• Vice na chapa de Eduardo, fundadora da Rede tem o apoio de aliados para assumir a candidatura ao Planalto, mas ela terá de superar uma série de obstáculos antes
Paulo de Tarso Lyra – Correio Braziliense
Apesar de, em nota oficial, o PSB afirmar que só tomará a decisão sobre a sucessão na chapa presidencial após o enterro de Eduardo Campos, aliados da legenda e o advogado Antonio Campos reforçam a pressão para que a atual vice, Marina Silva, seja escolhida como a candidata oficial da coligação ao Palácio do Planalto, embora saibam que, para isso, ela precise superar uma série de dificuldades e empecilhos com o PSB e os aliados (veja quadro).
Depois de conversar reservadamente com lideranças partidárias, Antonio Campos, irmão de Eduardo, resolveu mandar uma carta à direção partidária. "Marina vai agregar valor à chapa presidencial e ao debate no Brasil. Se meu irmão chamou Marina para ser sua vice, com essa atitude ele externou sua vontade", disse Tonca, como é conhecido. "Eduardo morreu na busca de um caminho para melhorar a nação. Marina Silva tem essa capacidade de empunhar uma luta que debata os caminhos do Brasil e crie caminhos para melhorar este país".
A cúpula do PSB reuniu-se ontem em São Paulo. O novo presidente da legenda, Roberto Amaral, afirmou que caberá a ele decidir quando o processo sucessório será feito. Em nota, Amaral afirmou que "o Partido Socialista Brasileiro (PSB) está de luto pela trágica morte de seu presidente nacional, Eduardo Henrique Accioly Campos, ocorrida em 13 de agosto de 2014. Recolhe-se, neste momento, irmanado com os sentimentos dos seus militantes e da sociedade brasileira, cuidando tão somente das homenagens devidas ao líder que partiu. A direção do PSB tomará, quando julgar oportuno, e ao seu exclusivo critério, as decisões pertinentes à condução do processo político-eleitoral".
Amaral, contudo, é visto com desconfiança por setores da Rede Sustentabilidade, que enxergam nele alguém perigosamente próximo do PT. Em um passado recente, ele criticou o partido que Marina tentava criar e nunca escondeu um desejo de que a aliança com Dilma Rousseff fosse mantida, mesma opinião que levou à saída dos irmãos Ciro e Cid Gomes do PSB. Ontem, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentou falar por duas vezes com Amaral, sem sucesso.
Na sede do instituto que leva seu nome, Lula confirmou que também pretende falar com Marina. Mas a intenção seria, apenas, expressar o pesar pela tragédia atual. "Obviamente que mudou a conjuntura política e eu não sei qual o tamanho do impacto. Não vamos tentar antecipar os fatos. Vamos esperar enterrar o companheiro Eduardo e os companheiros que estavam com ele e aí depois nós voltamos a falar de política", disse o ex-presidente.
"Luto e silêncio"
Embora seja o caminho natural e estejam pressionados pelo tempo escasso, já que a legislação eleitoral estipula um prazo de 10 dias para a troca do candidato em caso de morte, e a propaganda política já começa na próxima terça-feira, o PSB e os aliados esperam que Marina tenha a consciência de que terá de mudar algumas posturas se quiser ser efetivada na chapa. "Não temos tempo de ficar inventando outras saídas. Mas Marina também tem que entender que estará assumindo para manter o acordo programático firmado na coligação", disse o presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP).
Freire lamentou o ocorrido, mas disse que não é hora de Marina inventar ou pressionar pelas coisas que gosta ou não. Candidato do PSB ao governo do Distrito Federal, o senador Rodrigo Rollemberg (DF) lembra que a aliança firmada entre o PSB e a Rede foi baseada em uma construção que respeitava a identidade e a independência das duas legendas. Mas que, nesse momento, quem assumir o cargo terá de se adequar aos acordos e às propostas firmadas anteriormente.
O senador brasiliense afirmou que, no momento, as discussões políticas estarão abafadas pelo luto e pesar do partido. E que, mesmo que reuniões aconteçam e declarações sejam dadas, só após o sepultamento de Eduardo Campos e dos demais integrantes da campanha que morreram no acidente aéreo em Santos, uma solução será anunciada. Na próxima semana, estão previstas uma missa na Catedral de Brasília e sessões solenes no Congresso. "Mas a maior homenagem que podemos prestar a Eduardo é dar continuidade ao projeto político que ele ajudou a construir e cruzou o Brasil para defender", completou.
Marina submergiu. Fez um pronunciamento, emocionado, na noite de quarta-feira. Falou dos sonhos e da energia do companheiro de chapa, mas recusou-se a falar sobre política. A aliados próximos, afirmou que este é um momento de luto. Na manhã de quarta, ao se encontrar com o porta-voz da Rede, o ex-deputado Walter Feldmann (PSB-SP), antes de saber dos desdobramentos completos da tragédia, uma atônita Marina dirigiu-se ao aliado. "Walter, pelo amor de Deus, me diga que isso não está acontecendo. Pelo amor de Deus, isso não pode estar acontecendo", disse ela, antes da morte de Campos ser confirmada oficialmente.
Para Feldmann, ninguém da Rede vai se pronunciar sobre a possibilidade de Marina ocupar o lugar deixado após a morte de Eduardo. "O momento é de luto e de silêncio", disse. Para ele, não há como negar que Campos fará falta, pois ele conduziu, com maestria, as divergências internas entre sonháticos e socialistas. "Mas tudo o que foi acertado e que estava sendo discutido na campanha foi uma construção programática conjunta dos dois partidos. Isso será mantido, não há dúvidas", assegurou Feldmann.
Os obstáculos
Confira os problemas que a ex-ministra de Lula, idealizadora da Rede, precisa superar para se tornar a sucessora de Eduardo Campos
Alianças regionais
Marina terá de abandonar o discurso purista que adotou em algumas coligações para aceitar os acordos fechados pelo PSB
Agronegócio
Quando a aliança foi formalizada, Marina rechaçou uma aproximação do PSB com produtores rurais, deixando prevalecer o discurso ambiental. Terá que reconstruir as pontes
Futuro da Rede
Às vésperas da convenção que homologou a candidatura, a direção da Rede disse que o projeto de criação do partido seguia incólume. E acrescentava que, tão logo o TSE concedesse o registro, o grupo migraria para a outra legenda, o que muda nesse novo cenário em que ela se torna cabeça de chapa no processo do PSB
PSDB
A ex-ministra ficou incomodada com os elogios mútuos e a política de aproximação entre Eduardo Campos e Aécio Neves. Se quiser ter expectativas em um eventual segundo turno, precisará dessa relação com os tucanos
Discurso religioso
Vice de um candidato a presidente extremamente católico, Marina terá de superar o rótulo de evangélica se desejar ampliar o número de eleitores nos demais seguimentos religiosos
Rejeição interna
Marina terá de vencer a desconfiança de setores do PSB, que a viam como estrangeira. E superar o discurso daqueles que, inspirados pelos irmãos Cid e Ciro Gomes (que deixaram o PSB para filiar-se ao Pros), defendem o apoio à reeleição de Dilma
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