• Presidente do Senado afirma que pedido de Janot é ‘abusivo e desproporcional’
Cristiane Jungblut, Isabel Braga – O Globo
BRASÍLIA — Alvos de pedidos de prisão feitos pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao Supremo Tribunal Federal (STF), caciques do PMDB reagiram, nesta terça-feira, com críticas e perplexidade em notas divulgadas à imprensa. O presidente do Senado, Renan Calheiros (AL), classificou como desproporcional e abusiva a iniciativa de Janot. O senador Romero Jucá (RR) declarou considerar "absurdo" o pedido, e reiterou que sempre esteve à disposição para dar todos os esclarecimentos pedidos dentro da Lava-Jato. O presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha, também disse que vê com estranheza o "absurdo pedido" de prisão. Já o ex-presidente José Sarney (AP) afirmou que está "perplexo, indignado e revoltado".
O pedido de Janot foi revelado pelo GLOBO em sua edição desta terça-feira. Renan, Jucá e Sarney foram flagrados tramando contra a Operação Lava-Jato em conversas gravadas pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado. O "Bom Dia Brasil", da TV Globo, confirmou que há também um pedido de prisão contra Cunha, mas o motivo seria sua interferência no comando da Casa, mesmo após seu afastamento.
Em nota, Renan disse confirar na "autoridade e dignidade do Supremo" e que se mantém "sereno". Ele negou que tenha cometido atos que possam ser compreendidos como obstrução à Justiça.
"Por essas razões, o presidente considera tal iniciativa, com o devido respeito, desarrazoada, desproporcional e abusiva. Todas as instituições estão sujeitas ao sistema de freios e contrapesos e, portanto, ao controle de legalidade. O Senado Federal tem se comportado com a isenção que a crise exige e atento à estabilidade institucional do País", diz a nota divulgada pela assessoria.
A assessoria de Eduardo Cunha informou que ele não iria se posicionar sobre o pedido de prisão dele feito por Janot até ter conhecimento do teor do documento.
Horas mais tarde, o peemedebista afirmou em nota que vê com estranheza o "absurdo pedido" de prisão. Cunha disse que como não tem ciência do conteúdo, não tem como contestar, mas vê no ato de Janot uma tentativa de constranger parlamentares do Conselho de Ética que defendem sua absolvição.
O senador Romero Jucá (PMDB-RR), também em nota, disse considerar "absurdo" o pedido de prisão, e reiterou que sempre esteve à disposição para dar todos os esclarecimentos pedidos dentro da Lava-Jato. Jucá disse que foi "vítima" da gravação de Sérgio Machado e que nunca propôs mudanças na legislação, não podendo ser acusado de obstrução da Justiça.
Em nota, o ex-presidente José Sarney divulgou nota em que se diz "perplexo, indignado e revoltado".
"O Brasil conhece a minha trajetória, o meu cuidado no trato da coisa pública, a minha verdadeira devoção à Justiça, sob a égide do Supremo Tribunal Federal", disse.
Mais cedo o advogado Antônio Carlos de Castro, o Kakay, que representa Jucá e Sarney, também disse estar "perplexo" e chegou a ressaltar que só acreditará quando estiver de posse dos documentos oficiais a respeito. Sarney foi avisado por Kakay, por telefone, e custou a entender o que estava ocorrendo. Ele não entendeu e quis saber o motivo.
Renan fala ao plenário
No Senado, Renan Calheiros disse que, sempre que há "exagero, excessos e extravagâncias", conceitos importantes como democracia, liberdade de expressão, Constituição e separação entre os Poderes "se desgastam ou perdem prestígio". Sem citar o nome de Janot ou mesmo a palavra prisão, Renan disse, em manifestação no Plenário, sentado à mesa e conduzindo a sessão, que aguardará a manifestação do STF.
- ‘Mais do que nunca, é preciso exercitar a separação dos poderes, mais do que nunca, e aguardar com tranquilidade, com serenidade, com responsabilidade a decisão da Suprema Corte’- RENAN CALHEIROS (PMDB-AL)Presidente do Senado, após pedido de prisão
— Queria repetir antes de começarmos a ordem do dia. Não adianta. Não vamos elevar, aumentar a temperatura O Senado não é parte da crise, o Senado é a solução da crise. E não vamos, em nenhum momento, exacerbar da nossa competência. Vamos aguardar a manifestação da Suprema Corte. E compreendo que, em todos os momentos de desproporcionalidade, de excesso expressões como democracia, separação de Poderes se desgastam muito — disse Renan.
Renan afirmou que é "hora de se exercitar a separação entre os Poderes". Renan procurou aparentar normalidade, iniciando as votações. Mas, antes, recebeu apoio de vários senadores.
— Queria dizer aos senadores e às senadoras: temos a mais aberta compreensão da separação dos Poderes. Mais do que nunca, é preciso exercitar a separação dos poderes, mais do que nunca, e aguardar com tranquilidade, com serenidade, com responsabilidade a decisão da Suprema Corte.
Qualquer movimento que fizermos a mais parecerá que estamos danificando a separação dos Poderes, que é fundamental para o equilíbrio nesse momento dramático da vida nacional. Mais do que nunca, é preciso falar pelo silêncio. Eu acabei de dizer pra imprensa que o meu silêncio será uma manifestação retumbante. Eu falarei pelo meu silêncio. E aguardarei a manifestação do Supremo — disse Renan.
