- O Globo
Prisões podem levar a uma crise entre poderes. Primeiro, veio a perplexidade. Os dois ministros mais próximos do presidente Michel Temer — Eliseu Padilha (Casa Civil) e Geddel Vieira Lima (Governo) — amanheceram ontem sem saber o que dizer diante da informação de que o presidente do Senado, Renan Calheiros; da Câmara, Eduardo Cunha; o principal articulador do governo no Congresso, Romero Jucá; e o ex-presidente José Sarney poderiam ser presos. Com a sinceridade habitual, Geddel evitou as perguntas:
— Estou aguardando os desdobramentos dos acontecimentos para passar a achar alguma coisa — disse.
Apesar de as informações que circulavam ontem em Brasília darem conta de que o Supremo não mandaria a elite do partido do governo para a cadeia, o simples pedido de prisão já era motivo suficiente para jogar o confuso cenário político brasileiro numa incerteza absoluta. Nos últimos meses, Renan Calheiros e José Sarney integraram o seletíssimo grupo dos que ainda mantinham pontes com os dois lados da guerra política brasileira.
Para Temer, a eventual ausência de Renan travaria a votação das propostas para a saída da recessão econômica profunda e o colocaria diante de uma “Escolha de Sofia” sobre a sucessão no Senado. Quando Eduardo Cunha foi afastado do mandato, o governo aceitou que não se declarasse a vacância da presidência. Mas na eventualidade de Renan ser afastado, o governo precisará eleger um novo presidente, para impedir que Jorge Viana, do PT, comande a Casa.
Tendo entregue postos-chave do governo aos aliados Jucá e Cunha, Temer voltou a sofrer desgaste ontem com os pedidos de Janot. Ele só não poderá alegar que foi por falta de aviso que colocou a imagem de um governo em construção no cadafalso.
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, optou por dar novo passo em terreno nunca desbravado. Em novembro, pediu a prisão de Delcídio Amaral após ele ser gravado articulando a fuga para o exterior de um cidadão condenado e preso. Agora, Renan, Sarney e Jucá foram grampeados discutindo formas de restringir a ação da Operação Lava-Jato através de negociações com o Supremo ou mudanças nas regras de delação. Em ambos os casos, os peemedebistas dependiam da anuência de ministros ou parlamentares.
Caso o Supremo negue o pedido de Janot, estabelecerá assim o nível do sarrafo para a ação do procurador. Se aceitar, será preciso ver então se os senadores de diversos quadrantes que ontem o criticaram irão peitar o Supremo e impedir as prisões. Isso configuraria o salto da grave crise política para uma inaudita crise entre poderes.
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