- Folha de S. Paulo
Governo e parte do mercado não se entendem
sobre o custo da lei da privatização
As emendas que a Câmara dos Deputados fez
na medida provisória de privatização da Eletrobras vão provocar um aumento
de custo de uns R$ 41 bilhões na conta de eletricidade, direta ou
indiretamente: 10% a mais nas tarifas para pequenos consumidores e de até 20%
para os grandes.
É o que dizem grandes consumidores de
energia elétrica, grosso modo indústrias, comercializadores, gente do setor de
óleo e gás e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, vários deles juntos
no movimento União pela Energia. Nas contas do Ministério de Minas e
Energia, o impacto somado deve ser quase nenhum, se algum.
Essa diferença de dezenas de bilhões de
reais já é de espantar, mas a controvérsia é maior. Não apenas dados, premissas
e métodos de cálculo são diferentes. Na teoria e na prática, os críticos das
emendas da Câmara, aceitas pelo governo, estão dizendo que a lei da privatização
da Eletrobras embute um plano dirigista para a expansão de parte da
capacidade de geração de eletricidade. Isto é, estipula fontes de energia,
locais de produção e tipo de fornecedor.
A oferta dessa energia não seria determinada (ou totalmente determinada) por mecanismos de competição e critérios gerais de emprego eficiente do capital (para nem mencionar os subsídios implícitos na legislação). A expansão da oferta deveria ser apenas orientada por um planejamento indicativo (que já existe).
A fim de evitar que o Congresso derrube a privatização, o governo defende a versão da lei aprovada pelos deputados. O que a Câmara colocou na medida provisória?
1) Deverá ser comprada energia de
termelétricas a gás a serem instaladas nas regiões Norte, Nordeste e
Centro-Oeste (o Senado talvez ainda estipule estados). A medida implica a
construção de gasodutos bilionários e talvez a importação de gás. A construção
dessas térmicas é lobby velho.
2) Reserva de mercado para PCHs (pequenas
centrais hidrelétricas), privilegiando usinas em certos estados.
3) Prorrogação do Programa de Incentivo às
Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa), programa de subsídios para
fontes de energia como a eólica e a solar, que de fato contribuiu muito para
diversificação da produção de eletricidade.
Há ainda uma discussão enrolada sobre a
distribuição dos ganhos com a privatização da Eletrobras entre pequenos e
grandes consumidores, mas essa querela fica para outro dia.
O Ministério
de Minas e Energia (MME) diz que o pessoal da União pela Energia usa
método errado para calcular um possível aumento de custo (que, se houvesse,
seria diluído ao longo dos anos e não teria tanta carga de impostos).
Compara os possíveis preços da energia a
ser comprada de acordo com as determinações do Congresso com custos atuais
(maiores e derivados de decisões velhuscas, diz a União pela Energia).
Em nota enviada a este jornalista,
integrantes da União pela Energia retrucam ainda que, além de não explicitar
premissas, essa conta está equivocada por não levar em conta o preço da energia
em cenário de expansão competitiva da oferta.
Deputados dizem que a lei leva em conta o
pequeno consumidor e critérios de desenvolvimento regional.
MME e União pela Energia não estão de
acordo sobre nada: dados, premissas, métodos ou concepção geral do mercado de
eletricidade. De resto, a União pela Energia diz que as mudanças
do Congresso abalam planejamento e regulação do setor elétrico, com o
comprometimento do ambiente de investimento do setor.
Há dezenas de bilhões de reais na mesa, há
lobbies políticos e empresariais pesados que não estão explicitados e essa
mudança imensa está sendo discutida em poucas semanas. Governo e Congresso
Nacional governista querem aprovar tudo até dia 22 (ou a medida provisória
caduca). Mas é o caso de parar tudo e rever esse rolo.
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