quinta-feira, 18 de julho de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Sem cortar exceções, Brasil terá alíquota insuportável

O Globo

Senado deve reduzir benesses criadas pela Câmara na reforma tributária para manter o patamar de 26,5%

O brasileiro sente diariamente o peso de uma das maiores cargas de impostos do mundo. É com isso em mente que os senadores têm de encarar a regulamentação da reforma tributária. A principal meta deve ser reduzir ao mínimo as exceções à alíquota-padrão total dos impostos sobre serviços e consumo, definindo mecanismos para garantir que ela não passe de 26,5%, patamar estipulado em votação na Câmara.

Os deputados estabeleceram o teto de forma genérica, sem especificar gatilhos para sua manutenção. No formato atual, o texto não garante que o limite será respeitado, abrindo a possibilidade de alíquota-padrão ainda maior — entre os países da OCDE, a média é 19,2%, e o único país com alíquota superior é a Hungria, com 27%. Ao GLOBO, o secretário de Reforma Tributária, Bernard Appy, afirmou que o governo enviará ao Senado sugestões de ajustes para manter os 26,5%.

A Emenda Constitucional da reforma tributária estabeleceu uma avaliação quinquenal dos setores agraciados com alíquotas reduzidas a partir de 2034. Pelo projeto aprovado na Câmara, a revisão foi antecipada para 2031. Além disso, os deputados estipularam o teto de 26,5%. Se em sete anos a projeção for superior, o governo precisaria apresentar um projeto para extinguir parte dos benefícios fiscais.

Como a aprovação desse projeto não é garantida, o Executivo estuda sugerir ao Senado que estabeleça desde já mecanismos para ajuste. Entre as possibilidades, estão a retirada de itens da cesta básica, de setores em regimes especiais ou a diminuição linear das isenções. “Com isso, você teria segurança de que a trava funcionará”, disse Appy. A medida teria a vantagem de deixar o Executivo calibrar as mudanças, evitando o desgaste de negociações que poderiam bloquear a agenda do Congresso.

Na opinião de advogados, porém, empresas que eventualmente perderem benesses podem contestar na Justiça a decisão. A Emenda Constitucional estabeleceu uma avaliação de custo-benefício para os setores agraciados com alíquotas reduzidas, sem menção à trava. Essa é outra questão que governo e Senado terão de examinar. Independentemente da alternativa escolhida para evitar a judicialização, os senadores precisam reduzir drasticamente as benesses distribuídas pela Câmara, do contrário a alíquota brasileira não terá paralelo no mundo.

O governo não tem estimativa fechada de quanto será, mas calcula que apenas a decisão de incluir carne na cesta básica com isenção acarreta aumento de 0,53 ponto percentual. Outras medidas tiveram efeito contrário, como incluir empresas de aposta no Imposto Seletivo, mais alto para coibir produtos e serviços nocivos. O certo é que, ao diminuir a lista de exceções, os senadores reduzirão o percentual que recairá sobre a maioria. Cada vez que um setor obtém alíquota reduzida, aquela paga pelos demais aumenta.

O Senado terá de ser firme e ágil. É preciso aprovar a regulamentação antes do final do ano. Appy lembra que há inúmeras questões técnicas envolvidas nas transformações: “Tem de editar o regulamento, tem de montar todo o sistema tecnológico de cobrança do imposto, e isso depende de lei complementar. A reforma precisa entrar em fase de teste em 2026”. O Brasil não tem tempo a perder para acabar com o atual manicômio tributário, motivo de atraso e vergonha.

Impedir voto de venezuelanos no exterior é fraude eleitoral disfarçada

O Globo

Depois de acenar com distensão, Maduro manobra para tentar vencer eleição e ficar no poder

Comunidades venezuelanas no exterior não têm conseguido se inscrever para votar nas eleições marcadas para 28 de julho. Dos 21 milhões de eleitores venezuelanos, calcula-se que entre 3,5 milhões e 5 milhões vivam no exterior. Desses, apenas 69 mil estão registrados para votar, segundo noticiou o New York Times.