Ele decidiu falar depois de uma manifestação de Jucá.
— E queria dizer ao senador Romero Jucá que nós não devemos ter preocupação com os excessos que cometem contra gente. Eu, como presidente do Senado, toda vez que cometem excessos contra os senadores, eu fico preocupado. Preocupado, sobretudo, com a soberania dos mandatos dos senadores. Mas isso não importa, não precisamos ter tanta preocupação. Temos que ter, sim, preocupação é quando cometem excessos contra a instituição. Porque aí não haverá quem corrija esse excesso — disse Renan.
Jucá disse que sua situação era "absurda". Ele fez uma rápida manifestação em plenário e depois recebeu cumprimentos de colegas como Armando Monteiro (PTB-PE) e Fernando Bezerra (PSB-PE).
— Vou aguardar com tranquilidade de quem fala a verdade e confia na Justiça. E espero que essa situação absurda possa ser resolvida a curto prazo — disse Jucá.
Pouco antes, em entrevista à imprensa, Renan disse que a nota divulgada por ele mais cedo, com ataques a Janot, era "autoexplicativa".
- ‘Vou aguardar com a tranquilidade de quem fala a verdade e confia na Justiça’- ROMERO JUCÁ (PMDB-RR)Senador, após pedido de prisão ao STF
— A nota é autoexplicativa. Toda vez que há exagero, extravagância, excessos, desproporcionalidade, expressões como democracia, Constituição, liberdade de expressão, liberdade de opinião, presunção de inocência perdem prestígio. E não vamos colaborar com isso — disse Renan, acrescentando:
— Não é hora de aumentar a temperatura institucional. A nota é autoexplicativa. Não adianta, não adianta mesmo. O Senado não vai extrapolar a sua competência, seu limite. Não vamos elevar, aumentar a temperatura da crise institucional. O Senado não é parte da crise. O Senado será a solução da crise.
Repercussão no STF e no Planalto
Os pedidos de prisão provocaram reações no STF, no Planalto e no Congresso. O ministro Gilmar Mendes, do Supremo, criticou o vazamento de informações contidas em processos ocultos. Ele disse que essa prática configura crime e os responsáveis precisam se explicar. Embora não tenha responsabilizado diretamente a PGR pelos vazamentos, o ministro disse que é um contrassenso pedir o sigilo em determinado processo e depois divulgar o teor do caso para a imprensa.
— Ah, é processo oculto, pede-se sigilo, mas divulga-se para a imprensa que tem o processo aqui (no STF), ou inquérito. Isso é algo grave, não se pode cometer esse tipo de... Isso é uma brincadeira com o Supremo. É preciso repudiar isso de maneira muito clara. Quem estiver fazendo isto está cometendo crime — disse.
Já o presidente interino Michel Temer irá esperar a decisão do ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no STF, sobre os pedidos de prisão de quatro peemedebistas da cúpula do partido para o governo se pronunciar. O assunto foi tratado em conversa entre Temer e ministros na manhã desta terça-feira, mas a definição foi de aguardar desdobramentos.
Enquanto isso, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha afirmou que só Janot poderá responder sobre os pedidos de prisão.
— Só quem pode responder é o doutor Janot. Ele que sabe por que fez, o que fez, o que ele escreveu, o que ele pediu — declarou Padilha, e disse também que não sabe "absolutamente nada" sobre as decisões do procurador-geral da República:
— Ninguém sabe. Eu não sei nada. Não sei nada. Absolutamente nada.
O líder do governo no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SO), voltou a sair em defesa de Renan e Jucá.
— Naquilo que foi divulgado (sobre as gravações de Sérgio Machado), não vejo o menor fundamento —disse Aloysio.
Na mesma linha, o líder tucano Cássio Cunha Lima (PB) afirmou que há o risco de se transformar o país em um “estado policialesco” e que é preciso que o Supremo Tribunal Federal analise com "muita cautela" os pedidos, porque "o santo é de barro":
- ‘É preciso ir com calma, devagar com o andor, porque o santo é de barro, senão esse país não aguenta’- CASSIO CUNHA LIMA (PB)Líder do PSDB no Senado sobre pedidos de prisão
— Existe um clamor público que termina pressionando as instituições, mas nós não podemos, em nome desse clamor público, transformar o país em um estado policialesco, onde até mesmo a emissão de uma opinião em uma conversa privada possa justificar um pedido de prisão. É preciso ir com calma, devagar com o andor, porque o santo é de barro, senão esse país não aguenta.
O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), disse que o momento é "delicado", mas ressaltou que é preciso aguardar a manifestação do Supremo.
— Formulado os pedidos, não temos nada a fazer a não ser aguardar a decisão do Supremo. Diante de eventual decisão, o Senado terá que se manifestar. As regras são bem claras e teremos que tratar isso como na situação anterior (de Delcídio), se for o caso. É um momento delicado, mas vamos aguardar porque em cada momento cabe a um Poder se manifestar. Não podemos caracterizar o momento como desestabilizador da República. Mas é um momento delicado e claro que provoca temor enorme, principalmente na economia — disse Caiado.
No PT, segundo senadores, houve surpresa com os pedidos. Mas a avaliação é que isso pode desgastar ainda mais o governo Temer, já que as gravações mostraram articulações para se chegar ao impeachment e evitar a Java-Jato.
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