqueira e Bruno Peres

BRASÍLIA - O presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, disse ontem que o encontro nacional de prefeitos que o governo federal vai promover na próxima semana não atenua o crescente e agudo conflito federativo entre a União e os municípios. Ao contrário, o agravará.

"O conflito federativo que existe é cada vez mais agudo e diz respeito ao cotidiano da população e da sociedade não será resolvido com esse lenga-lenga com prefeitos. O conflito continuará existindo", afirmou ontem, em conversa com o Valor.

O motivo é que o "pacote de bondades" que o governo estuda oferecer aos prefeitos é "subfinanciado". Ou seja, a União, que arrecada 60% do bolo tributário do país, entrará com cerca de 30% dos recursos para que os programas possam ser executados pelos municípios, que colocarão cerca de 60% de seus recursos neles. Com a diferença que arrecadam 6%, segundo Ziulkoski.

"O governo vai mostrar, falar "olha, tenho isso, tenho aquilo" e o prefeito aceita. Mas o governo não pergunta se ele tem recurso para bancar isso. O prefeito acaba sendo induzido a fazer o convênio e tem que pagar a maior parte. Aí é aquele atropelo. E sai na mídia: governo anuncia bondades."

Ziulkoski, que desde 1998 dirige a entidade, afirma que o evento é um "fórum político" de aproximação da presidente com os prefeitos, semelhante a outros que já ocorreram e que pouco serviram para que a situação dos prefeitos melhorassem.

Para ele, a discussão federativa que cresce no país, tanto em decorrência dos debates que tomarão conta do Congresso neste ano ou no discurso de presidenciáveis como o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e o governador de Pernambuco e presidente nacional do PSB, Eduardo Campos, não deve apresentar resultados práticos para melhorar a situação financeira das cidades.

"Isso é um dos maiores engodos que existem. Muitos falam agora mas quando foram governo nada fizeram. A posição sobre pacto federativo sempre depende do lado do balcão que o grupo político está", afirmou. Ele lembra que "o PT na oposição comprou nossa briga mas depois que virou governo abandonou a causa, assim como o PSDB: antes era contra e hoje defende nossa posição."

Ele avalia que as perspectivas para os municípios dificilmente mudarão porque a dependência deles em relação ao Executivo e ao Congresso Nacional é benéfica para o jogo político. "Esse é o jogo de Brasília. Para o governo e o Congresso, é bom ter prefeitos dependentes. Todos falam em federação e em pacto federativo, mas não dá em nada. Todos se elegem e reelegem com essa engrenagem."

Embora ainda não haja uma definição sobre o pacote, os anúncios no encontro deverão contemplar da área econômica à social. Diversos balanços atualizados dos principais programas do governo federal também serão apresentados. Mas não há previsão de espaço para debates envolvendo questões federativas sensíveis à relação entre União e municípios. O entendimento é que há espaços próprios para esses debates, que não o encontro, cujo principal objetivo é orientar os novos gestores sobre possíveis parcerias entre as diferentes esferas federativas.

O pacote ainda está em fase de elaboração e foi debatido em reunião da presidente Dilma com parte da equipe na tarde de segunda-feira no Palácio do Planalto. As ministras de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, e da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, fizeram reuniões setoriais preparatórias anteriores à reunião conduzida por Dilma.

Além de Gleisi e Ideli, estiveram com Dilma na segunda-feira os ministros do Planejamento, Miriam Belchior; dos Transportes, Paulo Sérgio Passos; das Cidades, Aguinaldo Ribeiro; da Educação, Aloizio Mercadante; da Saúde, Alexandre Padilha; do Desenvolvimento Social, Tereza Campello; e do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas. Dilma orientou os ministros a não politizar o encontro. A intenção do governo é concentrar as atenções às boas práticas, principalmente na área social, sem conferir um caráter partidário nem personalizado.

A programação do encontro contempla praticamente todos os ministérios do governo em todas as suas áreas. Dilma participará da abertura oficial do evento na noite do dia 28. Mais cedo, o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, debaterá o Plano Brasil Maior. A ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, fará o encerramento, na noite do dia 30.

No dia 29, a ministra do Planejamento fará uma apresentação à tarde sobre o PAC. No mesmo dia, o Paulo Bernardo, falará sobre inclusão digital, também à tarde. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, participará do debate sobre "Perspectivas Econômicas para o País e o Impacto sobre os Municípios", na manhã do dia 30.

Fonte: Valor Econômico

'Encontro de contas' está sendo avaliado pelo Executivo

Edna Simão

BRASÍLIA - Para fazer um afago aos novos prefeitos, a presidente Dilma Rousseff permitiu, no fim do ano passado, que não só os municípios como também os Estados parcelassem suas dívidas com desconto de multas de 60% das multas de mora ou de ofício, 25 dos juros de mora e 100% dos encargos legais. A dívida poderá ser paga em parcelas - de até, em média 2% da receita corrente líquida do município ou Estado - retidas do Fundo de Participações dos Estados (FPE) e dos Municípios (FPM).

Os prefeitos, no entanto, querem mais. Eles pleiteiam um "encontro de contas" das dívidas com os créditos que as prefeituras têm a receber do governo federal para posterior adesão ao parcelamento. O assunto ainda está sendo avaliado. Há alguns anos a Marcha dos Prefeitos defende esse pleito que, até o momento, não foi atendido.

Para um técnico do governo, a dívida previdenciária da União com os municípios é de apenas R$ 800 milhões. A avaliação é que só haveria necessidade de um encontro de contas se esse valor fosse mais expressivo como já foi no passado.

Pelo novo parcelamento das dívidas do INSS, as parcelas poderão ser pagas com a retenção de recursos do Fundo de Participações dos Estados (FPE) e Fundo de Participações do Município (FPM). A adesão ao novo programa deve ser feito até 28 de março. A expectativa da Receita Federal é de que as dívidas sejam pagas em até 15 anos. Os municípios com Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS) também poderá parcelar suas dívidas em 20 anos, se utilizando dessas mesmas condições.

Segundo exposição de motivos da MP 589, encaminhada pelo Executivo e convertida em lei pelo Congresso Nacional no ano passado, somente 682 (12,28% do total) não apresentam dívidas relativas a Contribuição Previdenciária. As dívidas dos municípios totalizam atualmente R$ 11,3 bilhões de débitos não parcelados e R$ 22,3 bilhões de débitos parcelados, problema que poderia ser agravado com o potencial lançamento de créditos tributários que poderá atingir o valor de R$ 13,6 bilhões somente em relação aos fatos geradores do ano de 2010.

Fonte: Valor Econômico

Cordão do encarnado - Dora Kramer

O ex-presidente Luiz Inácio da Silva usurpa o poder de suas criaturas, é o que se diz sobre seus movimentos de interferência explícita no governo Dilma Rousseff e nos primeiros acordes da administração Fernando Haddad na Prefeitura de São Paulo.

Lula é alvo de toda sorte de críticas por desenhá-los como meras marionetes e tentar exercer de fato um poder que de direito não possui.

Não foi eleito, portanto não tem razão para se reunir com a equipe de Haddad para "traçar diretrizes". Não recebeu delegação presidencial para atuar como coordenador e, no entanto, age como se fosse a eminência mais nítida do governo federal.