Em países com grandes comunidades venezuelanas, há dificuldade nos consulados e embaixadas para registrar eleitores. Em Madri, a fila costuma se estender pelo quarteirão. Uma cidadã que deixou a Venezuela em 2018 tentou por dois dias, durante oito horas, apenas para ouvir dos funcionários que não podiam mais continuar com os registros. Cidadãos acompanhados de crianças pequenas, deficientes, idosos chegam às 4 horas da manhã, cinco horas antes da abertura do expediente, mesmo assim não conseguem ser atendidos. Os casos se repetem em cidades da Argentina, do Chile e da Colômbia.

Há fortes indícios de que o regime venezuelano tem impedido os eleitores no exterior de exercer o direito ao voto por considerá-los majoritariamente de oposição. E essa é apenas a última manobra do ditador Nicolás Maduro para tentar se manter no poder. Com o controle da Justiça Eleitoral, ele inabilitou a candidatura da maior liderança oposicionista, María Corina Machado, favorita nas pesquisas, e de outros que tentaram substituí-la. No fim, foi registrada a do veterano político Edmundo González. Em entrevista ao GLOBO, María Corina pediu apenas que “os votos sejam contados” e, em caso de vitória da oposição, acenou a Maduro com a negociação de uma transição, “como está ocorrendo com muitos setores do chavismo que começam a se aproximar”.

María Corina considera importante que todos os presidentes latino-americanos atuem em prol de eleições livres, mas destaca o peso do brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, que tem comunicação direta com Maduro. Lula o recebeu na posse em Brasília com honras de chefe de Estado. Ainda o aconselhou publicamente a criar uma “narrativa” que levasse o mundo a considerar a Venezuela uma democracia.

Depois de afagos de Lula em Maduro — entre eles a declaração absurda de que a democracia é um “conceito relativo” —, o governo brasileiro só esboçou mudança de posição quando a candidatura de María Corina foi inabilitada em março. Uma nota do Itamaraty manifestou preocupação com a forma como Caracas tentava impedir a apresentação de candidaturas oposicionistas que pudessem ameaçar o chavismo.

No início do ano, Maduro deu sinais de distensão, recebidos de modo positivo — os Estados Unidos chegaram a suspender temporariamente o boicote ao petróleo venezuelano. Mas não demorou a ficar claro que tudo não passava de jogo de cena. A tentativa de impedir os venezuelanos no exterior de votar é apenas uma fraude eleitoral disfarçada. O regime chavista completa 25 anos cheio de fissuras, e o aceno de María Corina deveria ser levado a sério por Maduro. Infelizmente é difícil acreditar que isso acontecerá.

Atentado não muda pesquisas de intenção de voto nos EUA

Valor Econômico

A perspectiva de um Trump revigorado após o atentado e de um Biden esmagado após o debate entre ambos tem seu desenho contestado pelas pesquisas

O odioso atentado contra o candidato à Presidência dos Estados Unidos, Donald Trump, poderia produzir dois efeitos esperados: o republicano teria um momento muito favorável nas pesquisas, ampliando sua dianteira sobre seu oponente, o democrata Joe Biden, e o estimularia a tentar conter a polarização extrema da campanha, da qual quase foi vítima. No primeiro caso, porém, as pesquisas mostram que quase nada mudou na contenda eleitoral. Trump segue à frente, na margem do empate técnico. Quanto à mensagem apaziguadora, que seria mais que bem-vinda, há dúvidas se ele a fará. A escolha de um radical à sua semelhança, como J. D. Vance, não traz essa sinalização.

A média das pesquisas após a tentativa contra a vida de Trump, feita pelo agregador FiveThirtyEight, de Nate Silver, aponta margem de 42,3% a 40,3% para o ex-presidente. A apoteose republicana da convenção em Milwaukee, que terá seu ápice com o discurso do candidato hoje, serviu para galvanizar os republicanos, mas tudo isso já era esperado. O atentado trouxe de volta para o ninho os rebeldes anti-Trump do partido, como Nikki Haley e outros, em uma demonstração de subserviência que reforça o domínio do magnata sobre  o  partido.

