Intervenção descabida de magistrado desencadeia confronto de decisões em torno da soltura de Lula
Difícil entender como um servidor público da importância do desembargador Rogério Favreto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, possa colocar sua reputação em risco para participar de uma empreitada canhestra como a testemunhada pelo país no domingo (8).
O magistrado encarregava-se do plantão na corte durante o fim de semana quando caiu em suas mãos um pedido para a libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro a 12 anos e um mês de prisão.
Nem se considere, por ora, o mérito da demanda. As circunstâncias de Favreto —um ex-auxiliar de governos petistas e ex-membro do partido por quase duas décadas, diante de um caso já deliberado pelo tribunal— eram mais que suficientes para recomendar uma atitude de autocontenção.
Ele, entretanto, optou por agir de imediato, dando origem a uma sequência de atropelos judiciais digna do folclore do futebol de várzea.
O juiz determinou a soltura de Lula, acatando o argumento deveras questionável, apresentado por três deputados do PT, de que o ex-mandatário, na condição de pré-candidato ao Planalto, vê-se impedido de participar de entrevistas, sabatinas e outros eventos relacionados a sua pretensão.
Em questão de horas, outros três magistrados se envolveriam no assunto. De suas férias, Sergio Moro, que condenou Lula em primeira instância, publicou despacho para contestar a decisão de Favreto; este reiterou a ordem de soltura, sendo contraditado em seguida por João Pedro Gebran Neto, relator da Lava Jato no TRF-4.
Por fim, uma terceira determinação em favor do líder petista levou o presidente da corte, Carlos Thompson Flores, a proferir a negativa final no início da noite.
Com a operação, o PT decerto conseguiu elementos para reforçar sua tese de que membros da Lava Jato, Moro em particular, dedicam atenção anormal a Lula —o que em nada contribui, todavia, para suas alegações de inocência.
Tivesse a libertação sido consumada, mesmo que por pouco tempo, haveria a chance de promover imagens e declarações para o eleitorado cativo ou simpatizante.
Não o sendo, o partido ainda colhe benefícios difusos com o desgaste da credibilidade do Judiciário como um todo —para o qual concorre de modo decisivo, como muito se apontou desde domingo, o ativismo personalista dos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Salvo algum casuísmo jurídico extremo, a estratégia não tornará Lulaelegível, esteja preso ou solto. A postulação momentânea busca manter a coesão de aliados e militantes, à custa de insuflar conflitos e postergar a discussão programática. Pode ser eficaz para ganhar votos, mas não para governar.
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