Isso é o que parece; não necessariamente é o que acontece.

Primeiro, porque Dilma e Haddad detêm o poder de direito, estão lá sentados nas cadeiras que lhes couberam por candidaturas ungidas pelo criador e corroboradas pelo eleitor. Isso ninguém lhes tira.

Segundo, porque têm a perfeita noção de que estão à frente de duas importantes trincheiras de um projeto partidário cujo condutor é Lula. Estão - todos os participantes dessa "marcha" - pouco ligando para essas formalidades que assombram analistas da cena política. Querem mais é que o chefe suba ao palco. Quanto mais o ex-presidente exercita suas artes de atrair todas as atenções, menos o PT precisa tratar de seus problemas com a ética e com (a falta de) resultados concretos de sua gestão federal. O debate nacional se desvia dos problemas reais para uma questão surreal.

É como disse o ex-secretário geral da Presidência Luiz Dulci: "A movimentação de Lula é natural e desejável para o PT".

Até semana passada, crescia o debate sobre inflação, investimentos, fornecimento de energia, maquiagem de dados das contas governamentais, PIB pífio, excesso de interferência estatal na economia, reclamações de políticos e empresários, construção de alternativas eleitorais para 2014.

Até a reunião com a equipe de Haddad para produzir fotografia passível de gerar análises sobre a interferência de Lula, o PT ainda enfrentava rescaldo do julgamento do mensalão, graças à iniciativa da juventude petista de promover "jantar vaquinha" para ajudar a pagar as multas dos condenados. Como se José Dirceu, por exemplo, precisasse de auxílio para juntar R$ 676 mil.

Até então Lula estava calado, fugindo de jornalistas por lavanderias de hotel para não comentar as acusações contra sua protegida Rosemary Noronha e o depoimento de Marcos Valério à Procuradoria-Geral da República, que ensejou pedido de abertura de investigação contra o ex-presidente no esquema posto a nu pelo Supremo Tribunal Federal.

Nos últimos dias a pauta mudou: são os encontros de Lula com secretários, aconselhamentos de Lula para Dilma mudar o rumo do governo, anúncios de reuniões dele com ministros, a caravana de Lula País afora, a conversa de Lula com a presidente nesta sexta-feira, o papel de Lula como articulador da base no Congresso, a inadequação da conduta de Lula, enfim, uma virada de agenda com Lula ao centro em seu mais confortável papel.

Critica-se o ex-presidente por não "desencarnar"do cargo como havia prometido, levantam-se bandeiras em defesa da autonomia de Dilma, aceitam-se versões de que ela estaria desolada com essa interferência e, assim, cumpre-se exatamente o roteiro que interessa a Lula, ao Planalto e ao PT: fazer do ex-presidente o centro de tudo, privilegiando o acessório (as andanças dele) em detrimento do principal (as questões éticas e administrativas em aberto).

O truque não é novo, mas continua eficaz porque há quem caia nele: por vontade ou falha de percepção. Resta conferir o efeito da realidade adiante sobre o prazo de validade desse tipo de dom de iludir a quem se dispõe a ceder às artimanhas do ilusionismo.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Um cidadão acima de qualquer suspeita - Marco Antonio Villa

Luiz Inácio Lula da Silva se considera um cidadão acima de qualquer suspeita. Mais ainda: acha que paira sobre as leis e a Constituição. Presume que pode fazer qualquer ato, sem ter que responder por suas consequências. Simula ignorar as graves acusações que pesam sobre sua longa passagem pela Presidência da República. Não gosta de perguntas que considera incômodas. Conhecedor da política brasileira, sabe que os limites do poder são muito elásticos. E espera que logo tudo caia no esquecimento.

Como um moderno Pedro Malasartes, vai se desviando dos escândalos. Finge ser vítima dos seus opositores e, como um sujeito safo, nas sábias palavras do ministro Marco Aurélio, ignora as gravíssimas acusações de corrupção que pesam sobre o seu governo e que teriam contado, algumas delas, com seu envolvimento direto. Exigindo impunidade para seus atos, o ex-presidente ainda ameaça aqueles que apontam seus desvios éticos e as improbidades administrativas. Não faltam acólitos para secundá-lo. Afinal, a burra governamental parece infinita e sem qualquer controle.

Indiferente às turbulências, como numa comédia pastelão, Lula continua representando o papel de guia genial dos povos. Recentemente, teve a desfaçatez de ditar publicamente ordens ao prefeito paulistano Fernando Haddad, que considerou a humilhação, por incrível que pareça, uma homenagem.

Contudo, um espectro passou a rondar os dias e noites de Luiz Inácio Lula da Silva, o espectro da justiça. Quem confundiu impunidade com licença eterna para cometer atos ilícitos está, agora, numa sinuca de bico. O vazamento do depoimento de Marcos Valério - sentenciado no processo do mensalão a 40 anos de prisão - e as denúncias que pesam sobre a ex-chefe do gabinete da Presidência da República em São Paulo, Rosemary Noronha, deixam Lula contra a parede. O figurino de presidente que nada sabe, o Forrest Gump tupiniquim, está desgastado.

No processo do mensalão Lula representou o papel do traído, que desconhecia tratativas realizadas inclusive no Palácio do Planalto - o relator Joaquim Barbosa chamou de "reuniões clandestinas"; do mesmo modo, nada viu de estranho quando, em 2002, o então Partido Liberal foi comprado por 10 milhões, em uma reunião que contou com sua presença. Não percebeu a relação entre o favorecimento na concessão para efetuar operações de crédito consignado ao BMG, a posterior venda da carteira para a Caixa Econômica Federal e o lucro milionário obtido pelo banco. Também pressionou de todas as formas para que, em abril de 2006, não constassem do relatório final da CPMI dos Correios as nebulosas relações do seu filho, Fábio Luiz da Silva, conhecido como Lulinha, e uma empresa de telefonia.

No ano passado, ameaçou o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes. Fez chantagem. Foi repelido. Temia o resultado do julgamento do mensalão, pois sabia de tudo. Tinha sido, não custa lembrar, o grande favorecido pelo esquema de assalto ao poder, verdadeira tentativa de golpe de Estado. A resposta dos ministros do STF foi efetuar um julgamento limpo, transparente, e a condenação do núcleo político do esquema do mensalão, inclusive do chefe da quadrilha - denominação dada pelo procurador-geral da República Roberto Gurgel - sentenciado também por corrupção ativa, o ex-ministro (e todo poderoso) José Dirceu, a 10 anos e 10 meses de prisão. Para meio entendedor, meia palavra basta.
As últimas denúncias reforçam seu desprezo pelo respeito às leis. Uma delas demonstra como sempre agiu. Nomeou Rosemary Noronha para um cargo de responsabilidade. Como é sabido, não havia nenhum interesse público na designação. Segundo revelações divulgadas na imprensa, desde 1993 tinham um "relacionamento íntimo" (para os simples mortais a denominação é bem distinta). Levou-a a mais de duas dúzias de viagens internacionais - algumas vezes de forma clandestina -, sem que ela tenha tido qualquer atribuição administrativa. Nem vale a pena revelar os detalhes sórdidos descritos por aqueles que acompanharam estas viagens. Tudo foi pago pelo contribuinte. E a decoração stalinista do escritório da Presidência em São Paulo? Também foi efetuada com recursos públicos. E, principalmente, as ações criminosas dos nomeados por Lula - para agradar Rosemary - que produziram prejuízos ao Erário, além de outros danos? Ele não é o principal responsável? Afinal, ao menos, não perguntou as razões para tais nomeações?

