A verborragia de Jair Bolsonaro sobre temas polêmicos ganha eleitores e também os afasta. Com pautas que até mesmo violam princípios básicos da Constituição, os que declaram voto no deputado e os que o rejeitam explicam suas crenças.
Crença no extremo
Quais são as principais ideias que fazem eleitores apoiarem, e também rejeitarem, Bolsonaro
Igor Mello | O Globo
Líder nas pesquisas nos cenários em que o expresidente Luiz Inácio Lula da Silva fica fora da disputa presidencial, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ) tem nas declarações polêmicas e extremadas a principal arma para conquistar seus eleitores. Sua verborragia sobre temas como Segurança Pública, combate à corrupção, defesa dos valores conservadores e combate à esquerda tem conseguido manter uma base eleitoral: homens, jovens, de classe média.
Por outro lado, as declarações que, em muitos casos, confrontam a Constituição, resultam em forte rejeição de um terço do eleitorado e problemas na Justiça, como a denúncia feita anteontem pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, por racismo.
Esses temas aglutinam eleitores com perfis ideológicos e prioridades diferentes. Entram aí os que defendem medidas de força no enfrentamento à violência, resumida pelo bordão “bandido bom é bandido morto”, repetido com frequência por Bolsonaro. Outro grupo é formado por jovens com nível universitário que defendem ideias liberais e valores conservadores. Há os de classe média antipetistas. Religiosos também têm aderido à candidatura de Bolsonaro por sua postura contrária ao casamento homoafetivo, ao aborto e à inclusão de temas relacionados à educação sexual e ao respeito à diversidade nas escolas, rotulado por eles como “ideologia de gênero”.
Diretor do Datafolha, Mauro Paulino afirma que o discurso ligado à Segurança Pública é o principal trunfo de Bolsonaro. O tema, segundo ele, virou a marca do candidato do PSL.
— A segurança é importante para explicar o fenômeno Bolsonaro. Há um nível de medo espalhado pela população especialmente nos grandes centros, mas crescendo também no interior. Isso faz com que as propostas dele sejam vistas como soluções mais compreensíveis por determinado segmento da população — avalia.
Nas ruas, esse efeito é claro. O padeiro Marcio Furlanetto, de 40 anos, representa a influência da violência sobre o eleitorado. Morador de Sinop, no Mato Grosso, e entusiasta dos militares, ele pretende votar em Bolsonaro em função de suas manifestações a favor da pena de morte e contrárias aos direitos humanos — ambas violam cláusulas pétreas da Constituição.
— Os direitos humanos têm que acabar. É a pior coisa que existe hoje, é só direito do bandido. Para mim, é uma cambada de bandidos — afirma Furlanetto, apesar de admitir que nunca teve contato com nenhum defensor dos direitos humanos. — Única coisa que vi foi o Conselho Tutelar. Uns menores roubaram um carro que eu tinha, e o Conselho mandou soltar. Acabei ficando no prejuízo.
Bolsonaro também tem sucesso no eleitorado rural, com propostas que vão desde a distribuição de fuzis para proprietários de terra combaterem o Movimento dos Sem Terra (MST) até a extinção do Ministério do Meio Ambiente, que seria anexado à pasta de Agricultura. O lavrador Francisco Viana, de 56 anos, decidiu aderir ao capitão da reserva depois de ter votado em Lula nas duas vezes em que o petista foi eleito. O morador da zona rural de Altos — cidade de 40 mil habitantes, a 42 quilômetros de Teresina — vem sofrendo com ação de detentos da Colônia Agrícola Major César de Oliveira, de regime semiaberto. Segundo ele, presos saem à noite e roubam pessoas em matas e estradas vicinais.
— Roubam tudo. A violência não é mais uma coisa da cidade — conta. — Vou votar nele porque diz que bandido bom é bandido morto.
Entre os jovens liberais, é comum ouvir o argumento de que o presidenciável tem se aproximado de visões econômicas ortodoxas, apesar de, ao longo de sua carreira política, ter defendido pautas desenvolvimentistas inspiradas na ditadura militar. O deputado votou contra privatizações e o Plano Real. Hoje, tem tentado se aproximar do mercado, embora afirme que não entende de economia. Para o instrutor de metalurgia Wesley Leite, de 33 anos, Bolsonaro, que “não é 100% liberal”, não tem obrigação de dominar o tema.
— Você acredita que o Lula conhece algo de economia? Ele não deve ter nem segundo grau. O presidente não tem que saber de tudo, mas precisa montar uma boa equipe — diz.
REJEIÇÃO TAMBÉM FALA ALTO
Outros dois pontos unem os eleitores bolsonaristas: o combate à esquerda, principalmente ao PT, e a defesa de valores conservadores nos costumes. Embora o deputado tenha que lidar com o desgaste provocado por casos que envolvem a contratação de parentes ou o crescimento do patrimônio no exercício de mandato, a cientista política da USP Camila Rocha diz que ele consegue se afirmar como liderança antissistema num momento em que petistas foram associados à corrupção.
— A Lava-Jato fez o sistema político derreter. Ele conseguiu, mais do que encarnar o antipetismo, ser visto como “o candidato honesto” disposto a romper com esse sistema — analisa.
O militar reformado Olimpio Rodriguez, morador de Niterói, corrobora essa visão:
— Não temos mais condições de ter mais um governo do PT. Eles acabaram com o Brasil.
O professor de artes marciais Luciano Moraes, de 39 anos, diz ser conservador. Morador de Capão da Canoa, no litoral gaúcho, ele apoia Bolsonaro por causa de sua atuação contra a discussão de gênero e sexualidade nas escolas. Evangélico há um ano e meio, nega que Bolsonaro seja preconceituoso. O deputado é réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por apologia ao estupro, além da denúncia de Dodge.
— Mimimi de que não pode falar isso ou aquilo. Não acredito que ele seja preconceituoso — diz o professor de artes marciais.
Se conquistam eleitores, essas declarações também provocam rejeição. Segundo a pesquisa Datafolha de janeiro, 29% dos eleitores não votariam no deputado de jeito algum. Um deles é o técnico industrial Melquizedeque Cordeiro Flor, de 47 anos, de Duque de Caxias:
— Bolsonaro faz declarações racistas, exalta a tortura, a ditadura. Na verdade, é um demagogo.
Já o universitário Georges Haji, de 23 anos, diz que as ideias de Bolsonaro sobre imigração são o maior motivo para rejeitá-lo. Em setembro de 2015, o deputado disse que imigrantes que estavam chegando ao Brasil eram “a escória do mundo”, citando sírios, iranianos, haitianos e senegaleses. Filho e neto de imigrantes palestinos, ele critica a posição do pré-candidato:
— Meu pai foi refugiado e hoje é um empresário, que gera emprego e paga impostos. O que ele propõe é um absurdo. (Colaborou Efrém Ribeiro)
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