terça-feira, 21 de dezembro de 2021

Gustavo Loyola*: Um ano novo desafiador

Valor Econômico

O caminhar do processo eleitoral será fundamental para o cenário da economia brasileira em 2022

Às vésperas das comemorações do Réveillon, cabe perguntar o que se espera no Ano Novo no que diz respeito ao desempenho da economia brasileira. As previsões trazidas pelo Relatório Focus do Banco Central, infelizmente, não dão margem para muito otimismo. Em sua última divulgação, a mediana das expectativas para o crescimento do PIB em 2022 estava apenas em 0,5%, percentual que vem caindo seguidamente nas últimas semanas.

Há várias causas, estruturais e conjunturais, que explicam as previsões pessimistas para o ano que vem. Entre elas se destaca, certamente, o aperto monetário que está sendo praticado pelo Banco Central que elevou a taxa Selic de 2% no início de 2021 para os atuais 9,25%, taxa que deve subir ainda mais em 2022, atingindo 11,5%, segundo o mesmo Relatório Focus.

A propósito, vale lembrar que, há um ano atrás, os analistas ouvidos na pesquisa Focus do Banco Central vaticinavam que, em 2021, o PIB cresceria 3,4%, a inflação ficaria em 3,3%, o câmbio em RS$ 5 e a taxa Selic finalizaria o ano em 3%. Como se viu, os números reais ficaram distantes das expectativas, principalmente no que diz respeito à inflação e à taxa Selic.

A recuperação das principais economias globais no pós-covid tem trazido pressões inflacionárias disseminadas no mundo inteiro, tendo em vista o descompasso que foi criado entre o rápido crescimento da demanda e a reação tardia da oferta. Olhando em retrospectiva, parece ter havido um excesso de estímulos por parte dos bancos centrais em reação à pandemia, fato que acabou provocando o surto inflacionário ora observado.

Tais pressões também atingiram o Brasil, o que ajuda a explicar nosso cenário inflacionário. Porém, fatores idiossincráticos foram os maiores responsáveis pela aceleração dos preços domésticos. Especialmente se destaca o péssimo desempenho do real, comparado com as moedas das economias emergentes, que amplificou o efeito da alta externa do preço das commodities e dos bens intermediários. Ao contrário do que deveria esperar, desta feita o real não se beneficiou da elevação dos preços das commodities, em razão da piora das expectativas dos agentes econômicos em relação ao Brasil.

A questão fiscal segue sendo a grande vilã quando se trata da avaliação do risco Brasil. Se de um lado o fato de o país ser um credor líquido em moeda estrangeira afasta o risco de uma crise de financiamento externo, a elevada dívida pública interna e a dinâmica perversa do gasto público mantêm presentes o risco da insustentabilidade do endividamento público que, em algum momento, pode trazer de volta desequilíbrios macroeconômicos graves, como a hiperinflação.

Tendo em vista esse quadro fiscal complicado, as iniciativas do Executivo e do Congresso Nacional durante 2021 foram simplesmente desastrosas para as expectativas. Não que o resultado primário e o comportamento da dívida pública em 2021 sejam objeto de preocupações, já que estão sendo beneficiados pela recuperação da economia e pela aceleração da inflação. O problema encontra-se na sinalização para o futuro trazida pelo afrouxamento do teto de gastos e pela emenda constitucional oficializando o calote no pagamento dos precatórios para abrir espaço para aumento de gastos com intuito claramente eleitoreiro. Sem contar outras iniciativas do Congresso que comprometem as contas públicas em 2022.

Tudo isso, somado às incertezas típicas do período pré-eleitoral, contribuiu para castigar a moeda brasileira e agravar as pressões inflacionárias.

Desse modo, o Banco Central não pode ser responsabilizado pelo esperado desempenho insatisfatório do PIB em 2022, já que a política monetária tem reagido à aceleração inflacionária observada em 2021 e que não era esperada no início deste ano. Porém, deve-se admitir que a dosimetria do aumento dos juros talvez pudesse ter sido diferente, caso o BC não tivesse tardado em sinalizar o início do processo de normalização monetária.

Para o próximo ano, diante de um quadro de juros reais domésticos elevados e de um ambiente de menor liquidez externa, o resultado deve ser um crescimento praticamente nulo do PIB, não se podendo mesmo descartar o risco de recessão. Por outro lado, como notícia positiva, a inflação deve cair, muito embora num ritmo mais lento que o desejável, em razão do elevado grau de inércia inflacionária ainda persistente no Brasil.

Contudo, como já assinalamos numa coluna anterior, o caminhar do processo eleitoral será fundamental para o cenário da economia brasileira em 2022. Na ausência de compromissos dos principais candidatos com as reformas e a responsabilidade fiscal, o quadro pessimista previsto pelos analistas pode se materializar e até se mostrar pior do que o esperado, principalmente caso leve a desvalorizações adicionais da moeda.

*Gustavo Loyola é doutor em Economia pela EPGE/FGV, ex-presidente do Banco Central e sócio-diretor da Tendências Consultoria Integrada, em São Paulo

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