- O Globo | Folha de S. Paulo
Ataque contra o Porta dos Fundos tem a mesma marca dos que agiam em 1968
Na madrugada do dia 24, quatro pessoas atiraram dois coquetéis molotov contra o prédio onde funciona a produtora de vídeos do grupo Porta dos Fundos. Nos últimos anos, pelo menos três sedes do PT foram atacadas e até hoje ninguém foi preso. Em março do ano passado, a vereadora Marielle Franco e seu motorista foram executados numa rua do Rio. O ex-sargento da PM Ronnie Lessa está preso, acusado de ser dono do braço tatuado que disparou os tiros, mas guarda obsequioso silêncio.
O atentado que matou Marielle segue o padrão de execuções das milícias. Já os molotovs atirados contra o prédio do Porta do Fundos e as sedes do PT têm a marca do terrorismo light dos grupos de direita que agiam em 1968. Esse foi um terrorismo interessado em estimular a radicalização, preocupado em não fazer vítimas.
Em 1968, havia uma esquerda assaltando bancos e praticando atos terroristas, inclusive matando gente. Hoje, esquerda terrorista não há. A direita armada daquele tempo agiu sobretudo em São Paulo e no Rio. Em São Paulo, era coordenada por um maluco que dizia ter conexões com o Palácio do Planalto. Comprovadamente, ele tinha ligação com um general da reserva e liderava 14 policiais militares.
No Rio, o negócio era outro. Desde 1962, quando um oficial do Exército fez a bomba que explodiu à noite numa exposição industrial da União Soviética, todos os atentados tiveram a participação de militares. (Em 1968, o mesmo oficial jogou uma bomba no jardim da embaixada russa.)
Esses militares eram avulsos, mas, a partir da criação do Centro de Informações do Exército, alguns deles aninharam-se por lá. Em abril de 1968, militares sequestraram os irmãos Rogério e Ronaldo Duarte e os levaram para um quartel, onde foram torturados. (Duas semanas depois, o serviço de inteligência do Exército americano identificou os sequestradores mas, passados 51 anos, o crime continuou insolúvel.)
Em junho de 1968, os legionários aninhados no CIE decidiram agir contra teatros: “A gente invadia, queimava, batia, mas nunca matava ninguém”, contou o veterano coronel Luís Helvécio da Silveira Leite, que ficou nesse ramo até 1977.
O Exército combatia um terrorismo letal de esquerda, mas não via aquele que estava entre a tropa. Nas palavras do general Antônio Carlos Muricy, um dos grandes chefes militares da época: “Nós ouvíamos falar nesses atentados, mas a informação dada ao ministro era de que não se tratava de coisa do Exército, e muito menos do CIE”.
Esse tipo de terrorismo evoluiu para bombas em livrarias e bancas de jornal, até que em 1981 um capitão do DOI-Codi foi ao show do Riocentro e uma bomba explodiu no colo do sargento que o acompanhava, matando-o. O resto é história. Uns poucos militares anexos à repressão política meteram-se com bicheiros. Hoje, o jogo do bicho é coisa de freiras se for comparado às milícias e ao Escritório do Crime do Rio de Janeiro.
A hierarquia militar tolerou o terrorismo light contra teatros vazios e bancas de jornal fechadas. Tolerou também espancamentos de atores, um sequestro de bispo e o assassinato da secretária do presidente da OAB. O preço dessa tolerância foi esgarçamento da disciplina militar.
No dia 12 de outubro de 1977, quando o presidente Ernesto Geisel demitiu o ministro do Exército, general Sílvio Frota, oficiais do CIE estocaram dezenas de coquetéis molotov para atacar o Palácio do Planalto. Se ousassem, tomariam bala, mas não tentaram e no dia seguinte, respeitosamente, apresentaram-se ao novo ministro.
A história secreta de uma anarquia militar
Está nas livrarias “A História Secreta da Rendição Japonesa de 1945”, do americano Lester Brooks.
Publicado em 1967, ainda é um clássico e conta o comportamento da elite militar e civil japonesa nos últimos dias da Segunda Guerra Mundial, com uma narrativa minuciosa do que aconteceu entre os dias 6 de agosto, quando uma bomba atômica devastou Hiroshima, e 2 de setembro, quando os japoneses se renderam a bordo do encouraçado Missouri. Foi traduzido pelo generais da reserva Gleuber Vieira e Joubert Brízida. Gleuber comandou o Exército de 1999 a 2003. Viu de tudo, mas nunca falou.
Quando a bomba caiu em Hiroshima, o Japão já estava perdido. “A História Secreta” mostra como a corporação militar quis continuar a guerra, chegando mesmo a tentar um golpe contra o palácio imperial. Acreditavam em qualquer coisa: a bomba seria de fósforo, os americanos não jogariam outra (jogaram, em Nagasaki), não teriam artefatos suficientes (tinham, e a terceira poderia cair em Tóquio).
Lester Brooks respeita a noção segundo a qual os militares japoneses tinham um código de honra, dispostos a morrer pela pátria e pelo imperador. Mesmo assim expõe o delírio dos generais e almirantes que pretendiam obter condições dos americanos. Em 1945, o Japão tinha almirantes dispostos a continuar a guerra, mas desde 1944 não tinha Marinha. Desde fevereiro os americanos bombardeavam Tóquio e Yokohama com a perda de apenas 3% dos aviões. Os generais japoneses atacavam com kamikases, matando 100% de seus jovens pilotos.
Desde março de 1945 o primeiro-ministro japonês sabia que a guerra estava perdida, e em maio começaram as primeiras negociações secretas e irrealistas. Em junho, os generais estavam prontos para continuar a luta com lanças de bambu, enquanto os americanos discutiam sobre qual cidade deveria ser jogada a bomba atômica.
Do livro de Brooks, emergem dois personagens, o general Anami, ministro do Exército, e o coronel Ida. Anami, foi para cá e para lá, mas desautorizou o golpe e se matou numa cena de ritual samurai. Ida articulou um suicídio coletivo, decepcionou-se ao saber que só 2 em cada 10 oficiais que consultou topavam morrer (topavam matar mais soldados, mas essa é uma velha história). Cuspindo fogo, Ida fez o possível e, ao fim da história, mudou seu nome para Iwata, vestiu um terno e foi trabalhar numa agência de publicidade, onde Brooks o entrevistou. (Outro ferrabrás, o general Umezu, perfilou-se no convés do Missouri durante a cerimônia da rendição.)
Lendo-se “A História Secreta” de Brooks, fica a eterna pergunta: As bombas eram necessárias? Ele não trata disso.
Quem responde é o historiador Max Hastings, no seu livro “Retribution”: “Se a guerra tivesse continuado, mesmo que por poucas semanas, mais gente teria morrido, sobretudo japoneses, do que os mortos de Hiroshima e Nagasaki”.
Sergio Moro acreditou num truque e se deu mal
O ministro Sergio Moro acreditou que o Senado deixou passar a criação do juiz das garantias porque Bolsonaro vetaria o artigo. Acreditou num truque e se deu mal.
Moro não gosta do novo juiz, mas cabe uma pergunta: se existisse um magistrado para garantir os cidadãos, Moro divulgaria o grampo de Dilma Rousseff falando com Lula depois de ele mesmo ter encerrado o prazo para as interceptações?
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