• Além do mau desempenho de Padilha e Lindbergh, o PT assistiu à sua bancada federal encolher nas urnas
Tatiana Farah – O Globo
SÃO PAULO- O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva queria dois dias de descanso para "recuperar um pouco a garganta" , mas teve de cancelar a folga. Ontem, já estava no instituto que leva seu nome para avaliar o mau desempenho do partido nas urnas. Suas duas apostas pessoais, Alexandre Padilha, em São Paulo, e Lindbergh Farias, no Rio, fracassaram. O cenário do estado de SãoPaulo foi o pior possível: a presidente Dilma Rousseff perdeu em cidades governadas pelo PT e na própria São Bernardo do Campo, dirigida por Luiz Marinho, um dos coordenadores da campanha à reeleição.Até para Marina Silva (PSB) Dilma perdeu em Mauá, governada pelo PT e uma das maiores cidades do ABC Paulista.Perdeu para Aécio Neves (PSDB) em Santo André, comandada pelo petista Carlos Grana, forte aliado de Lula, e nas cidades petistas de Guarulhos, Osasco e São José dos Campos, onde ela e Lula participaram de comícios, carretas e caminhadas.
Na periferia da capital, onde Lula chegou a fazer três atos políticos por dia, o jogo ficou dividido entre Dilma e Aécio, que ganhou em São Miguel Paulista, Ermelino Matarazzo e Campo Limpo. A representação do PT paulista perdeu cinco deputados, fechando as contas em dez cadeiras. No plano nacional, o partido caiu de 88 vagas para 70. As derrotas do PT são históricas em São Paulo, mas Lula, no mês passado, fez questão de destacar em um discurso que ele próprio ganhou no segundo turno contra o tucano José Serra em 2002, quando foi eleito presidente pela primeira vez. Naquela época, era ele quem incorporava o espírito de mudança. Hoje , sua legenda é a da continuidade. Desta vez, no entanto , a votação de Dilma foi ainda menor do que no primeiro turno de 2010, contra o mesmo Serra.
Há pelo menos duas semanas, o ex-presidente tem culpado o próprio partido pela anunciada derrota de Padilha. No ano passado, diante das manifestações de junho, criticou a legenda por ter perdido a ponte com as ruas. Lideranças do partido evitam dizer que seu líder principal tenha perdido prestígio. Outras dizem que faltou empenho do ex-presidente, como no Rio, onde os aliados de Lindbergh dizem que o senador fez sua campanha sozinho, uma vez que o PT e a presidente Dilma não queriam ferir suscetibilidades com os candidatos aliados de outras legendas,como os dois que foram para o segundo turno: Luiz Fernando Pezão (PMDB) e Marcelo Crivella (PRB).
Preferência por enfrentar Aécio
Se Lula faltou no Rio, em São Paulo não há como negar que ele puxou Padilha pela mão e o levou ao interior do estado, à Grande São Paulo e à periferia da capital. Foram caminhadas e comícios em que Lula falava até quase acabar a voz. Em setembro, Dilma passou mais de dez dias em São Paulo. Os dois conciliavam algumas agendas, mas preferiam "atirar" em duas frentes para multiplicar as atividades políticas.— Não faltou empenho de Lula nem força. E isso que falam dos "postes" é uma tentativa de Lula para a renovação do PT na porrada, com os nomes do bolso do colete. Não é uma pirraça, por trás desses "postes" está a tentativa de renovar o partido — diz um interlocutor próximo de Lula, para quem o ex-presidente disse que o melhor adversário de Dilma seria mesmo Aécio Neves:
— Para ele, existia uma zona cinza confundindo o eleitor de Marina e do PT .O que faltou em São Paulo, avaliam as lideranças, foi puxador de voto. Grandes nomes da legenda ficaram fora do jogo, três deles por estarem presos e condenados no caso do mensalão: José Dirceu, que em 2002 teve meio milhão de votos, e João Paulo Cunha, líder do ranking nas duas últimas eleições. José Genoino não pode ser considerado um puxador , mas sempre foi um nome de destaque nas campanhas, com interação nos redutos eleitorais dos outros candidatos e capaz de segurar "no grito " caminhadas e comícios.—Na verdade, não tivemos puxadores desta vez.
Também passamos por um desgaste em relação à cidade de São Paulo , que começou a ser superado há pouco tempo — disse Francisco Rocha, o Rochinha, coordenador da maior tendência interna do PT , a Construindo um Novo Brasil (CNB), da qual Lula faz parte .Rochinha se refere aos baixos índices de aprovação dos eleitores ao prefeito petista Fernando Haddad. Mas a análise vai além: para o dirigente petista, pesa sobre o resultado eleitoral o desgaste sofrido com o mensalão. Mas, para ele, Lula "jamais teve sua imagem abalada". O cientista político Claudio Couto, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), explica que Lula sofre um "desgaste que é natural se o mandato está mais distante e pelo tempo decorrido". Para ele, a missão do ex-presidente é mais difícil que a da eleição passada:
— Em 2010, ele estava indicando a continuidade de seu governo, que era bem avaliado. O governo Dilma tem vida própria, para o bem ou para o mal, fica mais difícil transferir votos. O PT está há muitos anos no governo e sofre um desgaste e, desde junho do ano passado, há uma onda desfavorável ao partido em São Paulo.Para Bruno Speck, professor de Ciência Política da Unicamp, a análise do resultado eleitoral deve considerar que o eleitorado paulista é conservador:— Não creio que seja um sinal de perda de força política. Lula ainda possui uma grande força política. A força do partido migrou, claramente, para o Nordeste.
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