- O Globo
“Eu quero dizer a vocês que vou resistir. Vou resistir até o fim”. Dilma, no 1º de Maio, a poucos meses de sua queda
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Qualitativamente, este impeachment é superior ao que derrubou o presidente Fernando Collor. E por diversas razões. A mais relevante: nunca antes neste país discutiu-se tanto, e por tantos meios, e com tamanha liberdade e energia, a deposição de um presidente eleito pelo voto popular. E até aqui, um só cadáver não se produziu por causa disso. Sequer um ferido em estado grave.
Não é pouca coisa.
Collor caiu porque restou provado que se beneficiou de roubo cometido por terceiros – no caso, o tesoureiro de sua campanha presidencial. O impeachment limitou-se ao aspecto moral.
Mesmo assim, se comparado com os protagonistas do mar de lama descoberto pela Lava-Jato, Collor não passou de um trombadinha, desses que atacam mulheres indefesas no meio das ruas.
Procuram-se indícios e provas definitivas de que Dilma roubou ou deixou que roubassem. Ainda não foram encontrados. Mas isso não significa que inexistam.
Dilma sucedeu na chefia da Casa Civil o ex-ministro José Dirceu, apontado, de início, pelo Supremo Tribunal Federal, como chefe da “sofisticada organização criminosa” que tentou se apoderar de parte do aparelho do Estado.
Em seguida, o Supremo derrubou a acusação e Dirceu acabou condenado apenas por corrupção ativa. O país da jabuticaba passou a ser também o país da “sofisticada organização criminosa” sem cabeça.
O escândalo do mensalão não deu lugar ao escândalo do petrolão. Tratou-se de uma coisa só – a cobrança de propinas para financiar campanhas de partidos e enriquecer seus líderes.
Dilma foi chefe da Casa Civil de meados de 2005 a meados de 2010, quando deixou o cargo para disputar a sucessão de Lula. No mesmo período, chefiou o Conselho de Administração da Petrobras.
E apesar disso, teima em dizer que jamais ouviu falar em mensalão, tampouco petrolão. O mensalão foi denunciado um pouco antes de ela chegar à Casa Civil. O petrolão, enquanto já era presidente.
O pedido de impeachment de Dilma não fala em crime de corrupção. Fala apenas em “pedaladas fiscais” – gastos além da conta, sem autorização do Congresso e mediante empréstimos descaracterizados tomados em bancos oficiais.
Mas o reconhecimento de que a corrupção foi uma das marcas do período de Dilma orientou o voto dos deputados e orientará o dos senadores.
Bem como a opção pela mentira pura, descarada, como recurso para se reeleger. Fora a desastrosa gestão econômica responsável, entre outras coisas, por 11 milhões de brasileiros desempregados, e uma recessão por dois anos consecutivos.
Tudo isso vem sendo discutido desde a aceitação, no ano passado, do pedido de impeachment. E assim será até o seu desfecho nos próximos meses.
O que testemunhamos está longe de se parecer remotamente com um país às vésperas de uma ruptura política e social. Não houve golpe. Não há golpe em marcha. Não haverá golpe.
Como não houve golpe quando o PT pediu o impeachment de Sarney, do ministro da Fazenda Dilson Funaro, de Collor, de Itamar Franco e de Fernando Henrique Cardoso (esse, duas vezes).
Uma democracia capaz de resistir a tantos abalos, frustrações e a dois processos de impeachment em 26 anos, não é uma democracia doente, muito menos em estado terminal.
Pelo contrário. É robusta. Imperfeita, é claro, como toda democracia jovem e em construção. Mas que saberá conviver com o inconformismo dos derrotados.
Não há salvação fora da lei.
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