Se isto é motivo de júbilo, ele pode se orgulhar de ter sido o primeiro presidente que, sem nenhum pudor, misturou assuntos pessoais com os negócios de Estado em escala nunca vista no Brasil. E o mais grave é que ele está ofendido com as revelações (parte delas, registre-se: e os 120 telefonemas trocados entre ele e Rosemary?). Lula sequer veio a público para apresentar alguma justificativa. Como se nós, os cidadãos que pagamos com os impostos todas as mazelas realizadas pelo ex-presidente, fôssemos uns intrusos e ingratos, por estarmos "invadindo a sua vida pessoal".

Hoje, são abundantes os indícios que ligam Lula a um conjunto de escândalos. O que está faltando é o passo inicial que tem de ser dado pelo Ministério Público Federal: a investigação das denúncias, cumprindo sua atribuição constitucional. Ex-presidente, é bom que se registre, não tem prerrogativa de estar acima da lei. Em um Estado Democrático de Direito ninguém tem esse privilégio, obviamente. Portanto, a palavra agora está com o Ministério Público Federal.

Fonte: O Globo, 22/1/2013.

Cacique Lula – Folha de S. Paulo / Editorial

Depois de presidir reunião com secretários de Haddad, o ex-presidente segue na trilha do personalismo e anuncia ofensiva na esfera federal

Nas palavras do ex-ministro Paulo Vannuchi, atual membro da diretoria do Instituto Lula, o ex-presidente, a partir do próximo mês, irá "jogar toda a sua energia" no esforço de consolidar as alianças entre as forças que apoiam o governo Dilma Rousseff. A tarefa do líder petista seria identificar conflitos e procurar superá-los.

Lula não precisará de muito esfoço para cumprir a primeira parte da missão. Os conflitos já são, na maior parte, conhecidos. Os aliados, em especial os peemedebistas, queixam-se da rivalidade do PT e do tratamento dispensado pela presidente Dilma a suas demandas fisiológicas. O Planalto se mostraria mais rude e menos sensível do que desejariam.

Além disso, causam preocupação as ambições do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, à Presidência da República. A candidatura do líder do PSB já em 2014 sem dúvida enfraqueceria a campanha pela reeleição de Dilma.

Para consolidar essas fraturas, a famosa lábia do ex-presidente não será suficiente. Ele terá de oferecer cargos, vantagens e até acenar com a longínqua possibilidade de apoiar um candidato não petista na disputa de 2018.

Nesse contexto, não é demais lembrar que Lula não ocupa cargo no governo. Embora nada o proíba de participar de articulações e defender teses e propostas, seria mais adequado que agisse com discrição e desse preferência aos caminhos institucionais, como o debate em âmbito partidário.

Em se tratando de PT, porém, não existe âmbito partidário. Ou, se existe, é integralmente preenchido pela figura de Lula. "Le parti c'est moi" (o partido sou eu) poderia ser seu lema, na pior tradição personalista da política brasileira. Na contramão da mudança de hábitos que o petismo outrora defendia, o ex-presidente comporta-se como um perfeito cacique.

O êxito na eleição da presidente Dilma e, a seguir, do prefeito Fernando Haddad, em São Paulo, parece ter reacendido em Lula a fagulha da onipotência. O revés no julgamento do mensalão, por sua vez, parece ter impulsionado a decisão de sugerir a todos que ainda está no controle.

Foi o que fez recentemente, numa cena constrangedora, ao presidir uma reunião de Haddad com secretários. Sem pudor em tratar seu "poste" como "poste", assumiu o comando da mesa, apontou diretrizes e deu orientações ao afilhado e seus colaboradores.

Vai-se assistindo ao mesmo na esfera federal, onde agora se anuncia nova investida. Em ambas as circunstâncias, a interferência cria ruídos indesejáveis e apequena a figura dos governantes. A quem cabe a última palavra? Quem o primeiro escalão deve prestigiar em caso de divergências?

A pergunta pareceria absurda em qualquer democracia séria, mas é cabível nesse enredo em que o ex-presidente mostra-se tentado a continuar governando sem ter sido eleito. É um desserviço que Lula presta ao permitir que essas interrogações fiquem no ar.

Lula e Dilma, jogo jogado – O Estado de S. Paulo / Editorial

Agora é "oficial". Os três mais próximos colaboradores do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva desmancharam o sonho secreto, ou nem tanto, de muitos petistas de ver o primeiro companheiro disputando novamente o Planalto em 2014. Provocados pelos jornalistas, os ex-ministros Luiz Dulci (Secretaria-Geral da Presidência) e Paulo Vannucchi (Direitos Humanos), além do presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, foram categóricos ao afirmar que não passa pela cabeça do chefe fazer da sucessora Dilma Rousseff presidente de um mandato só. Ele a escolheu, impôs o seu nome ao partido, percorreu o País divulgando o seu aval à candidatura da ministra praticamente desconhecida, elegeu-a - e não pretende removê-la.

É fato que o patrono não desencarnou do poder. Passados dois anos desde que desceu a rampa do Planalto para se atirar, literalmente, nos braços da multidão, Lula ainda não cumpriu o pacto que disse ter feito consigo mesmo de "mostrar que era possível ser um ex-presidente sem se meter no exercício de quem estava (sic) na Presidência", conforme as palavras que lhe atribuíram em um evento a portas fechadas, anteontem, no seu instituto - onde o trio de auxiliares se manifestou sobre a "nossa candidata". Na montagem do governo Dilma, Lula como que assinou pessoalmente a nomeação de diversos ministros, a começar do seu homem de absoluta confiança, Gilberto Carvalho, para a Secretaria-Geral da Presidência.

Desde então, Dilma consultou o mentor inumeráveis vezes, sem contar as ocasiões em que a iniciativa partiu dele. O tumor na laringe que o acometeu ano passado apenas diminuiu temporariamente a intensidade da sua curadoria. Mesmo quando atingido por sucessivas más notícias - o resultado do julgamento do mensalão; as traficâncias do pessoal ligado à então chefe do escritório da Presidência em São Paulo, sua namorada Rose; e a acusação do publicitá¬rio Marcos Valério de que ele não apenas aprovou o esquema de compra de votos, mas tirou uma casquinha da dinheirama envolvida Lula ficou na muda, mas não inativo politicamente. Agora há pouco voltou com a corda toda.

