BRASÍLIA – Os problemas climáticos enfrentados pelo Brasil e outros países no ano passado têm influência sazonal sobre o preço dos alimentos, segundo o economista Roberto Piscitelli, professor do Departamento de Ciências Contábeis da Universidade de Brasília (UnB). Mas, na sua avaliação, o verdadeiro mote para a vertiginosa alta dos índices é a concessão irrestrita de renúncias fiscais feitas pelo governo federal, que não beneficiam o consumidor.
“A parafernália de medidas favorece um; depois, o outro. Não existe diretriz, nem finalidade. Os setores favorecidos são os mais poderosos e influentes, de um modo geral. Além de provocarem perda de arrecadação, beneficiando setores e empresários, as medidas não chegam ao consumidor, ou chegam minimamente”, afirma.
A consequência dos índices inflacionários elevados já pode ser vista nas prateleiras de supermercados e sentida no próprio bolso: nos últimos 12 meses, o preço do tomate subiu 105,89%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
No caso da farinha de mandioca, a alta foi de 140,57%. Com isso, os principais afetados são famílias de baixa renda, além do setor varejista. Dados da Associação Brasileira de Supermercados (Abras) apontam que o faturamento real do setor até fevereiro deste ano acumula queda de 4%, em relação ao período anterior. Até dezembro do ano passado, o quadro era positivo, com alta de 5,3%.
Piscitelli destaca que certas distorções no mercado alimentício levam a situações “inverossímeis”, como o atual preço do tomate. “A polpa de tomate importada do outro lado do mundo chega até aqui mais barata que o produzido no país. É absurdo que produtos alimentícios importados cheguem ao nível de consumidor final a preços mais baixos que os praticados no Brasil. Todo esse processo de especulação e lucros exagerados na cadeia de produção precisa ser melhor estudado”, considera.
O economista observa ainda que, mesmo após todas as desonerações nos alimentos, o preço da cesta básica aumentou, chegando a R$ 336,26 em São Paulo, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
“É um verdadeiro acinte, inexplicável e inaceitável. Na realidade, as desonerações servem para que o empresário se recomponha ou aumente sua margem de lucro, trazendo nenhum beneficio para o consumidor final”, avalia. Para ele, o governo comete um sério equívoco na condução da política fiscal, fazendo com que a legislação tributária vire uma “colcha de retalhos”.
“O Brasil foi transformado no país do assistencialismo, com muitos subsídios para o pequeno, com os programas sociais, e o grande. O único que não recebe benefícios é a classe média, que paga cada vez mais Imposto de Renda. Essas distorções no setor de preços provocam uma grande injustiça, do ponto vista social”, explica.
“É preciso adotar políticas mais consistentes, a médio e longo prazo. O país precisa voltar a investir com instrumentos para amenizar os efeitos da própria importação. Essa questão do protecionismo na economia é, teoricamente, muito boa, mas desde que não seja em detrimento do consumidor interno”, observa.
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