- Valor Econômico
• Próximo presidente terá maior ônus do ajuste, dizem políticos
Com a aprovação da proposta de emenda constitucional que cria um teto para o gasto da União, a dívida bruta do setor público vai atingir o seu pico em 2020, em torno de 80% do Produto Interno Bruto (PIB), caindo a partir daí, conforme o cenário básico do governo, que serviu de referência para a elaboração da PEC, segundo fontes da área econômica. No fim de julho deste ano, a dívida estava em 69,5% do PIB. Ou seja, o endividamento vai piorar mais, antes de melhorar.
O aumento ocorrerá, entre outros motivos, porque o setor público só voltará a fazer um superávit primário em suas contas em 2019, mesmo assim muito pequeno - de apenas 0,2% do PIB. Para 2017, a meta fiscal é um déficit primário de R$ 143,1 bilhões, o equivalente a 2,1% do PIB.
A previsão oficial é que, já a partir de 2021, ocorra uma redução da dívida em dois pontos percentuais do PIB ao ano, em média. Ao fim do período de 20 anos do Novo Regime Fiscal, o governo espera que ela fique em torno de 55% do PIB - o mesmo nível de 2011. Para chegar a isso, o superávit primário do setor público terá que ficar entre 2,5% a 3% do PIB. Ou seja, uma economia semelhante àquela feita no primeiro ano do primeiro mandado da ex-presidente Dilma Rousseff.
Com a aprovação do teto, o governo espera que a despesa da União caia de 0,5 ponto a 0,6 ponto percentual do PIB ao ano. Essa redução, é bom que se ressalte, será em proporção do PIB. Como a despesa de cada exercício será a mesma do ano anterior, corrigida pela inflação, ou seja, ela não vai aumentar em termos reais, quando a economia voltar a crescer, o gasto ficará cada vez menor na comparação com o PIB. Assim, depois de nove anos, quando o então presidente for propor a revisão do critério de correção do gasto, como determina a PEC, a despesa terá caído do atual patamar de 19,84% do PIB previsto para 2016 para cerca de 15% do PIB.
As fontes ouvidas observaram que este é um cenário conservador, pois foi elaborado sem considerar o eventual impacto positivo sobre o ânimo dos investidores que terão as aprovações da PEC do teto e a reforma da Previdência Social, entre outras medidas que este governo irá propor para colocar as contas públicas de novo em uma trajetória de equilíbrio.
Há economistas, até mesmo dentro do próprio governo, que acreditam ser possível a economia brasileira crescer entre 3% e 4% ao ano, depois que a PEC do teto e as reformas forem aprovadas pelo Congresso.
Este é o cenário que está sendo apresentado ao relator da PEC do teto na Câmara dos Deputados, Darcísio Perondi (PMDB-RS) e aos demais parlamentares da base aliada do governo Michel Temer. O substitutivo à proposta original do governo, que Perondi está preparando e negociando com a área econômica, trará algumas mudanças, que não comprometem a essência da PEC.
Parlamentares que conversaram com o relator confirmaram que ele deverá mesmo propor que a fórmula de correção da despesa possa ser alterada antes do prazo de dez anos, caso a dívida bruta caia para 55% do PIB. Essa medida, na avaliação de Perondi, pode estimular os futuros governos a adotar medidas, como a venda de ativos, para reduzir o endividamento público.
O relator deve acolher também a emenda apresentada pelo deputado Marcus Pestana (PSDB-MG) para que a despesa mínima do governo federal com ações e serviços públicos de saúde, fixada para 2017, seja igual ao montante empenhado em 2015, corrigido pela variação do IPCA de janeiro de 2015 a dezembro de 2016. A partir de 2018, o gasto seria atualizado, como prevê a PEC do teto, pela variação do IPCA do ano anterior.
Ontem, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciou que pretende colocar a PEC do teto em votação no plenário da Casa, em primeiro turno, no dia 17 de outubro. Se aprovada, o segundo turno ficaria para o início de novembro, com a PEC seguindo para o Senado ainda em novembro.
Algumas resistências à PEC do teto estão sendo observadas na própria base governista. A mais importante partiu do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, para quem a proposta de limitar a despesa pode "acabar com o investimento público", se não forem tomados os cuidados devidos. O raciocínio de Alckmin é que, como é difícil conter outras despesas, entre elas os aumentos de salários do Judiciário e do Ministério Público, a variável de ajuste é sempre o investimento.
Outras leituras políticas desfavoráveis à PEC do teto estão sendo feitas por importantes lideranças governistas. Uma delas sustenta que a proposta "está desequilibrada", pois não distribui equitativamente o ônus do ajuste ao longo dos próximos nove anos. "O grosso do ajuste vai recair sobre os ombros do próximo presidente da República", analisou uma fonte.
"A PEC é frouxa no curto prazo, beneficiando o Temer, e muito rigorosa para os governos seguintes", afirmou o mesmo político, lembrando que a despesa vai aumentar em termos reais em 2017 e, provavelmente, em 2018. Não haveria aumento real do gasto somente a partir de 2019.
A área econômica rebate essa crítica com o argumento de que o próximo governo terá "uma herança bendita", pois, justamente por causa da aprovação da PEC do teto e das demais reformas que serão propostas por Temer, o país estará crescendo muito, criando empregos e aumentando a renda dos trabalhadores. Além disso, acrescentam essas autoridades, o próximo governo já contará com a principal medida para o equilíbrio das contas, que é a reforma da Previdência Social. "Quem se eleger em 2018 não terá o desgaste de propor a reforma da Previdência."
Essa leitura política certamente será levada em consideração quando a PEC do teto chegar ao Senado, onde estão alguns dos principais candidatos à sucessão de Temer. Um dos erros cometidos pelo governo, na avaliação de parlamentares, foi não ter feito a discussão da PEC do teto com deputados e senadores, conjuntamente, mesmo que de maneira informal. É muito provável que o Senado altere o substitutivo aprovado pela Câmara, o que atrasará a promulgação da emenda.
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