Orientou Dilma a se entender com o empresariado para emergir das "dificuldades", segundo o eufemismo empregado por Paulo Okamotto para se referir ao pibinho de 2012, ditou as diretrizes da recém-iniciada gestão de Fernando Haddad - o segundo poste que alçou ao poder - na Prefeitura de São Paulo e fez saber que tornará a viajar pelo Brasil, numa versão atualizada das suas Caravanas da Cidadania na década de 1990. Somou-se a isso a inquietação difusa no PT com os possíveis efeitos do raquitismo econômico para as chances reeleitorais da presidente (que, por sinal, só se filiou ao partido em 2001, passados 30 anos de sua fundação) para avivar a hipótese Lula-14. 0 cenário Lula-18 não foi de to¬do excluído por seus auxiliares.

Não se sabe se alguma vez padrinho e apadrinhada conversaram sobre a eventualidade de ela desistir da busca do segundo mandato. Tampou¬co se sabe se eles se desavieram por causa disso. De todo modo, caso algo do gênero tenha ocorrido, seriam águas passadas - e o PT que trate de trabalhar para manter no Planalto a companheira que jamais seria a sua primeira escolha para suceder a Lula, o presidente que formava com o partido uma entidade una. Ele, por sua vez, se empenhará naquilo em que é, aí sim, insubstituível - articular a "segurança política" para a reeleição. Ou seja, consolidar a aliança PT-PMDB e dissuadir o PSB de alçar voo próprio, com a eventual candidatura do governador de Pernambuco, Eduardo Campos.

Ocupando a vice-presidência da República e devendo eleger em fevereiro, como combinado ainda no tempo de Lula na chefia do governo, os titulares da Câmara e do Senado para o biênio 2013-2015, Henrique Alves e Renan Calheiros, o PMDB acumulará nesta segunda metade da presidência Dilma amplos poderes - cacife que Lula decerto levará em conta na operação em que, segundo o assessor Paulo Vannuchi "jogará toda a sua energia". Curioso o quadro político atual: o jogo sucessório não assume a forma de um confronto entre situação e oposição; é jogado exclusivamente nas mesas do governo.

O poder sem pudor - Rosângela Bittar

Um dos fatos que mais incomodam os senadores com biografia, na rentrée 2013, é o caráter clandestino da candidatura de Renan Calheiros a presidente do Senado, posto a que pretende voltar depois de tê-lo abandonado às pressas para não sucumbir à perda do mandato por falta de decoro. Em dezembro, no coquetel de fim de ano que o atual presidente José Sarney ofereceu aos seus pares, Renan foi abordado por um grupo de senadores e Cristovam Buarque (PDT-DF) perguntou-lhe sobre planos para reestruturação, moralização e administração do Senado, ouvindo como resposta apenas que não sabia ainda se seria candidato. É o que ainda diz, hoje, faltando dez dias para a eleição em que pretende ser ungido sem pedir um único voto e sequer declarar-se na disputa. Um escárnio.

Senadores da República estão diante de um presidente virtualmente eleito, com o apoio total do governo federal, que não pode sequer admitir a candidatura porque se sair de baixo da cama tem medo de ser alvejado por denúncias. Renan, certamente, está seguindo o conselho de algum especialista em gestão de crise, tipos que devem tê-lo atendido quando foi obrigado a renunciar ao cargo, que agora exige de volta, por ter suas contas pessoais pagas por uma empreiteira.

Renan Calheiros será eleito e o ônus para o futuro do Senado, e do país, fica muito na conta do Palácio do Planalto, do governo federal e do PT, embora senadores de vários partidos façam uma autocrítica que não os isenta de responsabilidade no estado calamitoso a que chegou a Casa.

Anticandidatura é referendo à clandestinidade

É verdade que um grupo vem tentando um reparo político à sociedade pelas mazelas ali vividas, mas não logrou êxito. De diferentes partidos, de governo e oposição, senadores rebelaram-se a esse prato mal feito no Senado. Em reuniões, ora na casa de um, ora na de outro, às vezes em restaurante, vinham debatendo a situação do poder que integram e procurando uma saída. A presidente Dilma Rousseff parecia querer uma solução afinada com o grupo ético. Chegou a oferecer a Renan apoio à sua candidatura ao governo de Alagoas, convidou o ministro Edison Lobão (PMDB) a deixar o cargo para ser o presidente do Senado na sucessão de Sarney, mas em determinado momento rendeu-se à vontade de Renan, que já dobrara o PMDB, de cambulhão o vice-presidente Michel Temer e José Sarney. Dilma capitulou.

Um dos senadores do grupo ético era Luiz Henrique (PMDB-SC), que tinha condições de disputar a presidência e até vencer, porque com ele iria parte do PMDB. Dilma levou-o a tiracolo, numa viagem à Rússia, e de lá ele voltou informando aos colegas que perdera condições de candidatar-se.

Com a desistência, os senadores engajados no projeto de futuro desistiram de lutar e passaram a elaborar planos de resgate a serem propostos à nova mesa. Na eleição optariam pela abstenção.

Até que, contra a conselho do grupo, o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), resolveu lançar a sua anticandidatura. Ele argumentou que a abstenção seria um protesto tímido. Mas é mais efetivo. A abstenção, no contraponto a uma candidatura clandestina, seria um protesto real. A anticandidatura, porém, referenda o candidato voluntarista.

Se o anticandidato receber 20 votos, terá perdido feio com um quarto dos votos do Senado. Se a abstenção tiver 20 votos, é um protesto considerável, em um colégio de 81, contra o acinte que o governo, o PMDB e o PT protagonizam no Poder Legislativo. Para Renan Calheiros é melhor ter um adversário pequeno que um número grande de abstenções. Nessas se evidencia uma disputa entre ele e seu dossiê.

O senador Randolfe não entendeu assim e confirma-se outro anticandidato, o senador Pedro Taques (PDT-MT). Os dois pertencem ao grupo que se reunia para tentar um caminho novo para o Senado, têm pretensões de assumir logo uma liderança política no seu Estado (Randolfe levou o PSOL à Prefeitura de Macapá, começando a ocupar o curral eleitoral do senador José Sarney).

"Não sei se é por omissão, conivência ou incompetência, mas não estamos conseguindo fazer o Senado debater o seu futuro", afirma Cristovam Buarque. Ele fez uma carta a 43 senadores expondo ideias e caminhos de sobrevivência. Até enviou sua carta a alguns senadores, poucos, do PT, embora nenhum do partido do governo tenha comparecido às reuniões de quem pretende tirar o Senado das chamas.

Os senadores estão sendo usados, são votos de cabresto e vão eleger um presidente que sequer admite a eles sua candidatura. Embora o grupo dos éticos se preocupe em manter o respeito da sociedade, não consegue adquirir força política, competência.

O que se diz é que, ao escolher o senador Jorge Viana, do PT do Acre, para ser o vice de Renan, o PMDB amarrou os votos do PT e do governo. Se impedido o presidente por alguma razão possível e provável, o partido do governo assume. Mas é um jogo não informado aos eleitores. Eduardo Suplicy, um petista considerado independente, não foi a nenhuma conversa do grupo pluripartidário que gostaria de transformar a Casa. Walter Pinheiro, da Bahia, José Pimentel, do Ceará, sequer foram chamados para não se constrangerem.

Resta aos senadores que ainda querem insistir nas suas propostas, tornar mais difícil o uso da Casa como serventia de poucos.

