• É difícil reduzir as dores do 'ajuste', mas é possível fazer com que passem mais rápido e com menos caos
- Folha de S. Paulo
Tivemos ontem uma pequena boa notícia. Uma agência que dá notas para o crédito do governo não lhe deu pontos negativos. Melhor. Mas é um copo d'água na seca.
O que seria uma boa chuva? Um "ajuste" rápido. Mas "ajuste" dói, no povo em particular. As dores mal começaram. A reação política "nas ruas" é uma incerteza. Por ora, houve grande manifestações de elite, mas a ira contra o governo é igualmente distribuída pela população. A elite voltará à rua? Vai agregar mais gente? Vai haver outro tipo de protesto? A temperatura da rua, que depende do tamanho da recessão e das expectativas políticas ("confiança") da população, vai influenciar o rearranjo da geleia política (mas não vai determiná-lo, pois a geleia tem sua autonomia), que também dependerá do alcance do descalabro revelado da corrupção.
São ainda incertos o tamanho e o tipo da recessão, que dependerão da qualidade da política econômica e do andar ora muito incerto da carruagem mundial (dólar, juros).
O que se chama de "ajuste" significa, grosso modo, redução de consumo, de governo (ajuste fiscal) e setor privado. A redução do consumo privado implica contenção maior ou menor de salários, por meio de alguma combinação de desvalorização do real e contenção dos salários, o que, por sua vez, depende de algum desemprego (em especial em setores que não produzem bens exportáveis, como serviços). É horrível.
Um "ajuste" funcional significa que certos negócios voltariam a ser tornar rentáveis o bastante (por meio de contenção de custos, de salário), que se torna mais rentável produzir no Brasil outra vez (indústria, turismo), o que pode estimular investimento e emprego de alguma capacidade de produção ociosa.
A redução de gasto público produz alguma recessão. A desvalorização do real produz alguma inflação. Quanto melhor a qualidade da política econômica e/ou maior a recessão, menor a taxa de juros necessária a fim de conter a inflação. Uma desvalorização considerável do real com inflação contida, associada a um corte de gastos públicos rápido e grande seguido em breve de queda de juros, seria a situação ótima do "ajuste".
Nos próximos meses não vai haver "ótimo" nenhum. Por ora, a situação é de piora acelerada. Para haver inflexão, uma despiora, ao menos, muito ajudaria haver expectativas de que inflação em queda contínua nos próximos anos e controle mais sistemático do deficit público, que neste ano será reduzido a machadadas.
O conserto básico seria acelerado com alguma "reforma": o teor das mudanças em parte é motivo de controvérsia econômica e política, mas não é possível deixar o Brasil largado como ficou na década passada.
Além de "reformas", é preciso apagar incêndios gigantes e criar motivos de ânimo mais imediato: dar logo da crise da Petrobras, que se resolve "sozinha" e lentamente, pois a presidente não a entende, e apresentar um grande programa de concessões à iniciativa privada, um em que Dilma 2 demonstrasse que compreendeu intervenções equivocadas de Dilma 1. Um programa que atraísse investimento pesado, desse início à reconstrução da infraestrutura e ajudasse a ressuscitar algum crescimento.
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