- O Globo
Depois de meses acompanhando o julgamento do mensalão, já é de conhecimento público que o crime de corrupção passiva, descrito no artigo 317 do Código Penal, é de mera conduta, sendo consumado com o simples ato de “aceitar promessa” de vantagem, sendo desnecessário o recebimento da propina. Desse ponto de vista, basta o diálogo entre o agora deputado federal petista licenciado André Vargas e o doleiro Alberto Youssef para caracterizar a corrupção.
O doleiro garante que o negócio no Ministério da Saúde, para o qual pede o apoio do deputado, fará a “independência financeira” dos dois. E ainda termina a mensagem de texto com uma gargalhada digital (kkkkk). Vargas não apenas não rejeita a oferta como, em outra mensagem, garante que vai “atuar” para agilizar o processo no ministério a fim de ajudar o “amigo de 20 anos”.
O contrato da Labogen Química Fina e Biotecnologia, que segundo a Polícia Federal é um dos braços do esquema de lavagem de dinheiro do doleiro, com o Ministério da Saúde, no valor de R$ 150 milhões para o fornecimento do princípio ativo do Viagra, foi assinado pelo ministro Alexandre Padilha, outro cardeal do PT, hoje candidato ao governo de São Paulo.
Além disso, haveria um empréstimo do próprio ministério para a empresa de cerca de R$ 30 milhões, que acabou suspenso quando surgiu a investigação que colocou na cadeia os sócios do laboratório, que na verdade era uma empresa de fachada para remessa de dólares para o exterior e contratos fraudulentos como esse.
O ex-provável futuro presidente da Câmara André Vargas agora trata de tentar salvar a própria pele em vez de fazer planos grandiosos que não cabem em seu histórico. Ao pedir afastamento por 60 dias do mandato, ele joga com a possibilidade de esfriar o escândalo nesse período, mas dificilmente isso acontecerá.
A série de telefonemas entre ele e o doleiro está com a Polícia Federal e ele sabe que suas conversas, assim como as do ex-senador Demóstenes Torres com o bicheiro Carlinhos Cachoeira, desnudam sua relação com o doleiro, que já está caracterizada pela Polícia Federal como muito mais que uma simples amizade.
Seu processo acaba de ser enviado para o Supremo Tribunal Federal (STF) para que seja feita uma investigação que só essa instância da Justiça pode fazer com os que têm mandato parlamentar. O mesmo Supremo que Vargas tentou desmoralizar ao erguer os punhos cerrados ao lado do presidente Joaquim Barbosa.
O ex-secretário nacional de Comunicação do PT ainda caiu na besteira de enviar uma mensagem pelo celular dizendo que teve vontade de dar uma cotovelada em Barbosa, que estava a seu lado. Não é à toa que o deputado licenciado, prestes a perder o mandato, sempre esteve na linha de frente pelo “controle social da mídia”.
Todos os seus desvios éticos, desde a carona no jatinho do doleiro, os contratos nebulosos com o Ministério da Saúde que lhe dariam “independência financeira”, até a má educada mensagem sobre Joaquim Barbosa, foram revelados pela imprensa que ele sonha controlar um dia através de “conselhos da sociedade”.
Os partidos oposicionistas PSDB, DEM e PPS, por um lado, e o PSOL pelo outro, apresentaram nesta segunda-feira uma representação no Conselho de Ética da Câmara, e sua licença para cuidar de “assuntos pessoais”, como se seu trabalho de lobista de doleiro não fosse exatamente isso, não terá o condão de interromper as investigações.
Ele pode optar pela renúncia ao mandato para evitar a cassação e se candidatar novamente em outubro. Mas nada disso parará as investigações. O gesto “revolucionário” de erguer o punho em sinal de resistência pode ser repetido mais adiante no mesmo cenário que seus companheiros petistas o fizeram, na entrada do presídio da Papuda, em Brasília.
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