quinta-feira, 1 de outubro de 2020

Desemprego tem a maior taxa desde 1992

Para analistas, ocupação deve voltar a crescer, mas não vai compensar aumento da procura

Por Bruno Villas Bôas | Valor Econômico

 RIO - O mercado de trabalho entrou no segundo semestre pressionado, com perda disseminada de ocupações e a taxa de desemprego no maior nível em 25 anos. Para analistas, a flexibilização do isolamento pode permitir alta na ocupação nos próximos meses, mas ainda em ritmo insuficiente para atender ao aumento da procura por trabalho.

Dados da Pnad Contínua divulgados ontem pelo IBGE mostram que a taxa de desemprego atingiu 13,8% no trimestre até julho, pior resultado da série histórica, de 2012. Nos cálculos da LCA Consultores, que construiu uma série mais longa de desemprego, seria o pior resultado desde 1995, pelo menos. São 13,13 milhões sem ocupação. Já os números de agosto do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostraram criação expressiva de vagas no setor formal. 

A taxa de desemprego de 13,8% ficou acima da mediana de 13,7% das projeções colhidas pelo Valor Data. E o avanço não foi maior porque parte dos trabalhadores que perderam ocupações desistiu de procurar vagas, migrando para a inatividade. Sem isso, a taxa teria atingido 24,1% no trimestre até julho, pelos cálculos do Goldman Sachs.

Pior do que o resultado acima do esperado, porém, foi a abertura dos indicadores da pesquisa. A população ocupada (empregados, empregadores, servidores e trabalhadores por conta própria) recuou para 82 milhões, menor nível da série histórica oficial, de 2012, após a perda 7,2 milhões de postos frente ao trimestre móvel anterior.

Segundo Daniel Duque, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), o resultado da ocupação seria esperado e coincidente com o mostrado pela Pnad Covid Mensal, outra pesquisa do IBGE que acompanha o mercado de trabalho. “A surpresa foi a perda ter sido generalizada, em diferentes setores, com formal e informal em queda.”

Dados do IBGE mostraram que todas as dez atividades acompanhadas tiveram perdas de ocupação no trimestre até julho, em relação aos três meses anteriores. Os destaques negativos foram comércio, serviços domésticos e alojamento e alimentação. Somente o comércio fechou 1,6 milhão de ocupações em três meses.

Para Luka Barbosa, economista do Itaú, os meses de agosto e setembro podem trazer, porém, números melhores, com estabilização ou crescimento da ocupação. Para ele, outras pesquisas mostram que o mercado de trabalho entrou em recuperação, a partir da flexibilização, crédito e melhora econômica mundial.

“De agosto até o fim do ano o mercado de trabalho deverá recuperar cerca de 5 milhões de ocupações perdidas, especialmente pela informalidade. Mesmo assim, a taxa de desemprego vai crescer, porque trabalhadores que estavam inativos devem voltar a procurar emprego”, explica Barbosa.

Cosmo Donato, analista da LCA, acredita que a taxa de desemprego nacional deverá seguir crescendo no trimestre até agosto e atingir 14,4% em agosto, efeito dessa maior procura. Ele prevê um aumento gradativo do indicador até o primeiro trimestre do ano que vem, quando atingiria 18,5%.

“Já flexibilizamos o isolamento, as pessoas voltaram a circular e defrontaram-se com um renda menor. Em setembro, o auxílio emergencial já foi reduzido pela metade, para R$ 300, e tem data para terminar. Então, as pessoas começam a se precaver e voltar a buscar emprego”, disse o analista.

Para ele, uma das dúvidas que pairam sobre o mercado de trabalho é a capacidade do setor informal de absorver parte dos desempregados. “Com a atividade econômica enfraquecida, o trabalhador vai conseguir se ocupar mesmo na informalidade? Isso depende da disposição das famílias de gastar”, explica ele.

Natalie Victal, economista da Garde, diz que outra preocupação é sobre o impacto do fim do programa de garantia de emprego do governo, que evitou demissões no setor formal. Ela teme o tamanho do ajuste que as empresas precisarão fazer no folha de pagamentos. “Tem mais de 10 milhões de contratos de trabalho sendo sustentados pelo programa e não sabemos ao certo a situação das empresas contratantes. O que preocupa é que a economia está rodando com uma série de políticas que precisarão ser retiradas e os impactos disso na renda das famílias.”

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