Tratores
são, como o nome indica, veículos de tração, responsáveis por movimentar cargas
muito pesadas, de difícil deslocamento. Haja trator superfaturado para empurrar
Jair Bolsonaro até o fim do mandato com tanto escândalo, tanto fracasso e tanta
incompetência.
O
escândalo do tratoraço, revelado pelo “Estadão”, que começou a puxar o fio da
meada de um mecanismo novo de apropriação do Orçamento da União por pequenos
grupos para dar sustentação a um governo insustentável, é a chave para ajudar a
responder, juntamente com o fanatismo de um setor da sociedade, à pergunta de
um milhão de dólares: por que Bolsonaro não cai?
O
ministro Luiz Eduardo Ramos costuma se gabar de que, depois de sua passagem
pela Secretaria de Governo da Presidência, a máxima segundo a qual não havia
articulação política no Planalto foi derrubada.
Agora
se sabe com que expedientes.
Uma engenhosa urdidura permitiu que o Centrão caísse no colo do presidente, e lá vai permanecer enquanto houver trator para arrancar. A base desse arranjo foi a criação de um tipo de superemenda (a RP9, domínio do relator do Orçamento), usada como uma conta-mãe de que parlamentares aliados sacam nacos para suas bases à custa de fidelidade nas votações e mediante ofícios por baixo dos panos.
Esse
tipo de emenda chegou a ser vetado por Bolsonaro, aconselhado à época, em 2019,
por aqueles que viam no expediente o que ele é: uma burla à fiscalização da
aplicação das verbas orçamentárias pelos órgãos de controle e uma forma de
injetar dinheiro público mais rápido e sem restrições nas bases de deputados e
senadores leais.
O
que se seguiu foi um roteiro sórdido, em que o Congresso não derrubou o veto,
não aprovou um projeto, o PLN4, que o regularizaria de novo, mas passou a usar
a superemenda a rodo.
O
fio puxado pelo tratoraço deve revelar outros “aços” em pastas espalhadas pela
Esplanada e suas estatais e autarquias, igualmente aparelhadas e desviadas de
sua finalidade, como a Codevasf, a meca do tratorista Rogério Marinho.
Não
foi à toa o silêncio de Paulo Guedes quando questionado por quatro horas a
respeito do tema nesta terça-feira na Câmara: além de ser um esquema com todas
as digitais de seu desafeto no Ministério, o tratoraço é tudo aquilo que o
ministro da Economia, em sua ilusão de que ser liberal bastaria, achou que
Bolsonaro enterraria na relação entre dinheiro público e política. Não só não
enterrou, como aperfeiçoou.
Hoje
a Codevasf virou uma estatal anabolizada, outra antítese da cantilena liberal
com que Bolsonaro ludibriou o Posto Ipiranga e boa parcela do eleitorado.
O
Centrão, que não se ilude com ninguém e só apoia quem lhe dá algo em troca,
esperou calmamente a diatribe de “não preciso da velha política” do capitão
passar e agora vive a febre do maquinário agrícola sem medo de ser feliz.
O
que pode estragar a festa dos tratoreiros? Uma investigação mais a fundo do
esquema, que comprove: 1) que o Orçamento secreto é uma forma de burlar a
execução orçamentária; 2) desvio de finalidade de empresas públicas, como a
Codevasf; 3) corrupção explícita, desvio de recursos na ponta do que é enviado
via RP9 para as bases dos parlamentares; 4) favorecimento a empresas ligadas
aos políticos na compra de serviços e maquinários.
Tudo
isso está quicando, pronto para ser descoberto. O Tribunal de Contas da União
já tem uma investigação aberta sobre irregularidades na Codevasf (quem se
lembra dos Correios como piloto do mensalão, ou da Petrobras do petrolão?).
Cabe à imprensa vasculhar os ofícios em todas as pastas e rastrear os recursos
enviados pelo Orçamento secreto a estados e municípios. Quando esse edifício
começar a ruir, os que subiram na boleia dos tratores serão os primeiros a descer,
e a blindagem de Bolsonaro começará a ceder.
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