- Valor Econômico
Foi Cabral quem comandou o grupo que a Operação Lava-Jato tratou de colocar ontem atrás das grades. O ex-governador do Rio é a face mais conhecida, mas por trás dele, no entanto, estão grandes colaboradores como o ex-todo-poderoso secretário de Governo Wilson Carlos, o influente Hudson Braga, que se tornou secretário de Obras, como havia sido o atual governador na administração Sergio Cabral e por isso chamado de "Pezão do Pezão", e Carlos Miranda, sócio de Cabral na empresa SCF Comunicação e suspeito de ser o seu operador. O grupo é acusado de receber propina de obras públicas bilionárias realizadas no Estado nos últimos anos como o Arco Metropolitano, a reforma do Maracanã e o PAC Favelas, projeto de urbanização de comunidades como Rocinha e Complexo do Alemão.
Wilson Carlos era o tipo de homem no entorno de Cabral a quem, a despeito do cargo público de secretário, pessoas próximas a ele indicavam sua posição no governo em baixo tom de voz, ao pé do ouvido. Era o braço-direito, uma eminência, o "articulador" de negócios que agora são apontados como criminosos. Era um amigo de Cabral e com ele se divertia, como no famoso episódio de 2009, no restaurante L'Espadon, do hotel Ritz, cinco estrelas, em Paris.
Wilson Carlos é um dos personagens do que se convencionou chamar de "gangue" ou "farra dos guardanapos". A galhofa misturada com ostentação contrasta com o caos em que se transformou o Estado do Rio nos dias de hoje, num drama fiscal sem precedentes.
Hudson Braga, o Braguinha, por sua vez, é próximo de Pezão. Vem de Volta Redonda, município próximo a Piraí, terra natal do governador, que ali foi prefeito. Ascendeu na esteira de Pezão, virou secretário de Obras e coordenou sua campanha à reeleição.
Dos três, Carlos Miranda é o que recebeu menos holofotes no período Cabral. Não tinha cargo público, mas era assíduo no Palácio Guanabara. Amigo e ex-marido de uma prima do governador, Miranda é qualificado pelo Ministério Público Federal como "homem da mala", acusado de ser o intermediário entre Cabral e os recebedores de propina em espécie - entre eles até conselheiros do Tribunal de Contas do Estado - e as construtoras pagadoras de corrupção.
Uma das principais é a Delta, de Fernando Cavendish, que cumpre prisão domiciliar. Em depoimento, Cavendish relatou que, certa vez, foi instado por Cabral, enquanto passeavam em Mônaco, a comprar um anel de brilhante para dar de presente à mulher do ex-governador, Adriana Ancelmo. O valor: R$ 800 mil. Quando Cavendish buscou ajuda de Cabral para evitar que a Delta fosse considerada inidônea, a joia foi devolvida, num símbolo do rompimento entre os dois.
Adriana não foi presa, mas levada a depor em condução coercitiva. Primeira-dama que exibia uma vida de luxo, com frequentes viagens internacionais, com ou sem o marido, a advogada da Assembleia Legislativa do Rio que Cabral conhecera quando era presidente da Casa teve de explicar à Polícia Federal sua suposta participação no esquema de corrupção investigado pela Operação Lava-Jato.
Adriana é sócia de um escritório de advocacia que teve um crescimento vertiginoso durante os dois mandatos de Cabral. Antes da chegada do marido ao Palácio Guanabara, o escritório contava com três profissionais e atuava em cerca de 500 processos. No ano seguinte à posse, contabilizava uma banca de duas dezenas de advogados e quase 10 mil ações.
Em debate eleitoral realizado em 2010, quando tentava a recondução ao cargo, Cabral foi questionado pelo adversário Fernando Peregrino (PR), candidato de Anthony Garotinho, seu inimigo político e também preso - em outra operação, anteontem - sobre o súbito crescimento do escritório da primeira-dama. O governador creditou o sucesso à "competência" da mulher.
A coincidência era suspeita diante do fato de que Adriana tinha entre seus grandes clientes empresas com contratos com o Estado. De acordo com o Ministério Público Federal, o escritório recebeu quase 17 milhões das concessionárias Oi/Telemar (telefonia), Light (energia elétrica), CEG (gás) e transportes (Metrô Rio). A investigação da Lava-Jato apura de que maneira os contratos funcionaram como uma grande lavanderia no suposto esquema de corrupção liderado por Cabral. Em oito anos, a participação das concessionárias na receita do escritório saltou de 2% para 60%.
A falta de ação do Ministério Público do Rio de Janeiro diante do conflito de interesses não deixou de ser notada pelo juiz Marcelo Bretas, na decisão que deslanchou a operação. O magistrado estranhou o fato de que, apesar de todos os indícios, o caso foi arquivado. "Tais situações, apesar de aparentemente terem passado desapercebidas pelos órgãos de controle estaduais, a partir de agora serão objeto da merecida atenção pela Justiça Federal, a partir da atuação isenta e diligente do Ministério Público Federal e com o apoio efetivo da Polícia Federal".
Outros dois suspeitos de participação do esquema são colaboradores próximos de Cabral. O amigo de infância Luiz Carlos Bezerra, um dos operadores, pagou contas pessoais da mãe e da mulher do ex-governador. Paulo Fernando Magalhães Pinto Gonçalves foi assessor especial de Cabral e é considerado um "laranja", por esconder patrimônio do pemedebista como um helicóptero e uma lancha avaliada em R$ 5 milhões.
A lancha encontra-se no condomínio Portobello, em Mangaratiba, litoral do Sul fluminense, lugar da mansão que surgiu, há quase duas décadas, como o primeiro sinal de enriquecimento ilícito de Cabral.
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