Não
é possível ter convicção sobre a previsão de crescimento do PIB em 2021 diante
de incertezas em muitas frentes
Os
dados recentes sugerem números mais favoráveis para o PIB do 1º trimestre -
nossa projeção de crescimento é de 0,2% ante o 4º trimestre. O aprofundamento
da pandemia em março, com a decretação pelos Estados e municípios de medidas
mais restritivas ao funcionamento de alguns segmentos, notadamente no setor de
serviços, teve impacto no mês menor do que o antecipado.
Essa
dinâmica em março ocorreu tanto do lado da produção como do consumo. A produção
industrial, por exemplo, cresceu 10,3% frente a fevereiro e contraiu 2,4%
frente a março de 2020, um resultado melhor do que o previsto. Do mesmo modo,
as vendas no varejo de março surpreenderam positivamente, com alta de 10,1%
frente ao mesmo mês do ano anterior e retração de apenas 0,6% ante fevereiro.
A incerteza sobre o comportamento do PIB advém de várias frentes, algumas com efeitos positivos e outras negativos. Do lado favorável, a forte e contínua alta dos preços das commodities agrícolas e metálicas indica que o superávit comercial pode ser maior, não apenas por conta dos preços altos, mas também de maiores quantidades exportadas.
No
caso da agropecuária, com participação de 5,9% no PIB, o aumento das projeções
de exportações dependerá da expansão das áreas plantadas e dos investimentos
para elevação da produtividade. Nesse ambiente, a produção de algumas culturas,
como o milho, com alta de preços próxima a 50% em 2021, pode mudar bastante
durante o ano, com ampliação das vendas externas. Ademais, o setor agropecuário
é caracterizado pela dificuldade na elaboração de projeções para o PIB, pois o
desconhecimento sobre a exata metodologia de cálculo impede a construção de
previsões precisas.
As
alterações nas projeções do PIB de 2021 podem ser mais expressivas, pois cerca
de 13% da produção industrial está relacionada ao beneficiamento de produtos
agropecuários.
As
contínuas altas dos preços das commodities metálicas já superam, por exemplo,
50% no minério de ferro, responsável por 6,3% da produção industrial (PIM), e
25% no alumínio, 1,3% da PIM. Essa dinâmica sugere revisões continuadas da
demanda global, o que tende a ter efeito favorável na indústria extrativa
mineral - peso de 2,5% no PIB. Esse comportamento também pode alterar as
previsões para a produção da indústria de transformação (9,8% no PIB) e de
transportes (3,7% no PIB), por exemplo.
A
evolução da pandemia é outra fonte de incerteza. As dúvidas sobre esse avanço
provocaram contínuas revisões das previsões para o PIB de 2020 - após aumentar
até cerca de 8%, as expectativas de recessão recuaram até a divulgação final
dos 4,1% no ano. Caso os números de novos casos e de mortes diárias não recuem
bastante, a tragédia na saúde pública pode ter repercussões negativas
adicionais nas projeções para 2021.
A
contínua postergação da importação de vacinas, por conta de falhas do Executivo
ou devido a efeitos alheios ao Brasil, como no caso da disseminação da doença
na Índia, tem retardado a reabertura da economia. Apesar da possibilidade de
novas surpresas neste ano, alterações das previsões tão expressivas como em
2020 são improváveis. Enquanto as dúvidas no ano passado eram associadas à
duração e à profundidade da recessão, a atual incerteza refere-se ao tempo
necessário para que o crescimento retome o ritmo de 2019.
Os
números fiscais também agregam riscos. Uma elevação do déficit primário pode
ter um impacto negativo no PIB, ao fomentar questionamentos sobre a reversão da
trajetória insustentável dos gastos. O cenário mais provável, por exemplo, é de
uma pressão por despesas elevadas também em 2022, em função da elevada taxa de
desemprego e das eleições em outubro.
Já
pelo lado positivo, o aumento dos gastos públicos no início deste ano, com os
gastos adicionais na saúde, a nova fase do Pronampe e a maior transferência de
recursos para as famílias - via Auxílio Emergencial e BEm - contribui para a
ampliação do consumo das famílias. Uma extensão desses programas para além de
julho estimularia a atividade no 2º semestre.
O
declínio da massa salarial real com ajuste sazonal de cerca de 0,6% a.m. nos
últimos meses, com uma recuperação pouco expressiva do número de postos de
trabalho nos mercados formais e informais frente ao pior momento dos últimos 12
meses, tem prejudicado a recuperação da atividade, o que restringe a utilização
do aumento da poupança construído durante a pandemia.
A
incerteza associada aos ruídos impostos pelo governo no seu relacionamento com
os demais países e a pouca relevância atribuída até agora às questões
ambientais e climáticas podem postergar decisões de consumo e investimentos no país,
dificultando a recuperação da atividade. Além de razões particulares, a atuação
equivocada do governo tem influência na decisão de várias empresas, como Ford,
LafargeHolcim e Roche, de sair do Brasil após décadas de produção doméstica. A
quase paralisia na promoção dos ajustes na economia é outro fator que contribui
para a claudicante retomada.
Mesmo
com uma possível revisão da mediana das projeções de crescimento de 2021 de
3,2% para próximo a 4% nos próximos meses, como reflexo de alguma expansão no
1º trimestre, as expectativas para economia em 2021 variam entre uma reduzida
contração ou uma ligeira expansão trimestral. No caso da previsão de 3,2%, a
atividade contrairia na média cerca de 0,2% ao trimestre, enquanto no caso de
4%, a expansão trimestral média seria próxima a 0,1%.
Em
suma, não é possível ter convicção sobre a previsão de crescimento do PIB em
2021 diante de incertezas em tantas frentes. Mesmo uma revisão de 3,2% para 4%,
apesar de positiva, não é tão diferente em termos de expansão trimestral. O
Executivo e o Legislativo têm um papel determinante para reduzir a maioria das
incertezas discutidas aqui e promover uma expansão econômica mais firme e
duradoura.
Entretanto, fora os discursos desgastados e repetidos à exaustão, são poucas as ações efetivas, sendo que muitas vezes são em direção contrária à necessária.
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