Muitos senadores que frequentam as reuniões de debate dizem sentir "vergonha". Mas não têm forças. Na Câmara o candidato favorito para vencer também não prima pela biografia, mas ali, pelo menos, está havendo uma campanha real, disputa de votos.

Como o Senado chegou a esse estado de indigência política, intelectual, legislativa? "Primeiro, nós fomos perdendo poder e depois fomos perdendo pudor", diz Cristovam. A perda de poder chegou com a imposição do Executivo, que escolhe o presidente e a agenda, tudo decide por medida provisória. Já enfraquecido, foi perdendo poder também para o Judiciário, por incompetência. O senador culpa a todos, inclusive a si próprio, pela falta de debate, por ninguém ouvir quando o outro fala, pelo voto com o corpo (quem está de acordo fique como está), pelo excessivo poder dos líderes que decidem tudo.

"Uma das propostas que coloco na minha carta é mudar a consultoria jurídica ou dar independência a ela. A consultoria autoriza o Senado a passar por cima de decisões do Supremo. Caímos na falta do pudor, de fazer qualquer coisa".

O Congresso é um poder subtraído por todos, não fala e não ouve. Um grupo fechado monopoliza esse poder. E assim continua, por mais esta Legislatura, quem sabe a próxima e a seguinte, para todo o sempre.

Fonte: Valor Econômico

Tio Sam e nós - Igor Gielow

É interessante ver como Barack Obama é quase uma unanimidade no Brasil. Pesquisas davam conta de uma "intenção de voto" ao democrata que lhe garantiria uma vitória aqui muito maior do que a que obteve ano passado em casa.

Claro, há o fator simpatia. Bush era associado a políticas belicistas e tal. Texano branco e bronco, não tem o apelo cosmopolita do negro de nome muçulmano/africano, ainda que Obama tenha passado também pelas forjas da elite americana.

Mas o fato é que o Brasil foi lateral na política externa do primeiro mandato de Obama, talvez pela falta da afinidade anímica que havia entre Bush e Lula, e ainda não há indicações de que isso será alterado.

Houve, sim, uma distensão devido à saída dos antiamericanos mais estridentes de posições centrais do Itamaraty, após a chegada de Dilma em 2011, e a avanços pontuais.

A relação econômica segue firme, mas sem exatamente um salto qualitativo. Obama fez um dos governos mais anticapitalistas recentes, no particular do livre-comércio, e Dilma prefere uma visão setentista de protecionismo a campeões nacionais (para usar o eufemismo vigente).

É possível argumentar, algo folcloricamente, que é bom para o Brasil estar fora do radar de um país que viola diariamente a soberania de outros com o uso de aviões-robôs. Lulistas e dilmistas sempre correm a dizer que os EUA já não nos importam tanto só porque variamos o cardápio da balança comercial.

Erros grosseiros. O Ocidente, para bem e para mal, é liderado por Washington. Assim, é bom enxugar as lágrimas que derramou pelo discurso docemente progressista (como se "drones" o fossem) da posse de Obama, caro humanista de Facebook.

É muito mais a dinâmica da complexa relação com o Tio Sam, e não os frutos ainda instáveis da relação Sul-Sul ou os ditames mercantilistas de Pequim, que nos molda hoje e no futuro próximo como atores globais.

Fonte: Folha de S. Paulo

Obama ameaçou partir para a briga - Elio Gaspari

Com um discurso de campanha, companheiro diz "vai ou racha", mas pode ir a lugar nenhum

Toda vez que um presidente americano repete a frase lapidar da Declaração da Independência ("todos os homens são criados iguais...") está falando muito sério ou não está dizendo coisa nenhuma. Se daqui a quatro anos o companheiro Barack Obama tiver emendado a divisão existente no seu país, terá sido um grande presidente.

Por enquanto, chega ao seu segundo mandato com a mesma bagagem de sua primeira campanha: "esperança". Com oito recursos aos trechos iluminados do texto de Thomas Jefferson teve seu melhor momento quando disse que "nós não acreditamos que a liberdade esteja reservada para os afortunados ou a felicidade, para uns poucos". De novo, pode ser muito, ou nada.

Contrariando os costumes, o companheiro chamou a oposição para a briga. Fez isso há quatro anos, quando tinha maioria na Câmara e no Senado. Triunfou aprovando a reforma do sistema de saúde (o que não é pouca coisa) e reelegeu-se (o que pode ser grande coisa).

Os Estados Unidos continuam matando estrangeiros em operações secretas. A prisão de Guantánamo vai bem, obrigado. O "stalinismo de mercado" chinês vai melhor hoje do que ia quando ele entrou na Casa Branca. Cuba continua bloqueada pelo medo democrata de perder o eleitorado da Flórida.

A banca foi resgatada, carregando consigo os bônus. O presidente do Citibank, casa que Obama salvou da guilhotina, foi dispensado em outubro passado, mas nos últimos cinco anos acumulara um ervanário de US$ 221 milhões. Obama transformou Paul Volcker num perigoso intervencionista. Logo o chefe do Fed que domou a inflação e quebrou o Terceiro Mundo, inclusive Pindorama. Levou-o para o governo e, habilmente, dispensou-o.

O companheiro repetiu várias vezes a expressão, "nós, o povo", mas, ao contrário de Abraham Lincoln, chamou os adversários para se juntarem àquilo que ele chama de "nós". Seu genial antecessor fazia concessões que os aliados consideravam absurdas, mas tinha a seu favor a força das armas numa guerra civil que dificilmente perderia. Quando prevaleceu militarmente, acabou com a escravidão, coisa que não teria feito se os conservadores tivessem entendido que era mais forte e mais esperto que eles. Se daqui a quatro anos Obama tiver conseguido tomar medidas igualitárias como, por exemplo, rever a situação dos imigrantes, será um vitorioso.

O discurso de Obama aprofunda as divisões americanas, num país em que a esquerda vai em cima de Quentin Tarantino porque usa a palavra "crioulo" no filme "Django" e a direita retardou a estreia do "Lincoln" de Steven Spielberg porque viu nele um panfleto de propaganda democrata. Seria, se a emenda constitucional que aboliu a escravidão pudesse ser considerada propaganda.

Os primeiros quatro anos de Obama ensinaram que ele tem uma paciência infinita enquanto lida com os meios. Em matéria de fins, não deu caldo.

A radicalização republicana, que transformou o moderado Mitt Romney num extremista fracassado, pode refluir para o centro, mas a última campanha eleitoral mostrou que o futuro da direita americana depende de uma ida para o centro. Pelo menos num primeiro momento, o discurso de posse de Obama não contribuirá para isso.

Fonte: O Globo

O discurso de Obama – O Estado de S. Paulo / Editorial

O presidente Barack Obama comemorou o início de seu segundo mandato, na segunda-feira, 21, em dois bailes de gala. Há quatro anos, quando tomou posse pela primeira vez, foram nada menos que dez festas, uma maratona condizente com o júbilo daquela hora. O novo momento de Obama é, portanto, menos exuberante, mas o primeiro presidente negro dos Estados Unidos anunciou à imensa multidão que o acompanhou em Washington que vai aproveitar a chance dada pela reeleição para provar que pode fazer a diferença. Em seu sóbrio, mas denso discurso, Obama prometeu explorar a legitimidade dos votos recebidos para impor a agenda do Partido Democrata, por meio da presença maior do governo, privilegiando os mais pobres e enfrentando a oposição republicana sem a condescendência que marcou seu primeiro mandato, a despeito da necessidade de fazer acordos para superar a crise econômica.

A promessa de igualdade permeia sua agenda para os próximos anos. "Não acreditamos que neste país a liberdade seja reservada para os que têm sorte, ou que a felicidade seja para uns poucos", declarou. Obama citou as lutas pela igualdade de direitos dos negros, das mulheres e dos homossexuais como bandeiras de seu governo. Pela primeira vez, a palavra "gay" apareceu num discurso de posse presidencial nos EUA, dando a dimensão da importância que Obama pretende dar ao tema, para arrepio da oposição conservadora. Ele também mencionou a necessidade de reformar as leis de imigração, de modo que os "estudantes e engenheiros brilhantes sejam adicionados à força de trabalho, e não expulsos de nosso país".

Questões ambientais foram as que receberam o maior destaque no discurso, num desafio direto àqueles que são céticos em relação aos efeitos do aquecimento global, que dizem que o uso de "energia limpa" pode custar milhares de empregos e que defendem a indústria do petróleo. O desempenho de Obama nesse quesito, no primeiro mandato, foi decepcionante. Graças também a políticos democratas cuja base de apoio se encontra em Estados produtores de carvão, ele não conseguiu aprovar uma legislação que reduzisse substancialmente a emissão de gases de efeito estufa. Agora, Obama quer que o governo federal seja exemplar na contenção da poluição. Será criada uma agência de proteção ambiental para reduzir as emissões de gases de usinas elétricas que usam carvão, e o governo pretende impor novos padrões de uso de energia em edifícios.

Em relação à política externa, Obama deu ênfase relativamente pequena ao tema, coerente com sua doutrina de "liderar por detrás", mas ele sabe que não poderá contornar questões-chave, como o programa nuclear do Irã, a instabilidade do Oriente Médio, os efeitos da Primavera Árabe e a hostilidade da Rússia. Além disso, há a relação com a China, cuja economia caminha para superar a dos EUA e cuja emergência obrigou Washington a mudar o eixo de sua atuação internacional para a Ásia. A despeito desses cenários, Obama reafirmou sua decisão de não colocar seu país novamente em conflitos externos, porque "garantir a segurança e a paz duradoura não requer a guerra perpétua", tão ao gosto da ala ultraconservadora republicana.

Em seu primeiro mandato, Obama teve de lidar com uma crise que consumia 800 mil empregos por mês e com duas guerras de altíssimo custo e de sentido bastante duvidoso. Ele atravessou esse momento com mais aspectos positivos do que negativos e, apesar de haver muito ainda a fazer para que os EUA coloquem em ordem sua situação fiscal e voltem a ter liderança global incontestável no plano econômico, o país parece estar no caminho da recuperação. Sendo assim, conforme deixou claro em seu pronunciamento, Obama pretende dedicar seu próximo termo à tarefa de fazer história - e a missão de "construir nações" (nation-building), tão invocada pelos Estados Unidos para atuar em países em conflito pelo mundo afora, agora se aplica aos próprios americanos. Obama comprometeu-se a "reconstruir" os Estados Unidos, sobre bases progressistas.

Assume uma versão ‘radical’ de Obama – O Globo / Editorial

Presidente inicia segundo mandato com agenda ao gosto da esquerda democrata, mas precisa mostrar serviço até as eleições de meio de mandato

Em seu segundo mandato, o presidente Barack Obama ganha maior liberdade de ação. Ele pode ser mais assertivo — e o foi, no discurso de posse —, porque não mais disputará cargo eletivo. Mas o tempo corre contra ele. A rigor, tem dois anos para avançar e inscrever o nome na História como um grande presidente — o primeiro negro a ocupar o cargo. Em novembro de 2014 ocorrerão as eleições de meio de mandato, para renovar a Câmara de Representantes e um terço do Senado, além de governos estaduais. Uma recuperação no Senado dos republicanos, que já controlam a Câmara, tornaria torturante os dois últimos anos de Obama e ameaçaria seu legado.
Diante de uma nação em que transcorre duro choque político-partidário, o presidente enfatizou a necessidade de união dos americanos. Mas deixou claro que não pretende tolerar o impasse no Congresso que marcou seu primeiro mandato. Mas precisa combinar com o eleitorado de 2014.

Sua primeira eleição elevou de tal modo as expectativas dos americanos que se apequenaram os feitos obtidos no primeiro mandato. Entre eles, o fato de ter evitado que os EUA caíssem na segunda grande depressão. O surgimento do Tea Party empurrou os republicanos de tal forma para o confronto que o sonho da política “acima dos partidos” logo se revelou uma quimera. Obama se encolheu e perdeu boa parte do encanto que despertara.Mas venceu grande batalha: a reforma do sistema de saúde pública, que garantiu assistência médica a milhões de americanos. Esse compromisso com os menos favorecidos foi decisivo para a reeleição, combinado com alterações demográficas que revelaram expansão de setores da população que tradicionalmente votam nos democratas: imigrantes, com destaque para os hispânicos, negros e pobres.

Obama apresentou, agora, uma agenda liberal (esquerda no jargão americano), bem ao gosto de correntes democratas. Seus planos, entre outros pontos, incluem a reforma das leis de imigração — um aceno a eleitores fieis —, investimentos em rodovias e infraestrutura, direitos e salários iguais para as mulheres e reformulação do código tributário para combater desigualdades. Na posse, não falou no controle do acesso a armas, tema que deverá abordar no discurso do Estado da União, mês que vem, no Congresso. Mas inclui o meio ambiente em sua agenda, outro tema liberal. Obama tornou-se, ainda, o primeiro presidente a assumir, numa posse, o compromisso com a igualdade de direitos de “nossos irmãos e irmãs gays”.

Mas a vida real é implacável. Terá de enfrentar em março mais uma desgastante rodada de negociações com os republicanos em torno do aumento do teto do endividamento público americano. Quando será pressionado por cortes de despesas, uma ameaça à sua promessa de igualdade social. E ainda conspira contra os planos da Casa Branca de intervir militarmente o mínimo possível no exterior a ebulição sectária no Norte da África.

Eleições na Itália


Mais política em Davos - Merval Pereira

O Fórum Econômico Mundial que começa hoje em Davos, na Suíça, é talvez o mais político dos últimos anos e terá como centro das discussões o papel da sociedade civil num novo mundo que está se formando, longe das hegemonias e com mudanças tecnológicas e demográficas que exigem dos líderes, tanto políticos como empresariais, novas posturas, bem definidas na pesquisa "O futuro papel da sociedade civil". Divulgada ontem, ela mostra que essas mudanças representam uma pressão crescente sobre as instituições para que elas promovam justiça social e responsabilidade.

Todos os participantes das ações, sejam tradicionais atores ou emergentes, devem experimentar novos modelos de engajamento e manter uma postura de "desafio construtivo" da situação atual. A pesquisa demonstra que a sociedade civil nunca na História foi tão importante e influente quanto agora, como indicam os recentes protestos de representantes da sociedade em diversos pontos do mundo, especialmente através das novas redes de relacionamento na internet. Elas estão criando populações crescentemente conectadas, mais educadas e responsáveis, em tempos de incertezas econômicas e políticas. A reunião de Davos se realiza no que está sendo considerada "a mais complexa, interdependente e interconectada" era da História da Humanidade, quando grandes desafios de mudanças e oportunidades de transformação confrontam os líderes e exigem organizações capazes de comandar estratégias ágeis e construir estruturas capazes de resistir aos riscos.

Não por acaso o documento do fórum que traça um panorama da agenda para este ano destaca que a capacidade de liderança é considerada o maior desafio daqui para a frente. Segundo Martina Gmür, que coordena o trabalho, a maioria dos líderes em ação em nossos dias cresceu em um mundo completamente diferente. Também o diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Pascal Lamy, que faz parte do grupo que analisa a agenda global, diz que temos necessidade de uma "governança global" que tenha as necessárias capacidades, poder e energia para criar ambiente de negociação internacional em nível mais elevado.

Ao mesmo tempo em que tenta antecipar a agenda global, esse grupo do fórum faz uma pesquisa sobre o índice de confiança no mundo. Embora tenha melhorado do ano passado para cá, o índice continua abaixo do que seria o "território otimista". Subiu de 0,38 para 0,43 numa escala do 0 a 1, com a percentagem de líderes que temem uma crise econômica catastrófica caindo de 53% para 48%, sendo que a retomada da confiança é mais marcante entre os empresários dos Estados Unidos.

O número de empresários e líderes com visão pessimista caiu de 56% para 43%, e a percentagem de otimistas subiu de 17% para 23|%. Este é o segundo nível mais elevado de confiança econômica desde que o índice começou a ser pesquisado, há cerca de dois anos, e o índice de pessimismo é o mais baixo já registrado até hoje. Mas há ainda sinais de insegurança, como demonstram os 51% que não acreditam que a governança mundial esteja preparada para enfrentar a crise, e os 45% que não acreditam numa cooperação mundial para solucionar a crise econômica.

É esse sentimento misto de alívio e preocupação que vai dominar em Davos, que terá como motivação central a capacidade da União Europeia (UE) de superar a crise. Com a sensação de que a parte mais aguda já passou sem que a UE sofresse dissidências, agora as preocupações se voltam para a capacidade de manutenção de uma agenda de restrições para que os países mais afetados, como Grécia e Portugal, consigam se recuperar plenamente.

Há a preocupação de que os resultados obtidos até agora estimulem nos líderes europeus um sentimento de complacência, como se todas as questões estivessem resolvidas. Os principais líderes europeus, como a alemã Angela Merkel, o britânico David Cameron e o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, serão as estrelas do encontro, inclusive porque os Estados Unidos não estão mandando qualquer autoridade do primeiro escalão para a reunião.

Fonte: O Globo

Os recordes do BNDES - Celso Ming

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) assumiu proporções gigantescas. É, por exemplo, quase equivalente em volume de financiamentos ao Banco Mundial - criado em Bretton Woods (1946), com o Fundo Monetário Internacional, para alavancar o desenvolvimento mundial.

Ontem, seu presidente, Luciano Coutinho, desfilou recordes e mais recordes: desembolsos de R$ 156 bilhões em 2012 - 12% a mais do que no ano anterior; consultas por novos financiamentos no valor de R$ 312,3 bilhões; e aprovação de R$ 260,1 bilhões em novos projetos.

O BNDES continua sendo uma entidade estratégica no desenvolvimento do Brasil e é objeto de admiração. Argentinos, por exemplo, morrem de inveja porque os brasileiros têm o BNDES e eles não. Estão sempre apontando sua atuação como um dos elementos criadores das tais assimetrias e de outras desvantagens da sua economia em relação à do Brasil.

Mas não dá para dizer que o BNDES seja uma instituição que só traga benefícios para o interesse nacional. Também é problema - e problema sério.

Nos três últimos anos vem se beneficiando de uma relação incestuosa com o Tesouro. Recebe recursos oficiais de grande magnitude (em geral, títulos da dívida pública), sobre cujo emprego não presta contas ao Congresso Nacional. E opera com subsídios e juros favorecidos sem que estes sejam incluídos no Orçamento da União.

Essas distorções produzem ainda outras mais. Uma delas é o bloqueio do desenvolvimento de um mercado de capitais sadio no Brasil. Nenhum banco consegue competir com o BNDES no financiamento de projetos de longo prazo por não contar com a mesma fonte (funding) subsidiada de recursos. As grandes empresas, por sua vez, se desinteressam por lançar debêntures e outros títulos de longo prazo no mercado, porque o BNDES está sempre pronto a fornecer recursos a custos mais camaradas. E um país sem um mercado de capitais desenvolvido corre o risco de destruir sua capacidade de crescer.

Outra distorção - para a qual algumas vezes o Banco Central já chamou a atenção - é a sabotagem, digamos assim, que o BNDES faz à política monetária (política de juros). Como opera com juros inferiores aos praticados no mercado, o Banco Central está sempre obrigado a puxar os juros básicos (Selic) para acima do nível "normal", para compensar o jogo contra do BNDES e, assim, dar conta da tarefa de combater a inflação. Em outras palavras, o BNDES é parte das explicações para juros tão elevados no Brasil.

Uma terceira distorção acontece nas condições de competição no mercado. Grande número de financiamentos do BNDES elege arbitrariamente certos grupos econômicos, nem sempre sadios, para que se tornem os campeões do futuro. Dessa maneira, criam circunstâncias artificiais que agem como fatores que funcionam como alavancas desleais de negócios. É um fator que sela o futuro das empresas: os vencedores, que contam com apoio privilegiado do BNDES, alijam seus concorrentes do mercado.

Essas são razões suficientemente fortes para que o BNDES seja repensado e recalibrado para atuar a favor do interesse público.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Martelo nos números - Miriam Leitão

A Petrobras fechou 2012 com déficit de US$ 10 bilhões na sua balança comercial e a importação de gasolina subiu 72%. Mas os números podem ser piores. O atraso no registro de importações virou mais uma frente de confusão depois que a Receita alterou as regras. Os números de janeiro, com forte déficit do país, podem ser o registro de estatísticas atrasadas ou impacto do aumento de importação de combustíveis para as térmicas.

As estatísticas mostram oscilações fortes de quantidades importadas a cada mês. No segundo semestre, quando normalmente cresce a importação de gasolina, houve queda de 6% em relação ao primeiro semestre, em volume. Em outubro, o número disparou 463% sobre setembro. Já em dezembro, caiu 69% comparado a novembro.

A Petrobras atrasou o registro porque a Receita permitiu oficialmente. Mas num país em que os índices fiscais foram falsificados e a inflação está sendo administrada, é mais uma fonte de dúvida. José Augusto de Castro, da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), estima que um enorme volume de importação de derivados ainda não está nas estatísticas oficiais.

