- Folha de S. Paulo
Presidente da corte sabe a importância do diálogo
Nesta quarta-feira (23), o ministro Dias Toffoli completou dez anos no Supremo Tribunal Federal.
Afirmou, em sua sabatina no Senado Federal, ter um único compromisso: a Constituição da República. Tem a história como fundamento de sua conduta. É um grande conciliador.
Em 2015, o STF definiu a natureza jurídica da colaboração premiada. O tribunal, por maioria, acompanhou a sua orientação.
Como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro Toffoli conduziu com firmeza as acirradas eleições gerais de 2014.
Assumiu a presidência do Supremo em um momento difícil da história política do país. Enfrenta a alta exposição da corte, as divergências pessoais internas e a polarização extrema da sociedade.
Agora, o STF discute a prisão em segundo grau. O tema divide e apaixona. Fulaniza-se a controvérsia.
A solução será aquela fixada por sua maioria. Não pode adotar solução por conta de pressões de qualquer natureza. Em tudo, o ministro Toffoli age com prudência, autocontenção e respeito aos demais Poderes e colegas. Assume o diálogo com todos.
Sabe que interlocutor não se escolhe: é aquele que está aí. Não abre mão da defesa da Constituição Federal e do tribunal.
A Suprema Corte tem enfrentado questões próprias da seara política. Não por vontade própria. A iniciativa é dos demais Poderes, de partidos políticos ou de representações da sociedade.
Hoje, a radicalização e o ódio invadiram a política. O diálogo tolerante, forma de solver divergências, foi substituído pelo surdo monólogo do grito. Adversário é visto como inimigo. Na verdade, ataca-se para ser visto e ter espaço na mídia.
O conflito agudo e verborrágico passou a ser condição de notoriedade. O processo político perdeu a capacidade de solver suas divergências.
As divergências políticas são levadas ao tribunal. Provocado, o Supremo tem que decidir.
Mas os juízos de conveniência e de oportunidade —próprios da política— não se confundem com os juízos de legalidade e de constitucionalidade —próprios da jurisdição. Esta é a tensão existente e a disfuncionalidade.
Cobrar do Supremo que paute suas decisões em paradigma diverso da Constituição é um equívoco e um atentado ao Estado de Direito.
O STF não deve se curvar a ninguém. O STF não deve ter e não tem bandeira política. O STF aplica e defende a Constituição da República. Esse é o compromisso do tribunal.
O Judiciário trata do passado, de fatos que ocorreram. Não se constrói futuro com sentenças.
O ministro Toffoli sabe que o Judiciário julga o passado. Sabe que o Executivo cuida do presente, com a gestão das políticas públicas, e o Legislativo cuida do futuro, com a formulação das leis.
O tratamento jurídico dos fatos, no Estado democrático de Direito, é o resultado do embate das correntes políticas no Parlamento.
É na política que se encontra a vontade popular. Com todas as suas divergências, contradições e anomias.
O ministro Toffoli identifica, com nitidez, as funções constitucionais dos Poderes e os espaços de cada um.
É errado atribuir-se ao tribunal o poder de substituir o Legislativo sob o argumento de expandir a Constituição. Isso nada mais é do que retórica para justificar a usurpação.
Cada um em seu lugar. Cada qual com a sua função. Com diálogo permanente e harmonia. Todos comprometidos com o desenvolvimento do país. É isso que a República espera. Quem não faz seu papel na história não é nem bom nem mau. Pior —é inútil.
Nesses dez anos, o ministro Toffoli soube construir soluções e pontes. Tem ele claro que a democracia produz consensos com a administração política dos dissensos. É disso que o Brasil precisa.
Lembrem-se do jurista norte-americano Cass Sunstein: “Há risco quando é possível identificar os resultados e atribuir probabilidades a cada um deles. Há incerteza quando é possível identificar os resultados, porém não as probabilidades de ocorrências de tais resultados”.
Onde estamos hoje?
*Nelson Jobim, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (2004-06), ex-ministro da Defesa (2007-11; governos Lula e Dilma) e ex-ministro da Justiça (1995-97; governo FHC)
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