Mandatos
para direção do banco em si não impedem mudanças na política econômica
O
que muda com o projeto
de “autonomia” do Banco Central? Quase nada. Qual a novidade, afora a
extinção de uns artigos caducos das confusas leis do sistema financeiro?
O presidente
e oito diretores do Banco Central terão mandatos fixos de quatro anos.
Por
dois anos, um presidente da República eleito para um primeiro mandato terá um
presidente do BC nomeado pelo seu antecessor. No terceiro ano de mandato,
poderá nomear um presidente do BC “seu”.
No
primeiro ano de mandato, poderá também nomear dois diretores; no segundo, mais
dois, e assim por diante. No início do terceiro ano, terá nomeado a maioria da
diretoria do BC (7 a 2). Se reeleito, terá “maioria” por seis anos.
Não
muda mais nada. O BC será “independente”? Não. O BC não poderá definir a
política monetária (como vai lidar com a flutuação de preços, quais
instrumentos vai utilizar e em qual medida etc.).
Diz
o projeto de lei: “Art. 2º: As metas de política monetária serão estabelecidas
pelo Conselho Monetário Nacional, competindo privativamente ao Banco Central
conduzir a política monetária necessária para cumprimento das metas
estabelecidas”.
O
CMN (Conselho Monetário Nacional) ora é composto pelo ministro da Economia,
pelo secretário da Fazenda (nomeado pelo ministro) e pelo presidente do BC.
Logo, o governo pode decidir a política monetária ou outras correlatas, por meio do CMN ou de projetos de leis. Basta ter força política e capacidade de lidar com as consequências práticas na economia e na finança. O BC terá independência para definir suas metas (metas de inflação, no regime atual)? Não. Depende do CMN.
Uma
diretoria do BC poderá lidar de modo mais ou menos conservador com as metas da
política monetária? Sim, como agora. Exemplo. A meta de inflação para este 2021
é de 3,75%, com margem de tolerância: mínima de 2,25%, máxima de 5,25%,
distância grande.
Por
cautela ou ideia própria sobre o nível de inflação adequado, pode ser que uma
diretoria mire o nível inferior (2,25%) embora não seja lá fácil acertar esse
alvo, seja difícil fazer com que uma diretoria inteira concorde com esse
conservadorismo e, enfim, o BC só consiga mesmo influenciar a inflação do ano
seguinte (2022). Um presidente da República pode não gostar disso.
Vai
fazer grande diferença para a economia, em prazo além do curto (um, dois
anos?). Hum. O governo poderá demitir os dirigentes do BC “quando apresentarem
comprovado e recorrente desempenho insuficiente para o alcance dos objetivos”,
caso tenha autorização da maioria do Senado.
Ficou
institucionalmente mais difícil demitir a direção do BC. Antes, já era difícil
na prática. A ideia de que o governo queira trocar diretores para implementar
uma política doida, inepta ou de outro modo inviável provocaria um salseiro nas
taxas de juro e de câmbio (para começar).
Isto
é, um governo não é independente dos seus credores e dos donos do dinheiro
grosso em geral, ainda menos em um governo mui endividado de um país
avacalhado. As questões relevantes ainda são:
a
disputa intelectual e de poder pelas diretrizes de política econômica;
a
conjuntura econômica, aqui e alhures. Se um governo quiser fazer uma
reviravolta na política econômica, será preciso que tenha capacidade política e
técnica enorme. Essa nova “autonomia” do BC será o menor dos seus problemas, se
tanto.
A
lei deveria, sim, incentivar mais responsabilidade dos dirigentes do BC e
torná-los mais independentes de “o mercado”. Para ficar apenas em um exemplo,
conviria que as reuniões do BC fossem gravadas, para divulgação em um par de
anos mais tarde.
O registro obrigaria o diretor a pensar três vezes no que propõe, criando no mínimo um risco de reputação (ou coisa mais séria). Convém dar mais poderes ao BC, como se pretende fazer no caso da legislação cambial? Essa é uma questão grave. Não é o caso dessa “autonomia” votada agora.
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