Documentos mostram que empresa interessada no projeto de transporte público de Cuiabá para a Copa foi paga pelo presidente da Assembleia de Mato Grosso, José Riva, para fazer estudo a favor de modelo mais caro. Parecer contrário a esse modelo foi adulterado no Ministério das Cidades para aprová-lo
Empresários se uniram a políticos para impor novo projeto da Copa em Cuiabá
Leandro Colon
BRASÍLIA - Empresários nacionais e internacionais aliaram-se a políticos de Mato Grosso liderados pelo presidente da Assembleia do Estado, José Riva (PSD), e fizeram lobby pela aprovação do projeto de transporte público em Cuiabá (MT) para a Copa do Mundo de 2014, o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), que aumentou em R$ 700 milhões o gasto original previsto para a mobilidade urbana no município. A alteração no projeto foi autorizada mediante fraude - a alteração em um parecer técnico - no Ministério das Cidades, conforme revelou o Estado na semana passada.
Documentos obtidos pelo Estado mostram que uma empresa interessada no negócio, a T" Trans Sistemas de Transporte S/A, recebeu dinheiro de José Riva, que preside a Assembleia, para fazer um estudo a favor do VLT e convencer o primeiro escalão local. Agora, já aprovada a proposta pelos deputados estaduais e pelo Palácio do Planalto, a mesma empresa quer fazer parte do negócio - participando da licitação - e vender os carros usados no VLT.
O dono da T"Trans, o italiano Massimo Giavina-Bianchi, confirmou ao Estado que, a pedido do presidente da Assembleia, orientou parlamentares e integrantes do governo de Mato Grosso a aceitar o VLT.
"Pode até ter lobby? Pode ter", disse. Admitiu ainda que recebeu dinheiro para fazer o estudo. "É claro que teve um custo, claro." E afirmou que está interessado em participar do projeto: "Pretendo sim, claro. Para mim, Cuiabá me interessa? Claro que me interessa. Nós temos aí grandes contratos muito superiores a Cuiabá, é mais um negócio, é claro que interessa. A T"Trans tem todas condições de participar dessa concorrência."
Massimo Giavina-Bianchi esteve em Cuiabá no dia 5 de abril na companhia do presidente da Assembleia Legislativa para entregar o estudo. No dia 2 de setembro, a convite do mesmo José Riva, o empresário defendeu o projeto pessoalmente aos deputados. No dia 29 de setembro, a Assembleia autorizou o governo a tomar empréstimo federal para levar adiante o VLT.
O presidente do Legislativo de MT foi o mentor intelectual do governador do Estado, Silval Barbosa (PMDB), para convencer o governo federal a trocar a ideia original, o BRT (uma linha rápida de ônibus), orçada em R$ 489 milhões, pelo VLT, ao custo de R$ 1,2 bilhão dos cofres públicos federais.
A mudança foi aprovada em agosto pela ministra do Planejamento, Miriam Belchior, após reunião com governador, e em detrimento de parecer do Ministério das Cidades contrário à troca. Logo após o aval federal, o presidente da Assembleia desdenhou da presidente. "A presidente Dilma não seria imbecil de vetar o melhor modal".
Pressão da Espanha. Além da T"Trans Sistemas de Transporte, o deputado José Riva levou a Cuiabá representantes da AZVI S.A, empresa espanhola especializada no ramo.
Em entrevista publicada no seu próprio site, Riva anunciou que a AZVI pode sair na frente para tocar obra: "A grande vantagem é que a AZVI não só executa. Ela executa e opera o sistema. Isso é que é mais importante." No dia 21 de fevereiro, José Riva, o governador Silval Barbosa, representantes da empresa espanhola e consultores externos reuniram-se a portas fechadas para discutir o assunto.
"Vamos forçar o estudo para executar esta obra", disse Riva.
A T"Trans entrou no jogo no mês de abril com potencial para ser uma parceira na venda dos veículos a serem operados no sistema. A empresa é uma velha conhecida das administrações do Rio de Janeiro e de São Paulo. É a contratada pelo governo fluminense para cuidar da manutenção dos bondes de Santa Tereza. Em agosto, um acidente com um bonde matou seis pessoas e feriu 56. A T"Trans faz parte ainda do consórcio que cuida de 25 trens da linha 3 do metrô de São Paulo.
O estudo da empresa encomendado pela Assembleia comparava o VLT ao BRT e ainda incluía o DMU, uma espécie de VLT a diesel. "Para a sociedade, as vantagens não quantificáveis do sistema VLT/DMU em relação ao BRT são inúmeras", diz trecho do documento. O Estado procurou José Riva. Informou sua assessoria do teor da reportagem, mas não houve resposta até o fechamento da edição.
Na semana passada, o Estado revelou que o Ministério das Cidades fraudou, com o aval do ministro Mário Negromonte, o processo que trata do assunto na esfera federal. Uma nota técnica contrária ao VLT foi adulterada a mando do chefe de gabinete de Negromonte, Cássio Peixoto.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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