Por Cristiane Agostine – Valor Econômico
SÃO PAULO - "Daqui a pouco não vamos ter base social para defender o governo. Está muito difícil, muito difícil. Estamos lascados, na verdade". O comentário do vereador petista Lineu Navarro, de São Carlos (SP), ganhou fortes aplausos de filiados do PT e integrantes de movimentos populares, reunidos com o ex-ministro e diretor do Instituto Lula, Luiz Dulci na noite de quarta-feira, na sede nacional do partido em São Paulo. "A economia está indo para um lado que não foi o que construímos. Você sai na rua e o povo fala: a vaca tossiu. Isso significa muito para a nossa base e as pesquisas de popularidade do governo mostram isso. Como é que vai defender o Lula, o governo Dilma se a base social não vier?"
A frustração com o governo da presidente Dilma Rousseff, com o ajuste fiscal e a quebra da promessa de que os direitos trabalhistas não seriam alterados "nem que a vaca tussa" marca o debate sobre a relação da base petista com o governo e o partido. Em meio ao aumento das demissões e o crescimento da inflação, petistas e movimentos sociais reclamam da falta de diálogo com o governo e com o próprio PT e resistem em dar a Dilma o mesmo apoio que deram ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2005. Ao mesmo tempo, a base petista mostra-se angustiada com a possibilidade real de saída de Dilma da Presidência.
Ao lado de Dulci na mesa de debate, Thiago Vinícius de Paula, militante da periferia paulistana, reclamou do pedido de apoio diante da crise. "A gente não quer ser chamado só nas eleições, ou quando a chapa esquenta", disse. Thiago elogiou a atuação de Lula, com encontros frequentes no Instituto que leva seu nome, mas pontuou: "De que adianta as reuniões com Lula se depois não temos espaço no governo?"
"O distanciamento com os movimentos sociais é grande", afirmou Maria Sufaneide Rodrigues, professora aposentada ligada à Apeoesp, sindicato dos professores de São Paulo. "E o [Aloizio] Mercadante? Qual tem sido o papel dele?", disse, ao criticar a ação do ministro da Casa Civil na articulação política. Militante petista, o jovem Maurílio criticou a política econômica e as escolhas de Dilma para o ministério, como a de Katia Abreu para a Agricultura. "PT tem sido ingrato? Claro que sim. Mas o fato é que se essa pauta golpista continuar, vão nos esmagar. Não importa se você é do PT ou do movimento social. Não vai sobrar ninguém", disse o petista, que saiu do evento antes do fim do debate.
"É claro que tivemos equívocos no Congresso e ficamos alijados do comando da Câmara. Os erros na articulação política e o ajuste fiscal pesam muito para a militância. Mas está em curso uma agenda golpista", disse Douglas Isso, vice-presidente da CUT-SP. "Temos que pintar nosso rosto e ir para a guerra".
A defesa do governo Dilma não é fácil nem para os "lulistas". Dulci reclamou do ajuste fiscal, disse que é preciso virar essa página e cobrou medidas para o crescimento. "É isso que vai dar condições de dialogar com os que estão distanciados de nós", disse. "O governo tem que corrigir erros, mas não significa jogar a água com o bebê. Querem nos destruir não por nossos erros, mas por nossos acertos. Mas evidente que os erros enfraquecem a defesa dos acertos, do legado". Aos insatisfeitos, Dulci pediu, como alternativa, que se faça a defesa da democracia. Alertou para o "golpe" e o comparou com o que aconteceu na ditadura. "A questão não é apoiar ou não o governo, mas trata-se de defender a democracia e a solução dos conflitos pelas regras democráticas. Pode continuar criticando, mas tem que ser contra o golpe".
Lula e seus interlocutores, como Dulci, têm feito uma ofensiva junto à base petista, em dezenas de reuniões como o da quarta-feira, que se intensificaram nas últimas semanas. Para "lulistas", o governo subestimou por muito tempo a força da oposição e a articulação em torno do impeachment e o risco de golpe é real. Lula pretende intensificar uma agenda de viagens. Nesta semana, o ex-presidente irá para Brasília e na próxima estará em Minas Gerais.
A presidente começou a buscar uma aproximação com a base petista e marcou um encontro com os movimentos sociais no Palácio do Planalto no dia 13, três dias antes do ato pró-impeachment. Dilma tem acenado também ao MTST, que articula um ato contra o impeachment no dia 20, e prometeu atender os pedidos no programa Minha Casa, Minha Vida. O presidente do PT, Rui Falcão, também tem se aproximado do líder do MTST, Guilherme Boulos. No entanto, no ato organizado pelos sem-teto, com movimentos como CUT e UNE, o ajuste fiscal será atacado.
Na sexta-feira, Lula reuniu centenas de pessoas para apoiá-lo, em ato organizado pelo diretório do PT paulistano. Ao redor do Instituto Lula, ministros, dirigentes petistas e integrantes da CUT, MST e de outros movimentos populares protestaram contra uma bomba que foi jogada no local. No mesmo dia, Lula reuniu-se com os ministros Mercadante, Edinho Silva (Secretaria da Comunicação Social) e Jaques Wagner (Defesa) para tratar da crise com o PMDB, reforma ministerial e impeachment.
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