• Delegados que pediram nova prisão temporária de marqueteiro do PT João Santana, alvo da 23ª fase da Lava Jato, disseram que dono da maior empreiteira do País, que disse querer colaborar, terá chance de esclarecer uso de termos cifrados
Por Ricardo Brandt e Fausto Macedo – O Estado de S. Paulo
CURITIBA - A Polícia Federal espera que o maior empreiteiro do País, Marcelo Bahia Odebrecht, esclareça nos próximos cinco dias de prisão temporária do marqueteiro do PT João Santana e sua mulher, Mônica Moura, os fatos sobre “sua rede de distribuição de ‘acarajés’.
“No curso do novo prazo da prisão temporária, espera-se que Marcelo Odebrecht possa prestar esclarecimentos relevantes sobre sua rede de distribuição de ‘acarajés’ e sobre as menções ao codinome Feira espalhadas em seu celular e replicadas por seus funcionários em planilhas e anotações”, informam os delegados Márcio Anselmo e Renata Pereira da Silva, no pedido de nova prisão temporária do casal de marqueteiros do PT. A prisão foi prorrogada pelo juiz federal Sérgio Moro.
Relatório da PF indica que executivos ligados à Odebrecht usavam em suas correspondências a palavra ‘acarajé’ como senha para entrega de valores supostamente ilícitos. O resgate de e-mails trocados entre alvos da 23.ª etapa da Lava Jato mostra que esse tipo de expediente foi usado para blindar transações.
A alusão ao famoso quitute baiano deu origem à Operação Acarajé, que culminou com a prisão do publicitário João Santana e de sua mulher e sócia, Mônica Moura, marqueteiros das campanhas presidenciais de Lula (2006) e Dilma (2010 e 2014), na segunda-feira, 22.
Segundo o relatório, quem providenciava os ‘acarajés’ era a secretária da Odebrecht Maria Lúcia Guimarães Tavares que, aponta a PF, operava contabilidade paralela da empreiteira.
“Tio Bel, você consegue me fazer chegar mais 50 acarajés na 4.ª feira à tarde (por volta das 15hs) no escritório da OOG, no Rio? Estou no México, mas chego de volta na 4.ª de manhã”, solicitou Roberto Prisco Paraíso Ramos a Hilberto Mascarenhas Alves da Silva Filho em mensagem do dia 27 de janeiro de 2014, às 14h33
Em outra mensagem, de 29 de outubro de 2013, Ramos havia feito solicitação semelhante, usando o mesmo código. “Meu Tio, Vou estar amanhã e depois em SP; será que dava para eu trazer uns 50 acarajés dos 500 que tenho com você? Ou posso comprar aqui mesmo, no Rio? Tem alguma bahiana de confiança, aqui?”
A PF elaborou um relatório de análise dessas trocas de e-mails, e registrou que “claramente os investigados aparentam conversarem por código, no qual o primeiro cobra parte da dívida de que um tem com o outro”. “Destaca-se que trata-se de comida perecível e que seria completamente inviável pessoa estocar tal alimento sem que o mesmo perca suas propriedades alimentares.”
Oportunidade. Segundo os delegados da PF, a posição tornada pública pelo empreiteiro, que na terça-feira, 23, foi ouvido na sede da PF, de que “pretende esclarecer” os fatos serve de oportunidade para explicações sobre a “rede de distribuição de acarajés”. Odebrecht está presto desde 19 de junho de 2015.
“Restou público no decorrer da semana, bem como fora afirmado em termo de declarações prestado às autoridades policiais que atuam na Operação Lavajato, que Marcelo Odebrecht pretende esclarecer os fatos que lhe são imputados nesta fase da investigação nos próximos dias”, afirmam os delegados.
Também investigado por supostos pagamentos ilegais da Odebrecht para o marqueteiro do PT, o empresário ficou em silêncio no depoimento de terça-feira. Ele alegou que primeiro precisa ter acesso aos autos da Operação Acarajé.
“É compreensível que Marcelo Odebrecht não queira depor sobre algo que não tem conhecimento”, declarou o criminalista Nabor Bulhões, advogado do empresário. “Basta ler a Súmula Vinculante 14 do Supremo Tribunal Federal. O investigado tem o direito de conhecer o teor do inquérito. Marcelo Odebrecht não invocou o direito ao silêncio, nem vai invocar. Mas precisa ter acesso aos autos da investigação para sobre ela se manifestar.”
Na terça, 23, o criminalista requereu cópia dos autos da Acarajé. “Fomos informados que os autos estão sob sigilo, estão inacessíveis. Mas é bom que se diga que isso aqui não é um jogo de loteria esportiva, é uma investigação criminal. Ora, o investigador passa seis meses, às vezes um ano até, trabalhando incessantemente. Aí de repente convoca um acusado para falar sobre o que foi apurado naquele longo período. A Súmula 14 do Supremo bem traduz essa situação: o investigado tem o direito inequívoco de conhecer o teor da investigação para só então sobre ela se manifestar.”
Porções baianas. Maria Alice, que também teve sua prisão temporária (de 5 dias) prorrogada nesta sexta-feira pelo juiz Sérgio Moro, foi perguntada sobre as trocas de e-mails envolvendo Hilberto Mascarenhas e Roberto Ramos, nas quais ela era copiada, com menções a entregas de acarajés, afirma que se recorda que por vezes Hilberto lhe pedia para providenciar a entrega de porções de acarajé para entrega no Rio de Janeiro/RJ, em um escritório
A funcionária da Odebrecht afirmou que “as baianas em Salvador vendem pequenas porções para aperitivos, em caixa, e então cabia à declarante providenciar essas entregas a pedido de Hilberto, no local onde ele indicasse”.
Os delegados afirmaram ao juiz Sérgio Moro que a versão sustentada por Maria Alice é “pouco verossímil”.
No relatório de análise das trocas de e-mails, a PF destaca que “a possível movimentação de recursos em espécie em uma empresa do porte da Odebrecht não seria identificada como atividade ilícita”.
“Entretanto, a grande preocupação dos investigados associada com a capacidade criativa dos mesmos em simular uma ficção para ocultar fato concreto – possível transferência de recursos em espécie – foi percebida como uma possível tentativa de ocultar atividade obscura.”
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