Se é verdade que Michel Temer mudou de ideia acerca da “linha de corte” traçada por ele mesmo para afastar assessores enrolados em escândalos – agora, segundo consta, não basta que sejam formalmente denunciados –, o presidente terá feito uma leitura equivocada das raras vitórias políticas e judiciais que vem obtendo até aqui.
Apenas se se sentisse enormemente fortalecido após a decisão do Tribunal Superior Eleitoral de não cassar a chapa que ele integrou na eleição de 2014 como vice de Dilma Rousseff, Temer poderia acreditar que agora seria capaz de preservar na vizinhança de seu gabinete pessoas que há muito tempo deveriam ter sido demitidas, por ligarem a imagem do governo à profusão de escândalos que abalam o País.
Conforme reportagem da Folha de S.Paulo, que não foi devidamente desmentida, o presidente Temer estaria considerando que toda e qualquer denúncia contra ministros seria motivada por um desejo da Procuradoria-Geral da República de desestabilizar o governo. Por essa razão, teria transformado em letra morta o discurso que fez em fevereiro, quando anunciou que, “se houver denúncia, que é um conjunto de provas, que eventualmente pode levar ao acolhimento, o ministro denunciado será afastado provisoriamente” e, “se acolhida a denúncia e o ministro se transformar em réu, o afastamento é definitivo”.
Naquela ocasião, fez bem o presidente em estabelecer que a mera citação do nome de um ministro por um delator não seria suficiente para afastá-lo do governo. Afinal, se assim fosse, a administração pública ficaria à mercê da histeria denuncista, que, de fato, só favorece os que pretendem destruir o mundo político, como alguns procuradores.
Como se recorda, diante da emergência criada pelo rápido avanço do processo de impedimento de Dilma Rousseff, Michel Temer nomeou um Ministério às pressas e usando os nomes que estavam então à disposição. Para manter a governabilidade e formar consistente maioria no Congresso, escolheu políticos que estão sendo investigados, alguns deles suspeitos de serem autores de vários delitos.
Isso aconteceu há um ano, em circunstâncias tais que, em última análise, justificavam certo nível de leniência com os aspectos menos claros das biografias dos políticos em questão. Nesse período, as reformas que constituem a plataforma de governo de Temer foram encaminhadas e, algumas, já aprovadas. Não há mais por que basear a administração em pilares carcomidos. Há, no Congresso, lideranças sólidas ou nascentes que têm vida limpa e reputação clara, para substituir as más companhias que cercam o presidente. Mantê-las, hoje, equivale tão somente a garantir-lhes foro privilegiado e a dar mau nome a um governo que precisa, mais do que nunca, da confiança da Nação.
Portanto, se quiser conservar o fiapo de apoio popular de que ainda dispõe, o presidente Temer deveria não apenas desmentir categoricamente a informação de que pretende manter seus ministros encrencados, mas principalmente reafirmar o compromisso assumido a respeito da lisura de sua administração. Ao não fazê-lo, Temer autoriza toda sorte de especulações a respeito de seus motivos, especialmente diante da necessidade de apoio no Congresso às vésperas da esperada denúncia contra o presidente a ser encaminhada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Presume-se que Janot acusará Temer de corrupção – há quem diga que o presidente pode ser denunciado até mesmo como “chefe de organização criminosa” – a partir da delação dos donos da JBS.
Caso deixe de demitir ministros formalmente denunciados como havia prometido, Temer pode acabar dando razão a quem o acusa de proteger seus assessores das investidas de Janot e da Lava Jato e, desse modo, por tabela, sinalizar que deputados e senadores igualmente acusados de malfeitorias em geral têm nele um aliado. Se, por puro pragmatismo, tal atitude se explicaria em razão da necessidade de arregimentar os votos necessários para desautorizar a abertura de processo contra Temer, do ponto de vista moral é um verdadeiro desastre. Exatamente porque tem hoje escasso apoio popular, o presidente deveria renovar seus votos de respeito à ética em seu governo, e assim evitar que a cada “fato novo”, por mais frágil que seja, esse governo periclite.
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