- O Globo
Agro teve ano bom e bancos privados estão fornecendo crédito rural, mas exportadores têm medo de barreiras ao comércio por razões ambientais
O economista José Roberto Mendonça de Barros acha que a economia está mudando para melhor em certos pontos, mas ainda prevê um crescimento baixo do PIB no ano que vem. Ele ressalta algumas boas notícias: a safra foi muito boa, mantendo o agro como setor que sempre tem sucesso apesar das crises, o mercado de crédito começa a mudar pela queda forte da Selic. O maior temor dos grandes produtores agrícolas, contudo, é o de sofreram boicote por razões ambientais.
José Roberto é o tipo de analista que nota as mudanças da economia em pequenos detalhes do cotidiano. Nos últimos dias, foi pagar um táxi com uma nota de R$ 50 e o motorista avisou que preferia receber na sua maquininha que ele estava estreando naquele dia. Depois, conversou com o dono de uma pequena rede de supermercados do interior de São Paulo, e ele disse que o operador das máquinas de cartão de crédito reduziu a taxa de uso de 4% para 1,5% e estava quitando os valores em D+2. Antes era em 30 dias:
— O motorista faz parte da onda de popularização das maquininhas depois que o setor deixou de ser um duopólio e passou a ter a competição dos vários fornecedores desse serviço, e o dono do supermercado teve um aumento forte de capital de giro, já que 45% do que ele vende é através de cartão.
A mais notável mudança para ele, que acompanha o que acontece com o setor agropecuário há muitas décadas, é que o crédito rural agora está sendo ofertado por bancos privados:
— Pelas novas regulações do Banco Central, pela queda da Selic, pela entrada das fintechs, o fato é que os três maiores bancos privados estão correndo junto com o Banco do Brasil para ofertar financiamento. Assim, o crédito público fica para os pequenos produtores e para bancar uma parte do seguro agrícola. A queda da Selic tem tirado muito investidor dos fundos DI. Isso abriu espaço para os papéis dos certificados imobiliários e agrícolas. Surgiu uma fonte de crédito abundante com taxas menores que as do plano Safra.
Na safra deste ano, a soja teve alguma queda de produção, mas, com o desempenho brilhante da safrinha de milho, o país está produzindo quase 100 milhões de toneladas de milho. O açúcar caiu de preço pelo excesso de subsídio da Índia, mas o etanol teve alta produção e a demanda está crescente. A laranja teve aumento forte de produtividade e ocupou parte do espaço da produção da Flórida. O café permanece com preço estagnado, a carne está com boa demanda e bons preços. O algodão bateu recorde. Arroz e feijão continuam em declínio porque estão cada vez menos presentes na mesa do brasileiro.
Perguntei ao economista se há preocupação no setor agrícola de que ocorram pressões contra as nossas exportações por questões ambientais:
—Há muito medo. Todo o setor processador industrial, que tem mais contato com os clientes no exterior, está com medo. Entre os produtores agrícolas, uma grande parte também teme as barreiras aos produtos brasileiros.
Ele acredita que o risco de boicote vem do discurso do governo, “muito óbvio”, contra as medidas de proteção ambiental e que fazem na base se ter a impressão de um “liberou geral”. Como os dados mostram que 90% do desmatamento é ilegal, o economista acha que o mais inteligente seria combater os que estão fora da lei, em vez de dar sinais que parecem estímulos ao desmatamento e às invasões:
— Fiz uma palestra recente para 40 produtores estrangeiros que vieram fazer uma imersão no Brasil. Acabei minha apresentação sobre por que a agricultura brasileira é um sucesso e as duas primeiras perguntas foram sobre Amazônia.
Apesar da aprovação da reforma da Previdência, ele disse que a economia continuará “andando a passo de tartaruga”, porque outras reformas são necessárias:
— É preciso fazer a segunda parte do esforço fiscal, atacando pontos como o excesso de vinculação do Orçamento. É preciso também fazer mais concessões porque elas, mais do que a privatização, trazem melhoras a curto prazo. Se houver boa regulação e mais leilões, as concessões vão gerar obras de infraestrutura. E a construção civil é geradora de emprego.
José Roberto acha que se isso for feito o país pode crescer mais fortemente, mas há dois riscos à frente: o quadro internacional muito perigoso e as crises políticas internas criadas pelo próprio governo.
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