sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Procuradores querem ouvir cinco bancos

André Guilherme Vieira e Letícia Casado – Valor Econômico

Cinco grandes bancos do país serão chamados a explicar aos investigadores da Operação Lava-Jato os motivos pelos quais seus sistemas comunicaram apenas parte das operações financeiras suspeitas ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão de fiscalização do Ministério da Fazenda.

Bradesco, Itaú-Unibanco, Banco do Brasil, HSBC e Santander estão sujeitos a pagamento de multa no âmbito civil, caso comprovadas as suspeitas de que as instituições financeiras foram negligentes - ainda que de maneira indireta - na fiscalização da movimentação bancária que permitiu a manutenção do sistema financeiro paralelo capitaneado pelo doleiro Alberto Youssef.

Esses bancos registraram os maiores volumes financeiros movimentados em contas de empresas fantasmas ligadas ao esquema de Youssef e da doleira Nelma Kodama, segundo as investigações. O não cumprimento do mecanismo de controle por parte dos bancos - de informar as "movimentações atípicas" ao Coaf - facilitou a remessa de milhões de dólares ao exterior por meio de contas de empresas de fachada e de laranjas, em operações irregulares e contratos fictícios de importação.

A reportagem apurou que a Lava-Jato não dispõe de provas materiais que impliquem dirigentes de bancos em omissão intencional, o que caracterizaria crime.

A investigação já identificou dezenas de funcionários dos bancos, como gerentes, que eram cooptados pelo esquema para não enviar as comunicações ao Coaf. Os bancos podem ser multados na esfera civil e os gerentes podem ser processados criminalmente, caso sejam comprovadas irregularidades.

"Além de uma eventual indenização, buscamos principalmente um acordo que corrija essas falhas [de controle dos bancos]. Seria algo como um termo de ajustamento de conduta no âmbito civil", disse ao Valor PRO, serviço em tempo real do Valor o procurador regional da República Carlos Fernando dos Santos Lima. "Está mais do que na hora de conversar sobre compliance com os bancos."

No começo de dezembro, o Valor antecipou que o esquema de corrupção na Petrobras investigado pela Operação Lava-Jato pode ter atingido pelo menos R$ 20 bilhões. Sabe-se que ao menos R$ 11,5 bilhões foram identificados como "movimentação financeira atípica" pelo Coaf. A reportagem apurou que os investigadores ainda não dispõem de dados para calcular o total desviado da estatal, porque precisam analisar extratos coletados em contas no exterior.

A investigação sobre os desvios bilionários em contratos com a Petrobras revelou que parte dos recursos usados para pagamento de propinas a políticos foi feita em dinheiro vivo, contou com transporte em jatinhos e voos comerciais, e também entregas de malas em residências, o "delivery" da propina.

"Parece evidente ter havido certa leniência dos bancos no controle das atividades de pessoas jurídicas que a investigação revelou tratar-se de meras fachadas para crimes", diz uma fonte ligada à equipe de análises de sigilos fiscais e bancários da Lava-Jato.

"Estamos olhando essas quebras [de sigilo bancário] sob outra ótica, que não é somente a do destino do dinheiro. Focamos em banco por banco, agência por agência, quanto foi disponibilizado em recursos em espécie para cada uma dessas empresas. E se esses bancos observaram as atividades cadastrais dessas empresas. Quantas informações [de movimentações atípicas] deixaram de ser comunicadas ao Coaf?"

A reportagem apurou que os investigadores estão convencidos do envolvimento de corretoras de valores de São Paulo na trama financeira engendrada por Nelma Kodama para remeter dinheiro ao exterior via suas empresas, Greta e Choco Bijoux. Mas a conclusão da investigação sobre eventuais crimes envolvendo corretoras de valores depende ainda de laudos que estão sendo analisados.

O sistema controlado em São Paulo por Nelma, conhecida como "Dama do Mercado" e condenada a 18 anos de prisão, e em Brasília pelo doleiro Carlos Habib Chater, também condenado, contou com pagamentos feitos pela JBS - maior processadora de carnes do mundo - e pela varejista Lojas Marisa, como revelou o Valor em dezembro. A JBS fez pagamentos de R$ 800 mil a uma empresa fantasma; a Lojas Marisa admitiu pagamentos de R$ 3,2 milhões em conta da Choco Bijoux. As companhias negam envolvimento com crimes e dizem que creditaram em contas de fornecedores ou indicadas para pagamentos.

Nelma movimentou R$ 221 milhões em dois anos, segundo a Justiça Federal. Já a Choco Bijoux enviou recursos para a Labogen S/A, "que seria uma fachada usada pelo doleiro Alberto Youssef para lavar US$ 113,38 milhões por meio de importações fictícias, via contratação de câmbio", segundo a PF. Pivô da Lava-Jato, Youssef é apontado como principal operador financeiro do esquema e responde a 12 ações penais que envolvem crimes contra o sistema financeiro nacional, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e corrupção.

Banco Brasil, Santander, Itaú Unibanco e Bradesco informaram, por meio de suas assessorias de imprensa, que não comentariam o caso. O HSBC enviou nota na qual informa "que segue os mais altos padrões de compliance em todos os países nos quais atua e que colabora com as autoridades sempre que requisitado". (Colaborou Fabiana Lopes, de São Paulo)

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