Ainda que a aura de perseguido político se afirme após o atentado, e seja de alguma forma ratificada pelas sucessivas vitórias de Trump na Justiça, a reação do eleitorado não quebrou o figurino da polarização. Para democratas e muitos eleitores independentes - os que decidirão as eleições - a pregação incendiária e radical de Trump não lhes apraz. Poderia ser um fator de mudança a cativar os indecisos uma surpreendente guinada de Trump a favor da união do país e por uma campanha pacífica, em que os adversários não fossem tratados como inimigos irreconciliáveis. Poucas horas após ter sido retirado do palanque em Butler, na Pensilvânia, no sábado, com ferimentos na orelha, Trump afirmou que rasgara o discurso que preparou para a convenção republicana e que sua mensagem seria de paz. Seu mandato e a rebelião incitada para que a vitória inegável de Biden nas urnas fosse rejeitada, indicam, entretanto, que a conciliação com os adversários é uma atitude estranha a sua personalidade.

A escolha de J. D. Vance, radical cristão do Meio-Oeste, apenas provou que o candidato republicano não está interessado em apelar a quem não comunga de seus credos, mas em vencer a eleição. Michigan, Pensilvânia e Wisconsin, Estados que podem decidir a disputa eleitoral, foram o alvo procurado com a opção por Vance, em uma região em que Joe Biden conseguiu derrotar Trump na eleição passada.

Se o atentado pode não ter aumentado o vigor da candidatura Trump, a resignação ou rebeldia dos democratas diante da candidatura de Joe Biden tampouco melhora as perspectivas do partido. O choque e a estupidez do atentado contra Trump amorteceram o movimento crescente para demover o atual presidente de tentar a reeleição. A máquina dirigente do partido tenta manobrar agora para que a candidatura se torne irreversível antes da convenção democrata de 19 de agosto, em Chicago.

Uma parte do estrago para Biden tende a ser irreversível. Se os próprios democratas não acreditam que ele seja apto para continuar por mais quatro anos na Presidência do país mais poderoso do mundo, por que os eleitores deveriam pensar o contrário? O dilema em que o partido está atolado já dura muito tempo, quando a solução deveria ter sido rápida e cirúrgica. Isto, ao que parece, não acontecerá.

Os mercados estão projetando o futuro com base no que conhecem. Uma vitória de Trump trará juros mais altos, mais inflação e endividamento, algo temerário diante da relação já alta entre dívida e PIB do país, de 123%. A equação econômica do republicano é conhecida. Corte de impostos agravarão o déficit e estimularão o consumo, impulsionando a inflação e elevando os juros que o Tesouro terá de pagar por débitos crescentes. Juros mais altos empurram o dólar para cima. O protecionismo ganhará escala, se Trump cumprir sua promessa de impor tarifas de 10% para importações do mundo inteiro e elevá-las a 60% para produtos chineses. Importações mais caras darão mais impulso à inflação, que hoje cai mais devagar do que Joe Biden gostaria e se tornou o fator mais importante a fazer com que os americanos acreditem que Trump é mais capaz de gerir a economia que o atual presidente.

Politicamente, Trump é a incerteza exponencial. Em entrevista à Bloomberg, ele saiu ontem com a ideia de que Taiwan deveria pagar por sua defesa contra a China e que a ilha subtraiu a dianteira dos americanos em semicondutores. Não há lógica alguma no raciocínio, especialmente em meio a uma disputa com Pequim, mas Trump age por rompantes e não segue qualquer roteiro, fora o que lhe indica seus instintos irrefreáveis.

A perspectiva de um Trump revigorado após o atentado e de um Biden esmagado após o debate entre ambos tem seu desenho contestado pelas pesquisas. Nada está decidido ainda nas eleições americanas.

Sem solução para déficit, Lula reacende incerteza

Folha de S. Paulo

Relator do Orçamento defende desvinculações para equilíbrio das contas, já o presidente insiste em atacar metas fiscais

No início de julho, Fernando Haddad afirmou que o cumprimento das metas do arcabouço fiscal era determinação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT): "Não há discussão a respeito". O ministro da Fazenda tentava encerrar o pior momento da crise recente de desconfiança no plano do governo de limitar déficits e a dívida pública.

A cotação do dólar e as taxas de juros baixaram desde então. Mas desceram apenas dos níveis de quase pânico para aqueles ainda sintomáticos de grande preocupação. Além das declarações de Haddad, o governo precisa dar provas de que tomará providências. Para começar a fazê-lo, conviria ao menos não suscitar novas desconfianças.

