Cada vez mais distantes, o que a afastará da festa do partido hoje, PT e Dilma travam disputa por sobrevivência.
Beijinho no ombro
• Dilma aposta em políticas que contrariam PT, decide faltar à festa e se distancia do partido que a abrigou
Fernanda Krakovics, Letícia Fernandes, Simone Iglesias, Manoel Ventura* Catarina Alencastro – O Globo
RIO, BRASÍLIA e SANTIAGO - A guerra fria entre o PT e a presidente Dilma Rousseff, que começou ainda no primeiro mandato, chegou esta semana a seu ápice. Com a decisão tomada ontem de ampliar sua visita ao Chile até a tarde de hoje, Dilma estará ausente da comemoração dos 36 anos do partido, no Rio. Se no primeiro mandato o principal motivo de divergências girou em torno da definição de quem — Lula ou ela — seria o candidato a representar o projeto político ainda com alta popularidade nas eleições de 2014, agora a disputa é pela simples sobrevivência. Na tentativa de resistir simultaneamente à maior crise econômica dos últimos 20 anos e às denúncias da Operação LavaJato, a presidente e o PT escolheram rotas distintas.
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Em busca de sua sobrevivência como presidente, Dilma tenta colocar de pé uma agenda que vai na contramão do que quer o PT. Decidida a apresentar a reforma da Previdência e a aprovar medidas econômicas duras para debelar a crise econômica, Dilma resolveu resistir às pressões petistas, criando um ambiente de litígio.
Nos últimos dias, três movimentos da presidente demarcaram a crise com seu partido: ela não aceitou o convite da direção do PT para aparecer na propaganda partidária, que foi ao ar na última terça-feira; desistiu de participar do evento partidário de hoje e deixou os senadores petistas falando sozinhos contra um projeto do tucano José Serra (SP), que mudou as regras de exploração do pré-sal, acabando com a exclusividade da Petrobras. Enquanto o PT lutava contra a alteração, ministros, com o aval de Dilma, negociavam com Serra e com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), pequenos ajustes no texto.
PT quer recuperar bandeiras históricas
Com o discurso ético esfacelado e sob risco de perder o que ainda tem de base social, o PT, por sua vez, busca em bandeiras históricas uma volta por cima. Rejeita a reforma da Previdência, que ainda nem foi apresentada pelo governo, e critica a política econômica conduzida pelo ministro Nelson Barbosa (Fazenda), depois de ter pressionado pela saída do liberal Joaquim Levy do posto.
— A reforma da Previdência, a política econômica, a questão da Petrobras, o pacote fiscal estão criando um choque entre o palácio e o PT. Ou o governo começa a ter uma política mais próximas às bandeiras históricas do PT, ou o PT vai ficar com o povo e se afastar do Planalto. Está se criando uma situação muito difícil. A reforma da Previdência vai unir todo mundo contra ela: servidores públicos e trabalhadores — afirmou o senador Paulo Paim (PT-RS).
As divergências em relação ao governo Dilma foram explicitadas na reunião do diretório nacional, ontem, no Rio. Além de aprovar por unanimidade o “programa nacional de emergência” para a economia, defendendo a volta do modelo adotado na gestão Lula, o partido impôs condições para apoiar a reforma da Previdência e classificou de “entreguista” o projeto, aprovado no Senado, com apoio do Planalto, que reduz a participação da Petrobras na exploração do pré-sal.
Ao deixar momentaneamente a reunião do diretório, um dos participantes deu o tom do debate travado a portas fechadas:
— A polêmica é o tamanho do pau que vamos dar no governo, se maior ou menor.
Dilma quer reforma da previdência
Lideranças petistas, em conversas reservadas, se queixavam de que Dilma está fazendo “uma opção pelo mercado”. E alertavam que, no momento em que há ameaça de um processo de impeachment, ela vai precisar da base social do partido para sustentá-la.
Em entrevista coletiva após a reunião, o presidente do PT, Rui Falcão, defendeu a retomada da política econômica dos mandatos do ex-presidente Lula, e disse que o partido vai lutar para derrubar a proposta de mudança no pré-sal, na Câmara.
— A lógica das propostas emergenciais é retomar o que era o núcleo da política econômica do governo Lula — disse Falcão. — Somos favoráveis à manutenção integral da lei do pré-sal. Não queremos nenhuma mudança no regime de partilha, e vamos lutar na Câmara para que o que foi aprovado no Senado não prospere.
Na semana passada, o PT do Senado encaminhou, a pedido de Renan, uma lista de projetos que considera importantes de serem votados pela Casa. Entre eles, estão a tributação de lucros e dividendos de pessoas jurídicas; imposto sobre grandes fortunas e a criação de uma faixa de IPVA para embarcações e aeronaves. Nenhum deles é prioridade para o Planalto, que se incomodou com a falta de adesão dos petistas à política econômica do governo mesmo após a nomeação de Barbosa.
Até pouco tempo atrás, a presidente Dilma ainda agia sob pressão da cúpula petista. O caso mais recente aconteceu em janeiro. Depois de ouvir do ex-presidente Lula que era preciso liberar crédito pelos bancos públicos, a presidente anunciou uma série de medidas com potencial de gerar R$ 83 bilhões em financiamentos. Pouco depois, houve nova pressão para que desistisse da reforma da Previdência. Desta vez, Dilma endureceu e prometeu enviar uma proposta ao Congresso até abril.
— Há, sim, divergências quanto à fórmula para o país sair da crise. O PT tem uma solução, a presidente tem outra. São diferenças, espera-se que não sejam insolúveis — diz um auxiliar presidencial.
Em meio à crise PT/governo, outros partidos aliados veem com bom olhos a divergência.
— Acho que (o descolamento do PT) vai melhorar para ela — afirmou o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira. (* Estagiário sob supervisão de Paulo Celso Pereira)
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