Em meio à profunda crise política, econômica e moral que assola o País, o presidente Michel Temer conseguiu construir a maior e mais coesa base política da história recente, conforme revelou o Basômetro, instrumento estatístico do Estado que mede a fidelidade governista de deputados e senadores. E Temer o fez sem recorrer sistematicamente ao desbragado fisiologismo que caracterizou os governos petistas, que transformaram o presidencialismo de coalizão em presidencialismo de cooptação, movido a corrupção.
Com isso, o presidente tem no Congresso uma margem de manobra grande o suficiente para que ele possa dispensar, sem mais demora, os auxiliares cuja presença no gabinete ministerial embaraça o governo, em razão da suspeita de envolvimento com malfeitos revelados pela Operação Lava Jato. Afinal, a governabilidade não depende deles – antes, é fruto da comprovada habilidade política de Temer.
Ao contrário do que faziam Lula da Silva e Dilma Rousseff, que vincularam a sobrevivência de seus governos ao mais grosso toma lá dá cá, concedendo pedaços de poder a desqualificados de diversas colorações políticas, sem qualquer compromisso partidário e muito menos com o eleitor, Temer articulou sua base especialmente em torno do mister de aprovar as medidas necessárias ao saneamento das contas públicas. O comportamento dos parlamentares em votações essenciais indica que quase sempre esse interesse do governo tem sido atendido, de forma homogênea, pelos partidos da base.
O Basômetro informa que, nos sete meses da gestão de Temer até aqui, os deputados votaram conforme a orientação do governo em 88% das votações nominais em plenário. Como comparação, no mesmo período do segundo mandato de Dilma Rousseff o governo obteve apoio médio de 63%.
Os principais partidos da base de Temer, PMDB e PSDB – que têm, respectivamente, a maior e a terceira maior bancada na Câmara –, votam de forma praticamente uniforme. O apoio às medidas apresentadas pelo presidente chega a 97% em ambas as legendas. A oposição firme se restringe a PT, PDT, PCdoB, PSOL e Rede.
Delineiam-se assim mais claramente os campos políticos, o que, em se tratando do cada vez mais fragmentado cenário partidário, é um fenômeno digno de nota. Ao menos nos casos analisados pelo Basômetro, muitas legendas recobraram parcialmente a fisionomia de partidos políticos, deixando de lado o comportamento que os notabilizou nos últimos anos – o de um amontoado caótico de interesses individuais, como se cada parlamentar fosse ele mesmo um partido, com o qual o governo tinha de negociar separadamente.
Assim, o Basômetro demonstrou que a escala de dispersão dos votos dos deputados de um mesmo partido – em que zero significa que todos os parlamentares desse partido votaram da mesma maneira, conforme a orientação da direção partidária – é hoje de apenas 3,9. Durante a crise que resultou no impeachment de Dilma Rousseff, esse índice chegou a 8,3.
A diferença entre Temer e Dilma fica muito clara diante desses números. Enquanto a petista se recusava a dialogar com o Congresso, esperando que o modelo de compra de deputados bastasse, o peemedebista, fiel à sua trajetória de décadas de vida parlamentar, submete o cardápio de políticas públicas do governo à apreciação dos partidos da base. O resultado, com exceção da votação do projeto de renegociação da dívida dos Estados, que contrariou o governo por excluir as contrapartidas exigidas pela equipe econômica das unidades da Federação em situação financeira crítica, tem sido amplamente satisfatório.
É claro que ainda é cedo para dizer se será algo duradouro, e a história costuma ser madrasta, mas os dados apontam para uma situação de relativo conforto para Temer diante dos imensos desafios dos próximos dois anos, especialmente a urgência da aprovação das reformas previdenciária e trabalhista, sem as quais nenhum esforço fiscal e de retomada do crescimento será bem-sucedido.
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