Lula, porém, voltou a disseminar incerteza. Em entrevista ao Jornal da Record, disse que não está "convencido" da necessidade de cortar despesas; que não é preciso cumprir metas fiscais se "tiver coisas mais importantes para fazer".

O presidente atenuou as declarações afirmando que vai "fazer o que for necessário para cumprir o arcabouço fiscal". Mas não contribuiu para enterrar a polêmica.

O governo demonstrará, em breve, se está disposto a respeitar suas metas. Na semana que vem, ao apresentar a revisão bimestral de receitas e despesas, dirá se vai conter gastos o bastante. Em agosto, enviará ao Congresso o projeto de lei do Orçamento de 2025.

Mas cortes e revisões emergenciais de dispêndios não resolverão o problema nem em prazo mais curto, até o final de Lula 3. Como disse o senador Confúcio Moura (MDB-RO) a esta Folha, a seu modo, medidas pontuais são "lenga-lenga". Ele é o relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias e um dos vice-líderes do governo na Casa.

O Orçamento precisa de revisão profunda, como aponta o congressista. Por exemplo, é fundamental dar fim à vinculação do aumento da despesa em saúde e educação ao crescimento da receita e a do reajuste de benefícios previdenciários ao ritmo do PIB.

Moura também tratou da necessidade de reformar a Previdência dos militares e de diminuir o volume de isenções tributárias.

Mencionou ainda a obrigatoriedade do pagamento de emendas parlamentares —além de engessamento, trata-se de dispêndio ineficiente e sem controle técnico. Entretanto não acredita que tão cedo tais problemas serão enfrentados.

Assim, não haveria mudança fundamental para as perspectivas de déficits, de crescimento da dívida e, portanto, para as taxas de juros.

Ajudaria se o governo atacasse o problema em duas frentes. De um lado, realizar um debate sério e técnico sobre as desvinculações e, de outro, Lula deve conter sua verborragia, que só atrapalha o trabalho de seu ministro da Fazenda.

Políticas da sucata

Folha de S. Paulo

É bem-vindo o incentivo a catadores, mas reciclagem ainda é muito baixa no país

O governo federal anunciou recentemente um pacote de medidas no valor de R$ 425 milhões direcionadas à reciclagem e aos catadores de materiais. Um passo correto, porém muito mais é preciso fazer para que esse setor avance no Brasil.

A Associação Nacional de Catadores estima que 800 mil pessoas atuem nesse elo entre o descarte e a renovação dos resíduos. Faz-se justiça ao contrabalançar com capacitação as desvantagens e o preconceito que cercam o serviço.

Em 2021, a Lei de Incentivo à Reciclagem abriu a possibilidade de captar recursos privados para projetos chancelados pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA). Admite-se a dedução de até 6% do imposto de renda de pessoas físicas e até 1% de pessoas jurídicas.

Contudo só uma minoria das cooperativas de catadores possui estrutura e organização administrativa para beneficiar-se do incentivo. Segundo o MMA, há no país cerca de 3.000 dessas entidades, mas meras 721 emitem notas fiscais e se credenciaram para receber créditos de logística reversa.

Um total de R$ 103 milhões estão disponíveis para investimento a fundo perdido na estruturação e fortalecimento das cooperativas. A proposta é que, com maquinário e treinamento, elas possam se coordenar em centrais para aumentar a escala e vender diretamente para a indústria.

Em que pese o acerto do programa, há que fazer mais. Após 14 anos da aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos pelo Congresso, acumulam-se no setor queixas sobre baixa valorização do material reciclado, insegurança tributária e falta de linhas de crédito.

Não à toa, o índice de reciclagem é baixo no Brasil. Mesmo com poucos dados, pode-se estimar que o país tem um dos piores níveis do mundo, no patamar de 3% a 4%.

Para efeito de comparação, a média da Europa Ocidental é de 56%. Mesmo na região da América Central e do Caribe, o indicador (11%) fica acima do nosso; a média da América do Sul está em 6%.

