- Valor Econômico
Saída de outsiders retira o peso do imponderável
Joaquim Barbosa resolveu não entrar na briga. Quis se preservar e, de passagem, deu uma esnobada, colocando-se acima da pocilga que vê na política. Faltou explicar porque cogitou se refastelar nela, filiando-se ao PSB e deixando a especulação correr solta. Ao bater a porta, declarou que considera um absurdo a proibição às candidaturas individuais, deixando implícito que, se pudesse governar como quem sentencia, teria entrado na disputa.
Joaquim Barbosa é o segundo outsider a recusar o cavalo selado, pronto para marchar para o palácio. Antes dele, Luciano Huck foi incensado por sua juventude, dinamismo e comprometimento com valores cívicos. Como o meritíssimo, o apresentador refugou na hora de montar.
Os outsiders, a despeito das condições ideais para que tentassem a sorte, preferiram ficar de fora. A disputa, portanto, ficará restrita a políticos profissionais, já conhecidos. A situação criada, para dizer o mínimo, é surreal, pois lideram as pesquisas dois candidatos que, para valer, não são candidatos. Lula está preso e, se candidato, sabe-se, com certeza, terá sua candidatura impugnada. Jair Bolsonaro, de sua parte, para manter sua candidatura, não pode abrir a boca, pois só fala absurdos. Não se pode esquecer que não faz muito declarou que o 'esquerdista' Fernando Henrique Cardoso deveria ser fuzilado por ter privatizado a Vale do Rio Doce. Sabe-se lá que tratamento pretende dispensar a Paulo Guedes, seu assessor, cuja ideia fixa é privatizar o que vê na sua frente. Se falar, Bolsonaro não tem como ganhar votos.
Portanto, os dois candidatos que lideram as pesquisas devem ser descartados, não contam, não são candidatos para valer.
Ficamos, assim, com os candidatos declarados e, quem se der ao trabalho de contar, verá que eles não são poucos. Mas o número de candidatos, em si mesmo, não é o que realmente importa. Toda eleição tem um grande número de figurantes, alguns até chegam a se destacar por suas contribuições ao folclore político, como Levy Fidelix na última eleição. Mas há candidatos eternos, como o não menos folclórico José Maria Eymael, um 'Democrata Cristão', ou Rui Costa, o defensor da 'Causa Operária'.
Há, portanto, candidatos e candidatos, os viáveis e os meros coadjuvantes. E, nessa eleição, não faltam candidatos a figurantes, isso para não falar dos que ainda se dizem candidatos, mas que ninguém acredita que de fato o sejam, como Michel Temer, Rodrigo Maia e Afif Domingos. Esses estão ali só para guardar-caixão.
Nas eleições anteriores, o critério para distinguir as candidaturas viáveis das demais era muito simples, bastava olhar o número de partidos que integravam a coligação do candidato. A relação era direta: para decolar, uma candidatura tinha que contar com uma coligação numerosa. Quanto maior a coligação, mais chances de sucesso. E isso se aplicava tanto à eleição presidencial quanto aos governos estaduais. A razão para a vigência dessa relação é simples: uma coligação ampla garante maior exposição no horário eleitoral gratuito.
Na eleição deste ano, essa relação terá seu peso, mas a lógica que ditava a formação de coligações sofreu alterações. Isso em razão da redefinição das regras de financiamento das campanhas e do modo pelo qual será calculada a distribuição do tempo de rádio e TV. Essas duas novidades estão dificultando o acerto das alianças.
A saída definitiva do último dos outsiders retira o peso do imponderável sobre a definição do quadro sucessório. Agora se sabe que não há mais surpresa no horizonte, que inexiste um candidato que possa atropelar por fora. O que há para considerar são as candidaturas postas e entre essas as que podem ser contadas como viáveis.
A saída de Joaquim Barbosa tem um efeito adicional, a saber, destravar o PSB, partido chave na armação das alianças em diversos Estados, sobretudo no Nordeste, justamente onde o espólio petista é maior. Agora, livres de Barbosa, os candidatos ao governo pelo PSB podem tratar das suas vidas e das eleições.
Tudo isso considerado, três candidaturas destacam-se das demais: a de Marina Silva, a de Ciro Gomes e a de Geraldo Alckmin. Esses são os nomes com maior apoio nas pesquisas e maiores chances de armar candidaturas viáveis.
Marina parece mais talhada a atrair os eleitores que aspiram renovação e igualam todos os políticos profissionais. Contudo, de outro lado, carece de apoios para estabelecer as cabeças de ponte nos Estados necessárias para estruturar sua campanha. Ciro e Alckmin, por outro lado, saem perdendo porque são mais identificados com 'tudo que está aí', mas pulam na frente em razão das redes partidárias que mobilizam.
Indo um passo adiante, parece claro que a viabilidade dessas duas candidaturas passa pela reativação dos eixos sociais e geográficos que estruturaram as disputas pela Presidência desde 2006. A despeito de sua filiação recente ao PDT, Ciro está em condições de recriar, Estado a Estado, a aliança entre PT e PSB no Nordeste, alcançando assim os eleitores da região que sufragaram Lula e Dilma nos últimos pleitos. Para dizer o mesmo de outra forma, dos três candidatos listados, Ciro é o mais talhado para conquistar o eleitor típico do PT.
E se for assim, então Geraldo Alckmin depende da reativação do polo oposto, aquele que sustentou as candidaturas do PSDB desde pelo menos 2006: os eleitores de maior renda, concentrados nas regiões Sul e Sudeste do país. Até o momento, esses setores ainda não deram sinais de que pretendem voltar ao ninho tucano, mas também não indicaram o rumo que tomarão. Marina pode disputar esse eleitorado com Alckmin.
A definição do quadro sucessório está nas mãos dessas três candidaturas. Se uma delas despontar, as demais se ajustarão. É assim que eleições funcionam, só contam mesmo as alternativas viáveis.
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Fernando Limongi é professor do DCP/USP e pesquisador do Cebrap.
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