Folha de S. Paulo
Boulos versus Nunes no 2º turno seria melhor
para ambos; deputada pode ser empecilho
A disputa pela Prefeitura de São Paulo movimenta
projetos de poder que movem a política nacional. Está em jogo o comando de 11,5
milhões de habitantes, um Orçamento que
só não é maior que o do governo federal e dos estados de São Paulo, Rio de
Janeiro e Minas Gerais e um cargo com potencial para transformar o seu prefeito
em virtual candidato ao governo paulista e/ou à Presidência da República.
Desenha-se para 2024 uma disputa repleta de novidades.
O PT, pela
primeira vez, não
terá candidato próprio. O PSDB, vencedor de
2016 e 2020, também
não. Jair
Bolsonaro (PL) vê definhar seu prestígio eleitoral: pesquisa
Datafolha apontou que 68%
dos paulistanos rejeitariam um candidato indicado por ele. Na mesma
sondagem, um postulante apoiado por Lula (PT)
seria rejeitado por 37%, ante 46% se indicado pelo governador de São
Paulo, Tarcísio
de Freitas (Republicanos).
Três nomes são presenças certas na disputa: Ricardo Nunes (MDB), atual prefeito; Guilherme Boulos (PSOL), deputado federal; e Tabata Amaral (PSB), também deputada. A possibilidade de Kim Kataguiri ser lançado pelo União Brasil é quase nula. Lideranças da legenda na cidade apoiam a reeleição de Nunes.
Com 24% das intenções de voto no mesmo levantamento, o prefeito faz um malabarismo perigoso pelo apoio de Bolsonaro, a quem chamou de "democrata" em recente entrevista à Folha.
Na contramão do resultado
eleitoral de 2022 em quase todo o estado, a capital
deu a Lula e a Fernando Haddad, que concorria ao governo, vitórias nos dois
turnos e fez de Boulos
o campeão de votos para deputado federal, com 7,68% dos votantes. O MDB,
partido de Nunes, tem pouca projeção eleitoral na cidade. Já o PSDB, que
participa de sua gestão e pode apoiá-lo, nem
chegou ao segundo turno no ano passado. O êxito do emedebista dependerá dos
efeitos eleitorais de ser candidato à reeleição numa cidade por ele transformada
num canteiro de obras, além do apoio de líderes religiosos e de
parlamentares com forte projeção nas áreas mais populosas.
Líder
da pesquisa com 32% dos votos, Boulos demonstra fôlego para chegar ao
segundo turno. A ausência do PT na competição, fruto de um acordo dos petistas
com o próprio deputado em 2022, transformou Lula em seu principal cabo
eleitoral —e terá maior peso se o adversário for Nunes. Pesa a favor do
psolista o desempenho obtido em 2020, quando disputou com o tucano Bruno Covas o
segundo turno. Além do PT, Boulos deverá ser apoiado por PC do B e, talvez,
Rede, PV e PDT.
Já Tabata, em terceiro lugar com 11%, pode
crescer usando o discurso de que é diferente dos favoritos e, assim,
chegar ao segundo turno. Em entrevista à Folha em 24 de setembro, ela minimiza
as importâncias de Lula e Bolsonaro e dirige críticas a Boulos e Nunes. Chamou
o primeiro de radical e se colocou como "mais da vida real" e menos
do "Twitter". Disse que Ricardo Nunes é menor que o cargo, recordando
acusações "graves" que pesam sobre ele acerca
de violência doméstica e corrupção, além de afirmar que o Orçamento da
metrópole não é bem gerido.
Tabata, antes de formalizar sua candidatura,
tem o desafio de formar alianças com partidos. Deixou
o PDT de forma litigiosa e disputa
com o atual prefeito o apoio do PSDB, o que vem causando
fissuras incontornáveis na legenda tucana. O vice-presidente Geraldo
Alckmin e o ministro Márcio França (Empreendedorismo,
Microempresa e Empresa de Pequeno Porte), seus colegas de PSB, são seus
incentivadores.
A possibilidade de Guilherme Boulos sair
vencedor será maior caso enfrente Ricardo Nunes em segundo turno por reviver a
polarização esquerda versus direita e contar com Lula
como cabo eleitoral. Todavia, o momento do governo Lula em 2024 vai
importar para o seu sucesso. A eleição de Haddad para a prefeitura, em 2012,
deveu-se muito ao prestígio do líder petista. Para Nunes, o adversário mais
palatável será Boulos. Mas o fato
de ter se vinculado a Bolsonaro, com quem tirou fotos e pediu apoio, será o seu
grande desafio.
Assim, Tabata Amaral torna-se extremamente
competitiva contra ambos, mas precisa antes chegar ao segundo turno, não
importa contra quem. Teria o apoio da esquerda para derrotar Nunes e os votos
da direita para evitar a vitória de Boulos. A entrevista à Folha mostra que ela já
afinou um discurso
que dialoga com esses dois possíveis cenários.
*Cientista político, é doutor em ciências sociais (PUC-SP) e professor da FGV-Eaesp, onde coordena o Mestrado Profissional em Gestão e Políticas Públicas; pesquisa tribunais de contas e os controles sobre a administração pública
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