• Ex-presidente da estatal culpou a diretoria administrativa pela negociação de Pasadena
Maria Lima e Andre de Souza – O Globo
BRASÍLIA - Sem a presença da oposição e com apenas quatro senadores da base em plenário, o ex-presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, abriu a fase dos depoimentos na CPI exclusiva do Senado para investigar denúncias contra a Petrobras com tranquilidade, descontração, e até piadinhas. Em menos de uma hora, incluindo a exposição inicial de 20 minutos, ele respondeu as primeiras 76 perguntas feitas pelo relator José Pimentel (PT-CE). No total, Gabrielli respondeu cerca de 200 perguntas em aproximadamente 3h15 de oitiva. Aproveitou para isentar a presidente Dilma Rousseff e a ele próprio de responsabilidades na compra da refinaria de Pasadena, insistir que a compra foi barata e dizer que a Petrobras está falida é uma campanha da oposição para fazer luta política.
O negócio, que ele disse ter sido bom no inicio e depois ficado ruim em 2008 e hoje ser altamente lucrativo, custou aos cofres da Petrobras um prejuízo de U$530 milhões.
Ao contrário de declarações anteriores, de que Dilma precisava assumir sua responsabilidade no negócio de Pasadena, desta vez Gabrielli disse que a então presidente do Conselho de Administração da Petrobras é uma pessoa extremamente competente, com alta sensibilidade para decisões sociais e empresariais, mas se naquela época tivesse externado a posição de agora, sobre o parecer técnico falho, não saberia dizer se os outros integrantes do Conselho a teriam acompanhado.
- Não considero a presidente Dilma responsável pela compra de Pasadena. A responsabilidade é da diretoria administrativa. Essa é a chave do negócio, a decisão foi colegiada - disse Gabrielli, repetindo várias vezes que a responsabilidade não pode ser atribuída a uma pessoa apenas e que ao conselho não competia avaliar os detalhes operacionais do contrato de compra.
Entre amigos e num ambiente favorável - ele se negou a depor na Comissão de Fiscalização e controle da Câmara semana passada - Gabrielli estava descontraído e sorridente. Coube ao senador Aníbal Diniz (PT-AC), fazer levantar a bola para que Gabrielli acusasse a oposição de estar atacando a Petrobras para atender a especuladores. Esse tem sido um discurso recorrente entre os petistas.
- A quem interessa reduzir o valor da Petrobras? - perguntou Diniz.
- Eu diria, primeiro, que os especuladores adoram a oscilação das ações da Petrobras. É um volume enorme, com uma variação extraordinária - respondeu Gabrielli.
Ao ser questionado se tinha recuado em relação à responsabilização da presidente Dilma Rousseff, Gabrielli negou.
- Em nenhum momento. Se vocês analisarem minha entrevista a "O Estado de S. Paulo", vocês verão que minha posição não mudou nada. A presidenta Dilma tem uma posição justa, correta. E a posição do Conselho de Administração em 2006 não pode ser analisada hoje - afirmou o ex-presidente da Petrobras.
Prejuízo com Pasadena
Questionado pelo líder do PT no Senado, Humberto-Costa (PE), Gabrielli reconheceu que Pasadena representou um prejuízo de R$ 530 milhões para a Petrobras. Por outro lado, argumentou que esse não é um prejuízo irreversível e pode ser recuperado ao longo do tempo. Gabrielli também defendeu a administração da Petrobras de 2003 para cá, ano em que o PT chegou à Presidência da República. Segundo ele, até 2002 a empresa estava com a área de desenvolvimento destruída. Informou ainda que os governos petitas triplicaram os investimentos na Petrobras.
- Como se falar que essa empresa é mal gerida, está em crise? Pelo contrário, ela é pujante e vai se tornar maior ainda - afirmou o ex-presidente da Petrobras.
Gabrielli justificou a elevação nos gastos da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, que segundo ele deve entrar em operação no final deste ano. De acordo com o ex-presidente da Petrobras, entre os motivos que levaram ao aumento dos custos estão os investimentos no Porto de Suape e a mudança de tipo de petróleo a ser processado na refinaria.
- Só o Porto de Suape custou US$ 256 milhões à Petrobras para viabilizar a expansão do porto, atendendo a Petrobras e o porto. Foram vários investimentos externos (à refinaria) que aumentaram os custos, mas eram necessários para viabilizar a refinaria. Houve também mudança no escopo da refinaria. Num primeiro momento, processaria petróleo marlim. Depois um trem para processar petróleo marlim e outro trem para o petróleo venezuelano. São elementos que explicam a variação de custos na Rnest (Refinaria do Nordeste, a Abreu e Lima) - disse Gabrielli.
Ele defendeu a nomeação de seu primo José Orlando Azevedo para presidir a Petrobras America entre 2008 e 2012, período da disputa judicial com a Astra Oil que culminou com a aquisição da refinaria de Pasadena. Afastado da posição pela atual presidente da estatal, Maria das Graças Foster, em 2012, Azevedo passou a exercer o cargo de diretor comercial da Transportadora Associada de Gás (TAG), subsidiária da estatal, mas acabou demitido do novo posto em março de 2014. Segundo Gabrielli, seu primo era capacitado para o cargo.
- Eu veto porque é meu primo? Ou nomeio e comunico as autoridades? Essa era minha dúvida.
