Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) estão prestes a analisar uma questão crucial no julgamento do mensalão: decidir se dinheiro público abasteceu o esquema de corrupção de parlamentares. Esse debate deve ocorrer esta semana, quando entrarem em pauta os próximos itens do julgamento, que tratam da denúncia de desvio de recursos do Banco do Brasil no fundo Visanet para a agência DNA, de Marcos Valério. Em 2007, quando aceitaram a denúncia, três ministros — Ayres Britto, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa — afirmaram no plenário da Corte que há indícios fortes de uso de verba pública. A defesa nega
STF chega a ponto crucial
Ministros estão prestes a julgar se foi usado dinheiro público para corromper parlamentares
Flávio Tabak
BRASÍLIA O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma hoje o julgamento do mensalão já se preparando para um embate que envolve uma das questões centrais da acusação do Ministério Público: atestar se o esquema operado por Marcos Valério desviou recursos públicos para corromper parlamentares. O tema vai à votação logo após o plenário decidir se confirma a condenação do deputado João Paulo Cunha (PT), ex-presidente da Câmara, por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, como defendeu o relator, ministro Joaquim Barbosa.
A acusação contra Cunha está no item 3.1 da denúncia. Os itens 3.2 e 3.3 serão os próximos a serem submetidos à Corte pelo relator, que prometeu seguir a ordem do recebimento da denúncia pelo STF em 2007. Nos dois itens, estão as denúncias de desvio de recursos do Banco do Brasil no fundo Visanet para a agência DNA Propaganda, de Valério. Em agosto de 2007, quando aceitaram a denúncia, alguns ministros disseram, em plenário, que havia indícios fortes sobre o uso de dinheiro público. A defesa dos réus sustenta, porém, que o dinheiro é privado. Alega que o fundo Visanet é integrado por várias instituições financeiras, entre elas o BB.
O ministro Carlos Ayres Britto, hoje presidente do STF, disse à época que o dinheiro da Visanet era público. Cinco anos depois, com o decorrer da ação penal, Britto pode mudar de opinião, como qualquer ministro. Mas sua argumentação era clara: "Do que se trata aqui? De uma aplicação do Banco do Brasil no fundo Visanet. (...) Esse dinheiro, para fins penais, oriundo de uma economia mista, é público, inclusive para efeito de controle. E o dinheiro público não se despubliciza, não se metamorfoseia em privado pelo fato de ser injetado numa pessoa jurídica totalmente privada, como é a Visanet. O dinheiro continua público a despeito de sua movimentação por uma empresa privada".
Relator perguntou sobre origem da verba
Britto terminou sua fala com um comentário sobre o mau uso do dinheiro público: "Concluo, sem querer adiantar juízo de mérito, absolutamente, mas impressionado com a facilidade com que são movimentados, aqui no Brasil, tantos recursos públicos e sem contrato, sem comprovação".
Não à toa, o assunto foi o único escolhido por Barbosa para questionar um advogado durante as sustentações orais da defesa na primeira parte do julgamento este mês. Marthius Sávio Cavalcanti Lobato, defensor de Henrique Pizzolato, ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil, teve que responder, surpreso, sobre a origem dos recursos do Visanet destinados à DNA e depois repassados a políticos ligados ao governo.
Em seu voto, ao receber a denúncia há cinco anos, Barbosa disse que os recursos do Visanet têm raiz pública: "Provinham do Banco do Brasil, que tem natureza de sociedade de economia mista, a qual, não obstante seja pessoa jurídica de direito privado, integra a administração indireta, opera com dinheiro público e está submetida ao controle do Tribunal de Contas da União".
Gilmar Mendes foi outro ministro que, antes da instrução processual, disse crer que os recursos eram públicos. Ao votar sobre o recebimento do item 3.2, disse: "Tive dúvidas porque, na defesa, falava-se inicialmente sobre os recursos da Visanet e o seu caráter estritamente privado. Mas, ainda e, nessa condição, seriam recursos públicos. Acompanho o relator".
MP pediu absolvição de Luiz Gushiken
Além de Pizzolato, os réus dos itens 3.2 e 3.3 são Valério e seus sócios Ramon Hollerbach e Cristiano de Mello Paz. O envolvimento do ex-ministro Luiz Gushiken também é tratado nesse trecho. Mas o Ministério Público pediu sua absolvição e os ministros devem confirmar isso. O advogado de Pizzolato espera que a votação dos itens seja baseada nas provas que vieram após 2007 e sustenta que era dinheiro privado:
- O Visanet respondeu que é um fundo privado. Pareceres da consultoria jurídica do BB nos autos dizem que o fundo não é do banco e não é dinheiro público. No regulamento do Visanet há um dispositivo que fala que os recursos são de exclusividade do fundo - diz Lobato. - No recebimento da denúncia, há meros indícios e não todas as perícias da instrução, as provas, os depoimentos. Não houve essa resposta toda.
Para o advogado Marcelo Leonardo, que defende Valério, as perícias feitas durante a instrução contrariam a tese de uso de verba pública:
- A perícia feita pela Polícia Federal afirmou que o fundo Visanet é privado e que pertence à Companhia Brasileira de Meios de Pagamento, pessoa jurídica com nome fantasia Visanet. Os recursos eram administrados pelo comitê gestor do Visanet e jamais transitaram por contas do Banco do Brasil. O dinheiro saiu de conta do Visanet para conta da DNA. Peritos afirmaram em audiência que não existe prova de transferência de recurso do BB para o Visanet.
FONTE: O GLOBO
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