domingo, 14 de abril de 2013

Inflação, quem te trouxe de volta?

Economistas ouvidos pelo Correio atribuem o aumento do custo de vida e o baixo crescimento a uma sequência de falhas da política enconômica, a começar pela queda nos juros sem controle do gasto público.

O tormento da inflação

Especialistas apontam erros de política econômica que levam o país a viver uma estagflação - situação que combina custo de vida em alta e baixo crescimento

Victor Martins, Rosana Hessel

Há pelo menos uma década, quando o Partido dos Trabalhadores assumiu o poder e os mercados não sabiam o que esperar, o assunto inflação não ganhava as ruas como nas últimas semanas. Seja nas redes sociais, mesas de bar ou corredores de supermercado, a carestia está no centro do debate, sobretudo depois de ter estourado o teto da meta em março, quando bateu em 6,59% no acumulado de 12 meses, obrigando o governo a colocar a alta de juros de volta na agenda econômica. O custo de vida corrói o orçamento das famílias por meio do tomate, da batata, do arroz, da farinha — alimentos indispensáveis ao brasileiro cujos preços dispararam e causaram a sensação de que o dinheiro está valendo pouco. Segundo analistas, foi o modelo de gestão adotado pelo governo nos últimos anos que empurrou o país para o atual cenário que combina inflação alta e baixo crescimento — no ano passado, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu apenas 0,9%. O fenômeno é chamado pelos economistas de estagflação.

A política leniente com a carestia, que defende que um pouco de inflação ajuda no crescimento, se mostra, na visão de especialistas, equivocada. O resultado da produção industrial e das vendas do comércio em fevereiro, que caíram de 2,5% e 0,4% respectivamente, mostra porque a alta generalizada de preços é, na verdade, perversa. Para os especialistas, ela tira renda de quem consome e confiança de quem investe. Sem investimento, o país perde produtividade e cresce pouco.

Segundo economistas ouvidos pelo Correio, o atual quadro de inflação alta e baixo crescimento é resultado de uma sequência de falhas da política econômica. Os juros foram colocados no menor patamar da história — o que, em princípio, não é ruim — sem que houvesse controle do gasto público. Em 2012, mesmo maquiando os números, o governo não cumpriu a meta de superavit nas contas públicas, de 3,1% do PIB, e admite que também não vai fazê-lo neste ano. A política fiscal expansionista, combinada com juro baixo e crédito farto, gerou um volume de demanda que o sistema produtivo não conseguiu suprir.

No ano passado, quando o mundo vivia uma queda na oferta de alimentos e alta nas cotações de commodities, o governo permitiu que o dólar subisse, o que pressionou os preços dos importados. E, na tentativa de baixar as tarifas de eletricidade — objetivo, em si, também meritório —, o governo promoveu uma atabalhoada intervenção nos contratos de concessão de energia, que assustou o setor privado. Com isso, os investimentos terminaram o ano passado com queda de 4%, o pior desempenho desde 2009.

“Tudo isso pressiona a inflação”, constata Simão Silber, professor de economia da Universidade de São Paulo (USP). “O instrumento mais geral para segurar a inflação é a taxa de juros. Em segundo lugar, gerenciar melhor os gastos públicos, para eles não injetarem demanda adicional. É preciso ainda deixar de controlar o câmbio artificialmente. Do jeito que estão os fundamentos econômicos, tudo conspira para ter inflação elevada”, pondera.

Produtividade

Outro problema é a falta de qualificação da mão de obra, que fez os salários subirem muito além da capacidade produtiva dos trabalhadores e elevou custos para a indústria. Essa falha reduz a produtividade e tira a competitividade das empresas em relação a concorrentes internacionais. No Brasil, são necessários cinco trabalhadores para produzir o mesmo que um nos Estados Unidos.

A falta de capacitação é tamanha que, entre 144 nações avaliadas pelo Fórum Econômico Mundial, o país aparece no 116º lugar em educação, atrás de Chade, Suazilândia e Azerbaijão. Em ciências, Venezuela, Lesoto, Uruguai e Tanzânia estão mais bem posicionados que a bandeira verde e amarela, dona da 132ª posição.

Com a capacidade produtiva limitada, o caminho natural para suprir a demanda doméstica seria a importação. O governo, porém, impõe barreiras protecionistas, encarecendo os produtos estrangeiros. A justificativa da equipe econômica para manter o Brasil tão fechado ao exterior é a defesa do setor produtivo nacional. No entanto, o Planalto teme uma crise no balanço de pagamentos, que tem se deteriorado expressivamente nos últimos anos por conta do enfraquecimento das exportações.

Essas preocupações impedem o Brasil de se integrar a cadeias produtivas internacionais, o que se torna mais um elemento a tirar a capacidade de o país competir. “O Brasil tem condições de baixar a inflação e crescer se o governo atacar os problemas de competitividade. O que vai na direção de uma reforma tributária, de um programa de concessões de serviços públicos, de melhora na educação e da produtividade do trabalho”, alerta Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro Nacional e economista-chefe do banco J. Safra.

Na avaliação de Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, o Banco Central errou em 2011, quando obedeceu à presidente Dilma Rousseff e deu início ao processo que levou os juros para 7,25% ao ano — o menor patamar da história. “Agora ele está pagando a conta. Os erros estão vindo desde o segundo semestre de 2010, quando o BC deveria ter elevado a Selic, mas não o fez. Não é à toa que a inflação rompeu o teto da meta”, sentencia.

Ritmo lento

Diante do fraco desempenho das vendas do varejo e da produção industrial em fevereiro, o país encolheu 0,52% no mês, segundo dados do Banco Central. Com o resultado, o Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre do ano corre o risco de ser inferior a 1% e mostrar uma desaceleração frente ao último período de 2012. O cenário preocupa o governo, que ainda vê o ritmo de expansão como gradual e aquém do desejado. Por isso, o Ministério da Fazenda está disposto a turbinar a economia com mais desonerações fiscais. Até o momento, a renúncia fiscal programada para o ano é de R$ 65 bilhões, mas o número pode ser maior caso a atividade continue a patinar. Para o Itaú Unibanco, o governo deve abrir mão do superavit primário. Em 2013, ele deve cair para 1,9% do PIB — em 2012 a economia havia sido de 2,4% — e para 0,9% em 2014.

Fonte: Correio Braziliense

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