Crise deixa como
lição que empresários precisam se manifestar
Finalmente, as
classes empresariais, os economistas e até líderes do mercado financeiro
acordaram. No fim de semana, duas robustas e corretas manifestações pediram que
o país seja respeitado. Mais de 500 economistas e banqueiros divulgaram uma
longa carta aberta à sociedade pedindo, principalmente, a adoção de medidas
efetivas para conter a pandemia. Em outra manifestação, um grupo de empresários
e executivos lançou uma ofensiva no Congresso, não só pelo auxílio emergencial,
mas também em favor da discussão de outras medidas sociais para socorrer as
empobrecidas famílias brasileiras.
É redundante citar aqui as sugestões feitas pelas classes empresariais, inclusive do setor financeiro. As propostas são, basicamente, aquelas que vemos diariamente na grande imprensa, nas entrevistas desesperadas de médicos, cientistas e familiares de mortos, à medida que avança o número de vítimas fatais da pandemia, que se aproxima de 300 mil pessoas. Em resumo, as propostas combatem o negacionismo e pedem ação urgente do governo.
Tão importante quanto as sugestões feitas nos dois documentos é o fato de que os empresários acordaram para uma realidade: o país pede socorro e não pode continuar nessa marcha insensata, com o chefe de governo não só ignorando a pandemia como também incentivando comportamento suicida de brasileiros desavisados.
É preciso adotar
a sinceridade e admitir que as classes empresariais tiveram importância
fundamental na eleição do atual presidente da República. Não é necessário
lembrar que a sustentação dessa escolha se baseou na ideia de que, para o bem
ou para o mal, qualquer governo seria aceitável, desde que não representasse a
continuidade dos quatro mandatos do PT. Ainda hoje, com todas as terríveis
consequências de mais de dois anos de mandato, o índice de apoio dos
empresários ao atual governo, em todas as pesquisas, segue muito maior que o da
média nacional.
Houve,
certamente, omissão, comportamento que parece estar mudando agora.
Acreditou-se, antes e depois do início do governo eleito em 2018, que uma
política econômica liberal e exclusivamente voltada ao aperto fiscal, deixando
de considerar o impacto dessa política sobre a vida das pessoas que perdem o
emprego, poderia salvar o país. Durante certo período, essa crença se
materializou na reforma da Previdência, que sanearia as contas públicas nos
próximos dez anos e impulsionaria os investimentos e o crescimento. Toda aquela
economia que se imaginou para os dez anos já foi gasta com a pandemia.
Acreditou-se que
o BNDES não era necessário para financiar a empresa brasileira e que, portanto,
poderia ser, aos poucos, desidratado. Praticamente nenhum discurso em defesa do
banco foi feito pelas entidades empresariais. E a palavra desenvolvimento foi
extinta do vocabulário do governo.
Durante muitos
anos, muito antes da administração liberal de hoje, aceitou-se nos meios
empresariais, sem gritos ou sussurros, uma política de juros elevados que
claramente desestimulava os investimentos produtivos e destruía a indústria no
país. Agora, com a maior recessão da história à vista, o Banco Central volta a
elevar juros.
Poucas e honrosas
têm sido as reações contra a calamitosa política ambiental deste governo, que
arruína a reputação brasileira no exterior e expõe o país a sanções
internacionais.
Foram toleradas,
sem reação, políticas que confessadamente se destinavam a punir alguns setores
empresariais. Foram toleradas ações de procuradores em conluio com juízes para
condenar réus, ainda que houvesse o nobre objetivo de combate à corrupção, sem
preocupação com destruição de grupos empresariais. Foi tolerado o estímulo ao
uso de armas de fogo. Foi tolerada a protelação por três anos da investigação
do assassinato de uma vereadora do Rio. Foram tolerados o nepotismo descarado,
a ação nefasta na educação, a tentativa de militarização do ensino e a
exaltação de ditadores e torturadores.
Por fim, e mais
importante, foi tolerada durante um ano inteiro, a negação da ciência e da
importância da pandemia, bem como a completa omissão do Ministério da Saúde na
condução do combate à doença. Não é razoável acreditar que as classes
empresariais estivessem anestesiadas pelo dilema entre salvar vidas e salvar a
economia. Agora, os hospitais estão abarrotados de doentes, morrem quase 3 mil
pessoas por dia e há 12 milhões de pessoas infectadas com o vírus. Não há mais
dúvidas de que a recessão econômica não será superada enquanto a pandemia não
for controlada. E isso, segundo a nota assinada por banqueiros, economistas e
empresários, exige “uma atuação competente do governo federal”, que “utiliza mal
os recursos de que dispõe, inclusive por ignorar ou negligenciar a evidência
científica no desenho das ações para lidar com a pandemia”.
Esse triste
momento do país traz uma lição que não pode ser esquecida: as classes
empresariais precisam se manifestar. Dá tudo errado quando se amedrontam ou se
omitem diante das ações do governo. Gostemos ou não dessas opiniões, elas
precisam ser explicitadas, até para que sejam confrontadas com propostas de
outras representações, como as de trabalhadores, que praticamente sumiram do
mapa depois da reforma trabalhista do governo Michel Temer.
Esta coluna já
lamentou, anos atrás, a falta que nos faz Antônio Ermírio de Moraes, um dos
donos do Grupo Votorantim, morto em agosto de 2014. Enquanto teve forças, ele
foi um barulhento e corajoso representante do chamado “setor produtivo”, com
apoios à direita e à esquerda, de empresários e trabalhadores.
A Segunda Guerra
Mundial é pródiga em lições, e a mais importante delas se refere exatamente a
omissões. É impossível não voltar a lembrar o que Winston Churchill disse em
suas memórias: teria sido muito fácil evitar a tragédia da Segunda Guerra.
Bastava, no fim da Primeira Guerra, manter a derrotada Alemanha desarmada e os
vencedores aliados armados. Com isso, seria possível desfrutar de um longo
período de paz na Europa. Os aliados viram quando Adolf Hitler tornou o serviço
militar obrigatório, foi ampliando seus exércitos e transformou toda a
indústria do país em um arsenal bélico. Viram, mas se omitiram. E deu no que
deu, 60 milhões de mortos.
É hora de identificar e desarmar perdedores.
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