quarta-feira, 12 de maio de 2021

Nilson Teixeira - Crescimento sujeito a várias incertezas

- Valor Econômico

Não é possível ter convicção sobre a previsão de crescimento do PIB em 2021 diante de incertezas em muitas frentes

Os dados recentes sugerem números mais favoráveis para o PIB do 1º trimestre - nossa projeção de crescimento é de 0,2% ante o 4º trimestre. O aprofundamento da pandemia em março, com a decretação pelos Estados e municípios de medidas mais restritivas ao funcionamento de alguns segmentos, notadamente no setor de serviços, teve impacto no mês menor do que o antecipado.

Essa dinâmica em março ocorreu tanto do lado da produção como do consumo. A produção industrial, por exemplo, cresceu 10,3% frente a fevereiro e contraiu 2,4% frente a março de 2020, um resultado melhor do que o previsto. Do mesmo modo, as vendas no varejo de março surpreenderam positivamente, com alta de 10,1% frente ao mesmo mês do ano anterior e retração de apenas 0,6% ante fevereiro.

A incerteza sobre o comportamento do PIB advém de várias frentes, algumas com efeitos positivos e outras negativos. Do lado favorável, a forte e contínua alta dos preços das commodities agrícolas e metálicas indica que o superávit comercial pode ser maior, não apenas por conta dos preços altos, mas também de maiores quantidades exportadas.

No caso da agropecuária, com participação de 5,9% no PIB, o aumento das projeções de exportações dependerá da expansão das áreas plantadas e dos investimentos para elevação da produtividade. Nesse ambiente, a produção de algumas culturas, como o milho, com alta de preços próxima a 50% em 2021, pode mudar bastante durante o ano, com ampliação das vendas externas. Ademais, o setor agropecuário é caracterizado pela dificuldade na elaboração de projeções para o PIB, pois o desconhecimento sobre a exata metodologia de cálculo impede a construção de previsões precisas.

As alterações nas projeções do PIB de 2021 podem ser mais expressivas, pois cerca de 13% da produção industrial está relacionada ao beneficiamento de produtos agropecuários.

As contínuas altas dos preços das commodities metálicas já superam, por exemplo, 50% no minério de ferro, responsável por 6,3% da produção industrial (PIM), e 25% no alumínio, 1,3% da PIM. Essa dinâmica sugere revisões continuadas da demanda global, o que tende a ter efeito favorável na indústria extrativa mineral - peso de 2,5% no PIB. Esse comportamento também pode alterar as previsões para a produção da indústria de transformação (9,8% no PIB) e de transportes (3,7% no PIB), por exemplo.

A evolução da pandemia é outra fonte de incerteza. As dúvidas sobre esse avanço provocaram contínuas revisões das previsões para o PIB de 2020 - após aumentar até cerca de 8%, as expectativas de recessão recuaram até a divulgação final dos 4,1% no ano. Caso os números de novos casos e de mortes diárias não recuem bastante, a tragédia na saúde pública pode ter repercussões negativas adicionais nas projeções para 2021.

A contínua postergação da importação de vacinas, por conta de falhas do Executivo ou devido a efeitos alheios ao Brasil, como no caso da disseminação da doença na Índia, tem retardado a reabertura da economia. Apesar da possibilidade de novas surpresas neste ano, alterações das previsões tão expressivas como em 2020 são improváveis. Enquanto as dúvidas no ano passado eram associadas à duração e à profundidade da recessão, a atual incerteza refere-se ao tempo necessário para que o crescimento retome o ritmo de 2019.

Os números fiscais também agregam riscos. Uma elevação do déficit primário pode ter um impacto negativo no PIB, ao fomentar questionamentos sobre a reversão da trajetória insustentável dos gastos. O cenário mais provável, por exemplo, é de uma pressão por despesas elevadas também em 2022, em função da elevada taxa de desemprego e das eleições em outubro.

Já pelo lado positivo, o aumento dos gastos públicos no início deste ano, com os gastos adicionais na saúde, a nova fase do Pronampe e a maior transferência de recursos para as famílias - via Auxílio Emergencial e BEm - contribui para a ampliação do consumo das famílias. Uma extensão desses programas para além de julho estimularia a atividade no 2º semestre.

O declínio da massa salarial real com ajuste sazonal de cerca de 0,6% a.m. nos últimos meses, com uma recuperação pouco expressiva do número de postos de trabalho nos mercados formais e informais frente ao pior momento dos últimos 12 meses, tem prejudicado a recuperação da atividade, o que restringe a utilização do aumento da poupança construído durante a pandemia.

A incerteza associada aos ruídos impostos pelo governo no seu relacionamento com os demais países e a pouca relevância atribuída até agora às questões ambientais e climáticas podem postergar decisões de consumo e investimentos no país, dificultando a recuperação da atividade. Além de razões particulares, a atuação equivocada do governo tem influência na decisão de várias empresas, como Ford, LafargeHolcim e Roche, de sair do Brasil após décadas de produção doméstica. A quase paralisia na promoção dos ajustes na economia é outro fator que contribui para a claudicante retomada.

Mesmo com uma possível revisão da mediana das projeções de crescimento de 2021 de 3,2% para próximo a 4% nos próximos meses, como reflexo de alguma expansão no 1º trimestre, as expectativas para economia em 2021 variam entre uma reduzida contração ou uma ligeira expansão trimestral. No caso da previsão de 3,2%, a atividade contrairia na média cerca de 0,2% ao trimestre, enquanto no caso de 4%, a expansão trimestral média seria próxima a 0,1%.

Em suma, não é possível ter convicção sobre a previsão de crescimento do PIB em 2021 diante de incertezas em tantas frentes. Mesmo uma revisão de 3,2% para 4%, apesar de positiva, não é tão diferente em termos de expansão trimestral. O Executivo e o Legislativo têm um papel determinante para reduzir a maioria das incertezas discutidas aqui e promover uma expansão econômica mais firme e duradoura.

Entretanto, fora os discursos desgastados e repetidos à exaustão, são poucas as ações efetivas, sendo que muitas vezes são em direção contrária à necessária.

Nenhum comentário: