Valor Econômico
O caminhar do processo eleitoral será
fundamental para o cenário da economia brasileira em 2022
Às vésperas das comemorações do Réveillon,
cabe perguntar o que se espera no Ano Novo no que diz respeito ao desempenho da
economia brasileira. As previsões trazidas pelo Relatório Focus do Banco
Central, infelizmente, não dão margem para muito otimismo. Em sua última
divulgação, a mediana das expectativas para o crescimento do PIB em 2022 estava
apenas em 0,5%, percentual que vem caindo seguidamente nas últimas semanas.
Há várias causas, estruturais e conjunturais, que explicam as previsões pessimistas para o ano que vem. Entre elas se destaca, certamente, o aperto monetário que está sendo praticado pelo Banco Central que elevou a taxa Selic de 2% no início de 2021 para os atuais 9,25%, taxa que deve subir ainda mais em 2022, atingindo 11,5%, segundo o mesmo Relatório Focus.
A propósito, vale lembrar que, há um ano
atrás, os analistas ouvidos na pesquisa Focus do Banco Central vaticinavam que,
em 2021, o PIB cresceria 3,4%, a inflação ficaria em 3,3%, o câmbio em RS$ 5 e
a taxa Selic finalizaria o ano em 3%. Como se viu, os números reais ficaram
distantes das expectativas, principalmente no que diz respeito à inflação e à
taxa Selic.
A recuperação das principais economias
globais no pós-covid tem trazido pressões inflacionárias disseminadas no mundo
inteiro, tendo em vista o descompasso que foi criado entre o rápido crescimento
da demanda e a reação tardia da oferta. Olhando em retrospectiva, parece ter
havido um excesso de estímulos por parte dos bancos centrais em reação à
pandemia, fato que acabou provocando o surto inflacionário ora observado.
Tais pressões também atingiram o Brasil, o
que ajuda a explicar nosso cenário inflacionário. Porém, fatores
idiossincráticos foram os maiores responsáveis pela aceleração dos preços
domésticos. Especialmente se destaca o péssimo desempenho do real, comparado
com as moedas das economias emergentes, que amplificou o efeito da alta externa
do preço das commodities e dos bens intermediários. Ao contrário do que deveria
esperar, desta feita o real não se beneficiou da elevação dos preços das
commodities, em razão da piora das expectativas dos agentes econômicos em
relação ao Brasil.
A questão fiscal segue sendo a grande vilã
quando se trata da avaliação do risco Brasil. Se de um lado o fato de o país
ser um credor líquido em moeda estrangeira afasta o risco de uma crise de
financiamento externo, a elevada dívida pública interna e a dinâmica perversa
do gasto público mantêm presentes o risco da insustentabilidade do endividamento
público que, em algum momento, pode trazer de volta desequilíbrios
macroeconômicos graves, como a hiperinflação.
Tendo em vista esse quadro fiscal
complicado, as iniciativas do Executivo e do Congresso Nacional durante 2021
foram simplesmente desastrosas para as expectativas. Não que o resultado
primário e o comportamento da dívida pública em 2021 sejam objeto de
preocupações, já que estão sendo beneficiados pela recuperação da economia e
pela aceleração da inflação. O problema encontra-se na sinalização para o
futuro trazida pelo afrouxamento do teto de gastos e pela emenda constitucional
oficializando o calote no pagamento dos precatórios para abrir espaço para
aumento de gastos com intuito claramente eleitoreiro. Sem contar outras
iniciativas do Congresso que comprometem as contas públicas em 2022.
Tudo isso, somado às incertezas típicas do
período pré-eleitoral, contribuiu para castigar a moeda brasileira e agravar as
pressões inflacionárias.
Desse modo, o Banco Central não pode ser
responsabilizado pelo esperado desempenho insatisfatório do PIB em 2022, já que
a política monetária tem reagido à aceleração inflacionária observada em 2021 e
que não era esperada no início deste ano. Porém, deve-se admitir que a
dosimetria do aumento dos juros talvez pudesse ter sido diferente, caso o BC
não tivesse tardado em sinalizar o início do processo de normalização
monetária.
Para o próximo ano, diante de um quadro de
juros reais domésticos elevados e de um ambiente de menor liquidez externa, o
resultado deve ser um crescimento praticamente nulo do PIB, não se podendo
mesmo descartar o risco de recessão. Por outro lado, como notícia positiva, a
inflação deve cair, muito embora num ritmo mais lento que o desejável, em razão
do elevado grau de inércia inflacionária ainda persistente no Brasil.
Contudo, como já assinalamos numa coluna
anterior, o caminhar do processo eleitoral será fundamental para o cenário da
economia brasileira em 2022. Na ausência de compromissos dos principais
candidatos com as reformas e a responsabilidade fiscal, o quadro pessimista
previsto pelos analistas pode se materializar e até se mostrar pior do que o
esperado, principalmente caso leve a desvalorizações adicionais da moeda.
*Gustavo Loyola é doutor em Economia pela EPGE/FGV, ex-presidente do Banco Central e sócio-diretor da Tendências Consultoria Integrada, em São Paulo
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