• Oposição conquista maioria das cadeiras parlamentares na Venezuela e promete anistia a presos do governo Maduro
Samy Adghirni – Folha de S. Paulo
CARACAS - A vitória arrasadora da oposição venezuelana na eleição parlamentar deste domingo (6) acaba com 16 anos de governo hegemônico do chavismo, mas abre caminho para um provável choque entre poderes da república.
Na contagem oficial mais recente, a coalizão opositora Mesa da Unidade Democrática (MUD) conquistou ao menos 107 das 167 cadeiras do Parlamento unicameral. Isso garante maioria de três quintos suficiente para escolher o presidente do Legislativo, convocar referendos e aprovar e alterar leis orgânicas e reformas constitucionais.
O Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) obteve 55 cadeiras. Seis assentos ainda estão indefinidos. O comparecimento foi de 74,25%.
Não está claro, portanto, se a oposição ficou com maioria qualificada de dois terços (112 cadeiras), que permitiria, em tese, destituir vice-presidente, ministros e juízes da Suprema Corte, além de sancionar leis habilitantes.
As diferentes correntes da MUD estão divididas sobre como usar a maioria para se mover no xadrez das instituições de um Estado que tem quatro poderes além do Legislativo: Executivo, Judiciário, Eleitoral e Cidadão.
Um objetivo comum nas fileiras da MUD, porém, é aprovar a anistia de opositores presos acusados de instigar violentos protestos e conspirar contra o presidente Nicolás Maduro. O preso mais conhecido é Leopoldo López, líder do partido Vontade Popular, parte da MUD.
O governo evita se pronunciar sobre a anistia, mas a candidata chavista derrotada Ilenia Medina, do partido Patria Para Todos, disse à Folha que o Judiciário vetará a libertação dos políticos presos, a quem responsabiliza pelas dezenas de mortes nas manifestações de 2014.
"Estas pessoas cometeram crimes muito graves. Anistiá-los seria violar a Constituição e as normas internacionais, já que estes assassinos cometeram crimes contra a humanidade".
Também estão em rota de colisão dois projetos antagônicos de gestão econômica. A oposição quer eliminar controles de câmbio e de preço e recuperar direitos dos empresários vítimas de expropriações feitas pelo governo.
Em discurso na noite desta segunda-feira, Maduro acusou a oposição de querer "impor a restauração neoliberal" e prometeu manter o tabelamento de preços para defender direitos "do povo e dos trabalhadores."
Outro ponto polêmico envolve a eventual convocação de um referendo revogatório contra Maduro.
Setores mais radicais da oposição deixam claro que a conquista da Assembleia Nacional será usada para encurtar a atual Presidência.
Para que a medida seja aplicada, a oposição precisaria reunir assinaturas de apoio em número maior que a quantidade que os 7,5 milhões de votos com os quais Maduro foi eleito em 2013.
"A lei diz que o revogatório só pode ser convocado em caso de erro grave do presidente. O que fez Maduro de tão grave? A oposição só quer acurralar as instituições democráticas", diz Medina.
O advogado constitucionalista Ricardo Combellas, que fez parte da Constituinte de 1999 e rompeu com o chavismo, diz que é cedo para fazer projeções a prevê possível diálogo inédito entre as duas bancadas.
"Muita coisa ainda pode acontecer, mas o importante é que o Parlamento recuperará sua função perdida de ser um foro para o debate livre, aberto e sem perseguição".
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