ACM
Neto, presidente nacional do partido, quer manter portas abertas com o Palácio
do Planalto
João Pedro
Pitombo / Folha de S. Paulo
SALVADOR
- O
movimento do DEM em direção ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que
implodiu a sigla internamente com rusgas públicas entre seus principais
caciques, tem como pano de fundo os planos do partido para reeleger sua bancada
e disputar governos estaduais em 2022.
A
aproximação foi consolidada na última semana com o apoio de parcela
expressiva dos deputados do partido à candidatura do deputado federal
Arthur Lira, do PP de Alagoas, para presidência da Câmara dos Deputados,
candidato também apoiado por Bolsonaro.
Lira
acabou vencendo a disputa com larga margem de votos, em uma derrota do então
presidente da Câmara, deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ), que apoiou Baleia
Rossi (MDB-SP).
Ao
se aproximar de Lira e Bolsonaro, o DEM buscou evitar
uma postura de confronto e não fechar as portas na relação com o
governo federal, quando falta ainda pouco menos de dois anos para as eleições.
O
DEM atualmente governa os estados de Goiás, Mato Grosso e Tocantins e comanda
prefeituras como as de Salvador, Rio de Janeiro, Curitiba e Florianópolis.
Os
governadores Ronaldo
Caiado, de Goiás, e Mauro Mendes, de Mato Grosso, serão candidatos à
reeleição em 2022. Os dois governam estados de perfil conservador, para o qual
não seria conveniente uma postura de oposição frontal ao presidente Bolsonaro.
Na
Bahia, o presidente nacional do partido e ex-prefeito de Salvador, ACM Neto,
deve ser candidato ao governo do estado em 2022 e tem como virtual adversário o
senador Jaques Wagner (PT).
A
história recente das eleições na Bahia joga a favor de uma possível aproximação
com o governo federal. Desde a redemocratização, nenhum governador ou senador
eleito pelo estado era de oposição ao presidente da República eleito no pleito
anterior.
Entre
1990 e 2002, os governadores ACM, Paulo Souto e César Borges, todos eleitos
pelo então PFL, tiveram o apoio do presidente em exercício. O mesmo aconteceu
com Jaques Wagner em 2006 e 2010 e Rui Costa em 2014.
Para
2022, contudo, a leitura de aliados de ACM Neto é que um alinhamento com o
presidente representaria um revés
para a candidatura do ex-prefeito de Salvador.
Isso
porque Bolsonaro tem uma avaliação negativa na Bahia, principalmente na
capital. Pesquisas realizadas pelo Ibope em 2020 indicam que, de todas as
capitais brasileiras, Salvador é onde o presidente tem pior avaliação.
Além
disso, uma adesão ao governo Bolsonaro implodiria pontes com setores da
centro-esquerda que ACM Neto construiu localmente nos últimos anos. Além de
legendas como PV e Cidadania, o DEM da Bahia também atraiu o PDT de Ciro Gomes
para o seu arco de alianças na eleição de 2020.
A
tendência é que o DEM permaneça com um discurso
dúbio em relação a Bolsonaro, como tem indicado ACM Neto em suas
entrevistas e declarações públicas mais recentes.
De
um lado, ele afirma que o DEM tem uma posição de independência ao governo
federal. De outro, coloca o presidente como um possível aliado do partido na
eleição do 2022.
Procurado
pela Folha, ACM Neto afirma que a eleição para a presidência da Câmara dos
Deputados não mudou a posição do seu partido, que é de independência em
relação ao governo Bolsonaro.
“É
uma posição que nos dá condições de apoiar agendas que consideramos importantes
para o país, mas nos dá liberdade para criticar e apontar erros do governo
sempre que necessário”, afirma.
Mesmo
com a posição de independência, a maioria dos deputados do DEM costuma votar
com o governo e parte deles tem apadrinhados ocupando cargos na máquina
federal.
Isso
inclui até mesmo aliados próximos de ACM Neto na Bahia, caso dos deputados federais
Elmar Nascimento (DEM) e João Roma (Republicanos).
Este
último foi chefe de gabinete do ACM Neto de 2013 a 2018 e foi eleito deputado
com o apoio ostensivo do então prefeito de Salvador. Agora, é cotado para assumir
um ministério no governo Bolsonaro, posição que colocaria em xeque a
posição de independência de seu padrinho político.
Ao
decidir não ir para a oposição, o DEM também busca estreitar seus laços com
siglas da base de Bolsonaro como PP, Republicanos, PSD e PL, considerados
importantes para o partido em suas costuras regionais.
Na
Bahia, DEM já tem o apoio do Republicanos e, na eleição de 2020, trouxe o PL
para sua base aliada em Salvador. PP e PSD são os dois maiores partidos da base
do governador Rui Costa (PT), mas a aproximação dos partidos com Bolsonaro no
campo federal tende a deixar fissuras.
O cientista político Paulo Fábio Dantas Neto, professor da UFBA (Universidade Federal da Bahia), afirma que a aproximação do DEM com Bolsonaro não necessariamente refletirá em uma aliança em 2022, mas faz parte de um cálculo político do partido.
“A
máquina federal tem um peso muito forte. O DEM está buscando se aproximar
daqueles que gerenciam as decisões governamentais e dos partidos que são base
do governo”, avalia.
Dantas
Neto explica que, como presidente nacional do DEM, o ex-prefeito de Salvador
buscou evitar um movimento brusco para oposição, o que o poderia torná-lo uma
espécie de comandante
sem tropa, já que a maior parte da bancada está alinhada ao governo.
A
decisão de ACM Neto, por outro lado, acabou por implodir a relação com Maia.
Nesta segunda-feira (8), o embate entre ambos a subiu mais uma vez de patamar,
com críticas mútuas.
Em
entrevista ao jornal Valor Econômico, Maia disse que o DEM se alinhou à extrema
direita e classificou ACM Neto como "um amigo de 20 anos" que o
traiu. "Ele entregou a nossa cabeça numa bandeja para o Palácio do
Planalto."
Em
nota, ACM Neto disse que não
houve traição a Maia, nem adesão do partido ao governo Bolsonaro: “O
Democratas é um partido que não tem dono, não somos um cartório. Como
presidente, e sem ter um mandato parlamentar neste momento, não posso ser maior
que o conjunto da bancada”, afirmou.
No domingo (7), João Doria (PSDB), governador de São Paulo, recebeu o ex-presidente da Câmara e o seu vice-governador, Rodrigo Garcia, que também é do DEM. Ambos foram convidados para integrar o PSDB, algo que o tucano confirmou em entrevista coletiva na tarde desta segunda-feira (9).
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