sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Alta tensão - Denise Rothenburg

Em reunião dia desses para tratar dos preparativos para o Sete de Setembro, a presidente Dilma Rousseff mostrou-se insatisfeita com o fato de a segurança ter fechado praticamente todo o gramado da Esplanada, impedindo o acesso da população. Segundo relato de alguns atentos interlocutores, ela foi severa e teria ainda usado a expressão %u201Cisso vai dar m%u2026%u201D.

Afinal, ela não esquece o tempo em que os gramados ficavam livres e o seu partido, o PT, bem próximo do povo. Há no ar uma certa nostalgia de 2003, quando o PT estreava no palanque presidencial do desfile que marca o Dia da Independência. Quem acompanhou e se lembra daquela festa %u2014 ou tiver o cuidado de observar as fotos e compará-las com o que está preparado para amanhã %u2014 terá a exata noção do distanciamento do governo da população.

Há 10 anos, 50 mil pessoas tomaram a Esplanada dos Ministérios para confraternizar com o Poder Executivo federal. A Esplanada era um espaço aberto e acolhedor. Crianças brincavam, carregavam bandeiras, prestigiavam aquele presidente simpático e o seu vice bonachão, José Alencar. O evento custou à época R$ 1 milhão. As faixas não deixavam dúvidas: %u201CEsta festa é nossa%u201D. Naquele ano, Lula, Alencar e suas marisas dividiam os palanques com o então ministro da Casa Civil, José Dirceu, o da Fazenda, Antonio Palocci, e, mais à esquerda do presidente, num canto, Dilma Rousseff, então ministra de Minas e Energia, discretíssima. Na mesma situação, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, hoje adversária. Ambas ficavam bem longe do centro do ringue, onde Dirceu e sua então mulher, Maria Rita, eram o destaque, logo atrás de Lula.

Dos políticos do Distrito Federal, Joaquim Roriz era o governador e Cristovam Buarque, ministro da Educação. Hoje, muitos daquela foto estão recolhidos ao obscurantismo, fora da cena deste sábado. Palocci presta consultoria em São Paulo, enquanto Dirceu se prepara para cumprir a sentença final do mensalão. Ontem, por exemplo, assistia ao julgamento pela tevê, no salão de festas do edifício em que mora, em São Paulo, ao lado da mulher, Evanise, do escritor Fernando Morais, da colunista Hildegard Angel e de mais 40 pessoas.

Atualmente, o mensalão parece absorvido pela população em termos eleitorais. Mas os personagens daquela foto mudaram. Muitos não se recuperaram das mazelas que recolheram ao longo do caminho. Palocci, por exemplo, perdeu o cargo lá atrás num mal-explicado caso de quebra de sigilo da conta de um caseiro. Conquistou uma lufada de poder quando coordenou a campanha de Dilma Rousseff à Presidência, mas, antes do primeiro ano de governo, estava fora por conta da compra de um apartamento de luxo em São Paulo. Lula e Dilma são vistos como sobreviventes. O presidente recordista em popularidade e intenções de voto enfrentou denúncias e um câncer. Dilma, guindada ao centro da foto, buscará a reeleição no papel de favorita.

Mas e o PT? Seu futuro é incerto. O partido, no momento, está mergulhado no processo interno de eleição direta, marcado por denúncias de compra de votos e acusações mútuas entre seus filiados. Enquanto isso, os aliados ficam por aí, à deriva, organizando seu jogo nos estados onde os petistas aparecem em sérias dificuldades. Nenhum dos estados comandados pelo PT será de fácil reeleição %u2014 Tarso Genro, no Rio Grande do Sul, que o diga. Para completar o quadro de dificuldades, a cena de hoje com a Esplanada recheada de tapumes só serve para reforçar a imagem de afastamento do povo, algo que preocupa setores do partido.

Amanhã, são esperadas quase 50 mil pessoas, mas não para confraternizar com Dilma. A expectativa é de protesto. O Grito dos Excluídos que, há 10 anos era um detalhe pós-desfile, vai juntar a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) na luta por eleições limpas em 2014 e por mais ética na política. Ingredientes e personagens que só fazem reforçar as cobranças por mais saúde e educação.

Antenada, a presidente Dilma aposta no Mais Médicos para tentar fazer refluir as reivindicações na área da saúde, pelo menos nas cidades do interior do país. O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, cuida de tentar aprovar o Plano Nacional de Educação, para dar o tom do discurso na outra grande área que o eleitor clama por melhorias.

Quanto à política, entretanto, o PT parece mais uma vez disposto a esperar que Lula embale suas campanhas em prol de governadores, senadores e bancadas de deputados federais e estaduais. Ocorre que, com o partido distante do povo e fustigado nas manifestações, talvez Lula não seja suficiente para embalar todos no sonho e na confraternização geral do Sete de Setembro, como ocorreu 10 anos atrás. No momento, os tapumes falam por si. Veremos se eles voltarão em 2014.

Fonte: Correio Braziliense

Nenhum comentário: