Presidente pede paciência, mas ganha panelaço
• Em pronunciamento à nação, ela diz compreender irritação e preocupação dos brasileiros
Renato Onofre e Catarina Alencastro – O Globo
SÃO PAULO E BRASÍLIA - Enquanto a presidente Dilma Rousseff pedia paciência à população em cadeia nacional de rádio e TV, moradores de várias cidades protestavam com panelaços e buzinaços em várias cidades do país. No seu primeiro pronunciamento à nação deste segundo mandato, por 15 minutos, a presidente fez breve menção ao escândalo da Petrobras, mas destacou a coragem do Brasil para investigador um esquema "lamentável" e submeter os corruptos à Justiça.
- Com coragem e até sofrimento, o Brasil tem aprendido a praticar a justiça social em favor dos mais pobres, como também aplicar duramente a mão da justiça contra os corruptos. É isso, por exemplo, que vem acontecendo na apuração ampla, livre e rigorosa nos episódios lamentáveis contra a Petrobras - afirmou.
As palavras, porém, não bastaram para conter uma onda espontânea de indignação. Em bairros nobres e periferias de cidades como Rio, São Paulo, Brasília, Florianópolis, Cuiabá, Curitiba, e vários municípios do Nordeste, milhares de pessoas foram às janelas de casas e edifícios com gritos e batidas de panelas. Houve até quem estourasse rojões.
Aperitivo para marcha pró-impeachment
O panelaço, porém, ficou restrito às casas - sem ganhar as ruas. Em bairros nobres como Higienópiolis, em São Paulo, e Leblon e Barra da Tijuca, no Rio, as pessoas chegaram a gritar palavras de baixo calão contra a presidente. Em Pinheiros, na Zona Oeste de São Paulo, gritos de "fora Dilma" e "fora PT" ecoavam das janelas. Vídeos postados nas redes sociais mostravam internautas acendo e apagando luzes em repúdio às palavras da presidente - e às medidas de ajuste para retomar o crescimento econômico. A hostilidade, alegavam muitos manifestantes, era apenas um "aperitivo" antes da marcha pró-impeachment programada para o próximo domingo.
O pronunciamento da presidente foi estratégico. Após ouvir reclamações de aliados e de seu próprio partido por não fazer uma defesa enfática do pacote de ajuste fiscal enviado ao Congresso, Dilma usou a maior parte do pronunciamento para explicar e pedir apoio às medidas. Ela negou que o Brasil esteja passando por uma crise de grandes dimensões. E disse, ainda, que depois do início da crise econômica internacional de 2008, o governo agora teve coragem de mudar a estratégia de enfrentamento do problema - agravado por conta da seca e da consequente crise hídrica.
A presidente fez questão de frisar que os direitos dos trabalhadores são sagrados e não serão prejudicados. E que o país não vai parar. O esforço, garantiu ela, será "passageiro".
Dilma também tentou criar empatia com o público. Ela garantiu compreender a irritação e a preocupação dos brasileiros diante do cenário atual, marcado por inflação em alta, economia fraca e aumento do endividamento das famílias. Mas a presidente pediu a confiança da população e conclamou a todos a se unirem em um esforço coletivo para a retomada do crescimento.
- Você tem todo direito de se irritar e de se preocupar. Mas lhe peço paciência e compreensão porque esta situação é passageira. O Brasil tem todas as condições de vencer estes problemas temporários. E esta vitória será ainda mais rápida se todos nós nos unirmos neste enfrentamento. Peço a vocês que nos unamos e que confiem na condução deste processo pelo governo, pelo Congresso, e por todas as forças vivas do nosso país, e uma delas é você - afirmou.
A presidente quis destacar a ideia de que o próprio governo é o primeiro a se sacrificar - através do corte de gastos da máquina pública. E justificou mais uma vez o ajuste, alegando ser impossível prever que a crise, iniciada há quase sete anos com a quebradeira de grandes bancos americanos, se estenderia por tanto tempo. Logo no início do pronunciamento, Dilma afirmou, ainda, que os noticiários, às vezes, mais confundem do que esclarecem. E chamou de injustas e desmedidas as críticas que o governo tem recebido por conta do ajuste.
- Decidimos, corajosamente, mudar de método e buscar soluções mais adequadas ao atual momento, mesmo que isso signifique alguns sacrifícios temporários para todos e críticas injustas e desmesuradas ao governo - declarou a presidente, reforçando que o governo está distribuindo os esforços de "maneira justa e suportável" para todos. - Absorvemos a carga negativa até onde podíamos e agora temos que dividir parte desse esforço com todos os setores da sociedade.
Reação ainda no 2º semestre deste ano
Dilma disse esperar uma reação da economia já no segundo semestre deste ano. Repetindo o discurso feito em Araguari (MG) na última sexta, quando entregou casas do programa Minha Casa Minha Vida, ela afirmou que o ajuste fiscal não é um fim em si mesmo, mas uma "travessia para um tempo melhor".
O pronunciamento, feito por ocasião do Dia Internacional da Mulher, reservou pouco espaço para a listagem de ações de gênero do governo, como costumava fazer a presidente em suas falas anteriores nesta mesma data. Dilma tampouco fez anúncios de novas medidas - apenas informou que irá sancionar hoje a lei que tipifica o feminicídio, agravando a pena para quem mata mulher.
O texto foi elaborado pelo marqueteiro João Santana, que cuidou da campanha de reeleição de Dilma, e contou com as contribuições de integrantes da equipe econômica. Afinal, a fala da presidente foi veiculada a apenas uma semana de manifestações antigoverno marcadas para ocorrer em todo o Brasil no próximo domingo.
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