Com
a experiência de seus 36 anos no Itamaraty e outros 9 na ONU, o embaixador
Rubens Ricupero vê, na reunião da Cúpula dos Líderes sobre o Clima, uma chance
de alterar a imagem negativa do País, criada pelo impacto do desmatamento ilegal
na Amazônia e de queimadas no Pantanal.
A seu ver, “se o presidente tivesse o mínimo de bom senso, seria uma oportunidade de ouro para o País melhorar suas contribuições ao combate do aquecimento global. Mas ele adverte que isso “é difícil”. O Brasil “tem que dizer que precisa de dinheiro mas não colocando como uma chantagem”. Assim, poderia receber em troca a boa vontade dos Estados Unidos em relação à doação de vacinas excedentes ao Brasil contra covid-19, acredita Ricupero. O presidente Jair Bolsonaro está entre os 40 chefes de Estado convidados para o evento virtual nos dias 22 e 23.
Ricupero
inaugura em maio curso da história da Diplomacia Brasileira no Centro
Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) sobre a política externa
brasileira do Império até os dias de hoje. “Se o Ernesto Araújo fosse chanceler
ainda, eu não teria ânimo para falar de uma tradição que foi degradada. Ele
deixou uma terra arrasada, agora precisa plantar, adubar, regar, fazer um
esforço de reconstrução”, diz o ex-ministro da Fazenda.
Qual
o balanço, a seu ver, da gestão de Ernesto Araújo?
É completamente negativo. No caso da pandemia da covid-19, ao invés de reconhecer que é um grande problema e colaborar com a Organização Mundial de Saúde, sua atitude desde o início foi de negá-la. Eles só entraram no consórcio Covax Facility porque a nossa embaixadora lá em Genebra os convenceu; mas, no final, o Brasil ficou com a cota menor.
Carlos
Alberto França, o novo ministro das Relações Exteriores, pode mudar essa
trajetória?
Se
depender dele e da máquina do Itamaraty, sim. Mas se depender do presidente, do
filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, aí eu duvido. O primeiro teste do
França é na reunião de cúpula do clima quando Biden pedirá que cada país
melhore a proposta que tinha feito no Acordo de Paris, de 2015. Se o presidente
tivesse o mínimo de bom senso, seria uma chance de ouro para o País melhorar
suas contribuições no combate ao aquecimento global. E isso explicando que é
difícil, que precisa de dinheiro, mas não colocando como uma chantagem. Agora,
se o ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles não fizer isso, o França não pode
fazer porque não é a pasta dele. A cúpula do clima terá países que têm maior
responsabilidade nas emissões. O Brasil é o sexto maior gerador de gases do
efeito estufa. Com uma característica, os gases vêm do desmatamento e do uso da
terra, da pecuária extensiva. Nos outros países eles se devem ao carvão para
gerar energia.
Como
vê os sinais iniciais do ministro França?
Ele
provou que é capaz de fazer coisas boas porque tanto nos discursos de posse
como na mensagem que enviou aos funcionários toca em todas as teclas corretas e
não fala naquilo que não deve falar.
ONGs
dizem que há negociação secreta do Brasil com o governo Biden, sobre temas
ambientais.
A
falta de transparência do que está se discutindo preocupa. Agora, o que
preocupa mais é a falta de credibilidade do interlocutor do nosso lado, Ricardo
Salles. O Fundo Amazônia tem, parados no BNDES, quase R$ 3 bilhões – por causa
de um problema criado por ele, que discordou da governança do fundo. As doações
vêm da Noruega principalmente e da Alemanha.
Bolsonaro
enviou carta a Biden prometendo zerar o desmatamento ilegal até 2030.
A
carta de Bolsonaro diz tudo o que Biden gostaria de ouvir, só que é o contrário
do que o governo crê e pratica.
Biden
esquecerá da demora de Bolsonaro em cumprimentá-lo quando venceu a eleição?
Eles são realistas. Sabem que terão que lidar com Bolsonaro e com seu governo até o final de 2022. Eu não acredito que os americanos vão adotar qualquer ação negativa mas também não vão fazer esforço para ajudar. O Brasil tem apelado por vacinas e os EUA adotado atitude evasiva. Eles já doaram vacinas ao México e ao Canadá mas ao Brasil não.
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