• Mercado reduz para 0,5% previsão de crescimento do PIB de 2017. Governo fecha as contas no vermelho mais uma vez
Recessão, desemprego e endividamento levaram os consumidores a gastar menos este ano. Déficit fiscal da União em novembro foi o pior em 20 anos
Em meio à recessão, ao desemprego e a um elevado endividamento das famílias, os consumidores reduziram as compras e o varejo amargou uma queda de 4,8% neste Natal, segundo levantamento da Boa Vista SCPC. Outra pesquisa, da associação de shoppings centers, que reúne 7,5 mil lojas, constatou recuo de 3% nas vendas. O resultado do comércio reforça a percepção de que a economia vai demorar a sair da recessão. Os analistas do mercado financeiro pioraram sua projeção para o PIB de 2017 e, agora, preveem uma expansão de só 0,5%. Para este ano, a expectativa é de uma retração de 3,49% na economia. Com a crise, a União continua com suas contas no vermelho. Em novembro, o governo central teve déficit primário de R$ 38,4 bilhões, o pior resultado em 20 anos.
Natal sem festa no varejo
• Com crédito caro e desemprego, vendas para festas de fim de ano têm queda de 4,8%
Ronaldo D’Ercole, Ana Paula Ribeiro | O Globo
-SÃO PAULO- As expectativas mais pessimistas dos comerciantes para o Natal acabaram se confirmando. Num cenário de recessão, desemprego e alto endividamento das famílias, levantamentos divulgados ontem confirmam que as vendas na melhor data do ano para o varejo encolheram. Dados do Boa Vista SCPC, que se baseiam nas consultas realizadas em seu banco de dados com abrangência nacional, mostram que as vendas do comércio na semana que antecedeu o dia 25 caíram 4,8% na comparação com o mesmo período do ano passado. Números da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping Centers (Alshop), com base em pesquisa realizada com cerca de 150 shoppings associados, apontam para uma retração de 3% nas vendas deste Natal, que se soma à queda de 2,8% registrada em 2015.
Entre os fatores que contribuíram para o desempenho negativo nas vendas deste Natal, a Alshop lista a maior dificuldade de obtenção de crédito, principalmente para “as camadas sociais de menor poder aquisitivo”, o aumento do desemprego e as elevadas taxas de juros.
SHOPPINGS FECHAM LOJAS NO ANO
No ano, o setor de shopping centers acumula queda nominal (sem considerar a inflação) de 3,2% nas vendas, que somaram R$ 140,5 bilhões. Um exemplo dos efeitos da recessão para o varejo é que, pela primeira vez desde 2004, quando os dados do setor passaram a ser levantados, o número de lojas em shopping centers no país encolheu. De acordo com a Alshop, ao fim deste ano, os centros comerciais terão 121,6 mil pontos de vendas em funcionamento, o que significa uma queda de 12,9% em relação ao ano anterior. O fechamento de lojas chama a atenção num ano em que foram inaugurados 19 novos shopping centers no país.
Os números mostram que o brasileiro abriu mão de antigos sonhos de consumo para dar lugar a presentes de menor valor. Foram adiados os planos de compra de eletrônicos de última geração, por exemplo. Neste Natal, os segmentos de produtos que mais sofreram foram os de tecnologia e comunicação, com queda de 6,5% nas vendas. O segmento de eletrodomésticos registrou recuo de 4,5%, e o de móveis e artigos do lar teve retração de 9%, de acordo com levantamento da Alshop.
Segundo dados do IBGE, as vendas no varejo acumulam queda no ano de 6,7% até outubro. O recuo é mais acentuado nos setores mais atrelados ao crédito. Veículos e autopeças despencam 14,6% no ano, e móveis e eletrodomésticos, 13,6%. Nos dois casos, são segmentos que trabalham com produtos de maior valor agregado, e o crédito acaba sendo uma alavanca importante das vendas. Com desemprego em alta, houve uma queda na demanda por esses itens, e os bancos também ficaram mais restritivos nas concessões temendo um aumento da inadimplência.
Os dados do Boa Vista SPC, que apontam queda de 4,8% nas vendas deste Natal, levam em conta consultas a todos os setores do varejo, inclusive concessionárias de veículos, lojas de móveis e decoração e até material de construção.
Na avaliação de Fabio Pina, assessor econômico da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (FecomércioSP), com o aprofundamento da crise econômica, houve um deslocamento do consumo de bens de maior valor, de lojas tradicionais de rua e em shopping centers, para zonas de comércio mais populares, o que explicaria os indicadores negativos registrados nas pesquisas da Alshop e do Boa Vista SCPC.
— O indicador do Boa Vista SCPC tende a ser pior que a média do varejo porque o levantamento atribui um peso maior às lojas que vendem parcelado, que oferecem mercadorias mais caras. Por isso, o que vai acontecer é que o desempenho do varejo neste mês vai ser negativo pelo terceiro ano seguido, mas mais próximo de 2% — avalia.
EXPECTATIVA DE MELHORA EM 2017
A sondagem da FecomércioSP junto aos setores normalmente mais procurados no Natal — como roupas, calçados e acessórios e eletroeletrônicos de pequeno porte — mostra um resultado mais otimista, com variação positiva de 0,2% nas vendas. Mesmo assim, nos levantamentos realizados pela entidade entre os dias 15 e 19 de dezembro, a expectativa era de alta de 3% nas vendas.
— Nesses segmentos, depois de três anos de recuo já se vê uma estabilidade com viés de alta. A única boa notícia que temos é que haverá um respiro para 2017 — afirma.
Mesmo com algum sinal de alento, o economista alerta que a base para uma recuperação ainda é muito fraca e pode haver nova deterioração no cenário antes da reversão efetiva do quadro.
— Vai demorar de três a quatro anos para voltarmos aos patamares de consumo de 2013 — diz Pina, que vê uma retomada lenta, com um comércio ainda fraco no primeiro semestre e mais aquecido na segunda metade do ano. — Há otimismo com o conceito da política econômica adotada, mas as medidas têm pouco impacto no curto prazo, embora sejam corretas.
Para o presidente da Alshop, Nabil Sahyoun, apesar do ambiente econômico ainda muito ruim, há motivo para otimismo em relação a 2017. Ele atribui boa parte deste ânimo à decisão do governo de permitir o saque de contas inativas do FGTS. O governo estima que a decisão possa injetar cerca de R$ 30 bilhões na economia.
— A melhora do clima político, o fortalecimento econômico e a retomada do crescimento se mostrarão já a partir do primeiro trimestre, repercutindo nas vendas — disse Sahyoun, destacando que, com a liberação, os recurso das contas inativas do FGTS começam a entrar na economia já nos primeiros meses de 2017, o que, junto com a perspectiva de queda dos juros e inflação sob controle, deve injetar novo ânimo à tendência de consumo.
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