Quando cheguei à Petrobras, eu era conhecido como o primo do Zé Orlando, que começou lá em 1978.
Cláusula pré-nupcial
Ele chegou a comparar as divergências com a sócia belga Astra Oil, como um divórcio litigioso por incompatibilidade de gênio do casal,mesma comparação feita pelo ex-presidente Lula sobre a compra de Pasadena, na semana passada. Disse que a polêmica cláusula put option foi como uma cláusula pré-nupcial de divórcio, regras de saída para quem tivesse insatisfeito no negócio.
- Houve uma divergência enorme entre nós e os sócios já na lua-de-mel. Aí foi aquele negócio, não dá para ficar mais junto, vamos divorciar, quem vai ficar com os bens?! Foi um negócio litigioso durante todo o ano de 2008. Tivemos muita incompatibilidade de gênio já no primeiro momento - disse Gabrielli, rindo da própria gracinha.
O “pacotaço” de perguntas encaminhado a Gabrielli por escrito pelo relator José Pimentel incomodou o vice-presidente da CPI, senador Antônio Carlos Rodrigues (PR-SP).
- Presidente, questão de ordem! Pelo número de perguntas que o relator fez é humanamente impossível outras pessoas perguntarem. Mas o senhor pode me dizer porque a Astra Oil acionou a Petrobras em 2008? - reclamou Antônio Carlos Rodrigues, dirigindo-se a Gabrielli.
O ex-presidente da Petrobras não se fez de rogado.
- Eu posso chegar em 2008? Ainda estou em 2006 - respondeu, sem atender ao senador paulista.
Em certo momento, mesmo tendo as perguntas de Pimentel por escrito, ele se perdeu.
- Estou em quê pergunta agora? - perguntou ao relator.
- Está na 76 - ajudou Pimentel.
Combinação prévia
O único integrante da oposição indicado por Renan Calheiros disse que se negou a participar da farsa governista na CPI, porque o plano de trabalho e as perguntas foram previamente acertadas com Gabrielli.
- Não vou participar desta farsa. Foi um acerto entre amigos. Eles que façam o que quiserem nesta CPI. Preferimos participar da CPI mista porque lá somos sete vozes, além dos dissidentes da base, e teremos realmente condições de investigar as denúncias contra a Petrobras – disse o senador Cyro Miranda (PSDB-GO)
Integrantes da CPI e o próprio Gabrielli não concordaram com a avaliação de que a sessão tenha sido tão camarada assim com o depoente. O presidente da comissão, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), por exemplo, destacou o número de perguntas feitas a Gabrielli.
- Respondeu 200 perguntas em três horas e 15 minutos, três horas e 20 minutos - disse Vital.
Após a sessão, questionado por jornalistas se a CPI tinha sido chapa branca, Gabrielli respondeu:
- Não. São 200 perguntas.
O relator José Pimentel também destacou o grande número de perguntas feitas. Perguntado se elas tinham sido amigáveis, ele disse:
- A agressividade é típica de uma ditadura. No Estado Democrático de Direito, você formula pergunta, e ao mesmo subsidia com um conjunto de documentos que nós já requeremos; Então a forma de fazer as perguntas na ditadura é uma, no Estado Democrático de Direito é outra.
Negociações
O ex-presidente da Petrobras durante o governo Lula também se eximiu de responsabilidades na compra de Pasadena, embora admita que tenha participado da decisão final.
- Eu não participei das negociações iniciais. Isso não compete ao presidente da Petrobras, mas as diretorias envolvidas, só na fase da decisão final - disse Gabrielli.
No final de sua exposição inicial ele acusou a oposição de usar o caso Pasadena para fazer campanha política e dizer que a Petrobras está falida.
- Uma empresa com esse potencial não pode ser considerada em crise. Isso é campanha da oposição, é luta política – disse, exaltado, encerrando sua exposição.
Em outro momento voltou a defender a compra como um bom negócio e que os negócios de petróleo tem que ser vistos a longo prazo.
- Esta é a realidade, não foi uma compra cara. Foi abaixo dos preços de mercado.
Indagado sobre os mais de 150 aditivos no contrato de Abreu e Lima, dos quais Gabrielli disse não ter tomado conhecimento, o ex-presidente da Petrobras negou que fosse muita coisa para passar despercebida pela diretoria.
-Não é tanto aditivo. Sabe quantos contratos tem a Abreu e Lima? São 260. Não sei quantos aditivos tem por contrato.
Apenas compareceram ao depoimento o presidente da CPI, Vital do Rêgo (PMDB-PB), os senadores Vanessa Graziottin (PcdoB-AM), o líder do PT Humberto Costa (PE), e os senadores Anibal Diniz (PT-AC) e Acyr Gurgacz (PTB-RO). O presidente do PMDB, Valdir Raupp (RO) passou por lá . O governo quer manter a visibilidade da CPI do Senado até que seja instalada a CPI mista, quando deve ser esvaziada.
Depois em mais dois “lotes” de perguntas, o ex-presidente da estatal falou sobre negociações com a Repsol, endividamento da companhia, a construção da refinaria de Abreu Lima, em Pernambuco, e suspeitas de interferência norte-americana no processo de desvalorização da Petrobras.
Nenhum comentário:
Postar um comentário