O Ministério do Desenvolvimento (MDIC) divulgou os números finais da balança de 2012. De janeiro a junho, a importação de gasolina foi de 1,44 milhão de toneladas, caindo para 1,36 milhão no segundo. Nos últimos dois meses, caiu de 474 mil toneladas, em novembro, para 147 mil, em dezembro.

- A balança comercial de 2013 pode estar herdando entre US$ 7 bilhões e US$ 10 bilhões de importações feitas em 2012 que ainda não foram contabilizadas por causa das mudanças das regras feitas pela Receita para o envio de informações. O MDIC apenas recebe essas informações e contabiliza - disse José Augusto Castro.

A Petrobras fechou o ano com um déficit comercial de US$ 10 bilhões. Foram US$ 22 bilhões exportados contra US$ 32 bilhões importados. Se não houvesse a postergação permitida do envio de informações de importação, a empresa poderia estar com um rombo duas vezes maior no seu comércio exterior, de acordo com a estimativa de José Augusto de Castro. Isso teria impacto no valor de ações, na visão que o mercado tem da companhia, e até no custo de captações dos seus empréstimos, que tem relação com o seu valor de mercado.

Da mesma forma, a balança comercial brasileira teria fechado 2012 com um saldo menor e isso teria efeito também sobre o PIB. Segundo o IBGE, o cálculo das Contas Nacionais Trimestrais leva em consideração os dados que estão no Ministério do Desenvolvimento. O MDIC, por sua vez, recebe as informações de importação da Receita Federal, que alterou os prazos.

A distorção dos números começou em julho do ano passado, quando a Receita baixou a Instrução Normativa 1.282, alterando as regras para o envio de informações de importação. Na prática, a Petrobras ganhou mais tempo para enviar os números de petróleo e derivados.

Quando se olha para a balança de derivados como um todo, a confusão fica maior. Com as usinas termelétricas ligadas, a importação de gás natural vai aumentar. Mas o mercado não consegue saber se os números de janeiro são fruto desse aumento ou resquício de importações não contabilizadas em 2012. As térmicas estão ligadas desde outubro.

A Receita não deu explicação sobre a mudança das regras, mas, como se sabe, a Petrobras é diretamente afetada pela importação de gasolina. A empresa importa o combustível a um preço mais alto do que vende aqui. Quanto maior for o ritmo de crescimento das importações, pior para o balanço da companhia.

Os números do MDIC ficam ainda mais estranhos porque a Petrobras informou ao mercado que houve crescimento de 13% nas importações de derivados no terceiro trimestre, em relação ao segundo. A companhia só informará os seus dados finais quando divulgar o balanço do quarto trimestre.

Os números também vão na contramão do que têm dito os principais executivos da Petrobras. Em dezembro, a presidente da empresa, Graça Foster, afirmou que esperava aumento das importações de gasolina no mês. Dezembro é tradicionalmente um mês de alta no consumo, por causa das férias escolares e das festas de final de ano. Mas as importações despencaram 69%, pelo MDIC. Tudo isso deixa em dúvida também os dados da balança comercial.

Fonte: O Globo

Transição escancarada - Paulo Paiva

As decisões de política econômica dependem da articulação e do peso da influência dos diferentes agentes - políticos, empresários, trabalhadores, opinião pública, mídia - e do ambiente onde ocorrem as complexas relações entre economias. Nesse contexto, opções são tomadas, caminhos são traçados e mudanças ocorrem. Desde o governo Itamar Franco, a política econômica se organizou sobre o pilar do controle da inflação, admitindo-se a estabilidade monetária como condição necessária tanto para o crescimento sustentado como para garantir o poder de compra dos salários, contribuindo para a criação de empregos e para a redução das desigualdades. Essa estratégia foi consolidada no governo FHC, com reformas econômicas, e mantida no governo Lula.

Não que não houvesse mudanças ao longo desses 16 anos. Ao contrário, no início do segundo mandato de FHC ocorreu uma transição na estratégia de controle da inflação, ao decidir-se (ou ser levado a) abandonar a âncora cambial. Nesse momento, adotou-se o regi¬me de metas de inflação com âncora fis¬cal na geração de superávits primários necessários para a redução da razão dívida pública/PIB e, simultaneamente, permitiu-se a flutuação da taxa de câmbio.

Foi mantido o princípio básico de que a inflação deveria ficar sob controle. Com a eclosão da crise financeira em 2008, o ambiente externo se alterou e novas mu¬danças foram feitas, principalmente vi¬sando ao estímulo ao consumo no curto prazo, conservando o compromisso com a busca da meta de inflação. Um aspecto comum nesses momentos de transição foi a transparência na informação à sociedade e ao mercado, quer na divulgação do Programa de Ação Imediata (PAI), em 1993, quer na apresentação do tripé macroeconômico em 1999, quer, ainda, na carta do então candidato Lula ao povo brasileiro, em 2002.

Ao flexibilizar o controle da inflação, o atual governo iniciou uma nova transição na política econômica, de forma "envergonhada", se posso tomar empresta¬dos neste artigo os adjetivos que Elio Gaspari utilizou nos títulos de seus livros sobre a ditadura. Nenhum esclarecimento sobre a mudança foi tornado público. Já por três anos consecutivos a inflação superou o centro da meta. Co¬mo demonstra Informe Especial da A.C. Pastores & Associados divulgado este mês, o Banco Central está compro¬metido com a meta de 5,5%, e não de 4,5%, como preestabelecida pelo Conselho Monetário Nacional. Também não há mais um sério compromisso com a geração de superávits primários e a política cambial tenta manter o valor do dó¬lar no intervalo de R$ 2 a R$ 2,10.

Segundo declarações recentes de autoridades da área econômica do governo, a transição na política econômica agora está "escancarada". O pilar do controle da inflação foi substituído pelo do desenvolvimento econômico que é sinônimo de crescimento industrial, co¬mo no passado. O principal instrumento para estimular a produção (competitividade?) da indústria é a desvalorização da moeda. De volta à velha política de administração do câmbio para pro¬mover o crescimento. Tenta-se com¬pensar seus efeitos sobre a inflação através do controle dos preços administra¬dos, como dos derivados do petróleo, da energia e das tarifas de ônibus, onde há impacto sobre a coleta dos preços para medir a inflação. Prática dos tempos negros da ditadura. A disciplina fis¬cal foi abandonada. A dívida pública bruta cresce para permitir que o BNDES ofereça crédito subsidiado à indústria e mecanismos não ortodoxos são adota¬dos para forjar o superávit primário.

Ademais, o Estado volta a intervir nas atividades econômicas por meio da criação de empresas estatais e da crescente participação na oferta e no direciona¬mento do crédito. Há uma forte evidência de déjà vu na administração da política econômica. Diferentemente dos tempos de Itamar, FHC e Lula, a transição se faz sem a transparência e sem as práticas de gestão que poderiam fortalecer a credibilidade e estimular os investimentos. Temo sobre o final dessa mudança: inflação em alta e crescimento lento. Estará, então, a transição "encurralada"?

Professor da Fundação Dom Cabral, foi ministro do Trabalho e do Planejamento e Orçamento no governo FHC

Fonte: O Estado de S. Paulo