O Brasil tem pelo menos 85% de sua população em áreas urbanas, o que facilita sobremaneira a coleta de materiais. Não há desculpa para tão fraco desempenho.

Demagogia como natureza

O Estado S. Paulo

Após posar de responsável, Lula volta a atacar a meta fiscal, dizendo que só será cumprida se não houver ‘coisas mais importantes a fazer’. Mais uma vez, o bombeiro Haddad trabalhou

Inspirado naquelas placas de canteiro de obras que fazem a contagem de dias sem acidentes de trabalho, o governo bem que poderia ter uma placa fazendo a contagem de dias sem que o presidente Lula da Silva prejudique o esforço de transmitir confiança no seu compromisso de equilibrar as contas públicas. No dia 3 de julho, depois de muitas turbulências causadas pelas suas diatribes contra a austeridade fiscal e os fundamentos econômicos, Lula jurou que “responsabilidade fiscal não é uma palavra, é um compromisso deste governo”. Nas duas semanas seguintes, Lula até conseguiu se conter, mas a natureza é mesmo algo implacável: anteontem, foi ao ar uma entrevista em que o presidente deixou claro, sem margem a qualquer dúvida, que continua plenamente convicto de que metas fiscais são firulas inconvenientes que o governo pode escolher se vai cumprir ou não.

Na entrevista, à TV Record, Lula disse que a meta fiscal não precisa ser atingida se houver “coisas mais importantes para fazer”. Como se uma coisa não dependesse da outra, disse que fará “o necessário” para cumprir o arcabouço, mas afirmou não estar plenamente convencido de que o País precisa conter seus gastos.

Para Lula da Silva, tudo na economia vai bem, exceto, claro, os juros. “A única coisa que não está controlada é a taxa de juros”, afirmou. Ele tampouco demonstrou preocupação com a possibilidade de que suas declarações voltassem a desvalorizar o real perante o dólar, o que tem o potencial de aumentar a inflação e prejudicar os mais pobres. “O povo mais pobre, quando tem um pouquinho de dinheiro, ele não compra dólar, ele compra comida”, provocou, comprovando que entende muito mais de demagogia que de economia.

Em economias responsáveis, metas fiscais são respeitadas porque déficits recorrentes realimentam a inflação, desvalorizam o câmbio e exigem juros mais altos. Juros altos, além de aumentar o endividamento da população e de diminuir seu poder de compra, reduzem a atratividade de investimentos produtivos.

A falta de investimentos compromete o crescimento do País e a geração de empregos. Falta de postos de trabalho de qualidade e baixos salários aumentam a informalidade e reduzem a arrecadação do governo, de um lado, e ampliam o contingente de pessoas que dependem de benefícios sociais e assistenciais para sobreviver, de outro. O conjunto da obra eleva o gasto público e aumenta o rombo nas contas públicas.

Na ânsia de atacar o “poderoso” mercado, Lula da Silva disse que o País precisa de mais gente vivendo de trabalho e menos gente vivendo de dividendos. O presidente ignora que esse mesmo mercado é composto por pessoas que já dedicaram suas vidas ao trabalho e que buscam complementar a aposentadoria com o retorno dado por seus próprios investimentos – entre elas funcionários de estatais que aplicaram suas economias em fundos de previdência.

Não é difícil compreender essa lógica, mas Lula, incapaz de descer do palanque e movido a pesquisas de popularidade, age como se ainda fosse um candidato da oposição, e não um presidente eleito há mais de dois anos e no exercício de seu terceiro mandato.

A sorte de Lula é que sua logorreia já não é levada muito a sério pelo mercado. É verdade que o dólar, que estava em queda, subiu um pouco, e os juros futuros, que haviam zerado, voltaram a registrar algumas máximas, mas, como sempre, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, controlou o incêndio.

Haddad disse que as falas de Lula da Silva haviam sido divulgadas fora de contexto e reiterou que a responsabilidade fiscal é um compromisso do presidente. Adiantou que a revisão do Orçamento a ser divulgada na próxima semana poderá contar com bloqueios e contingenciamentos de despesas e reiterou que o governo logo deve detalhar o corte de quase R$ 26 bilhões que será proposto para 2025.

Por ora, o ministro evitou mais uma crise desnecessária, mas, como se sabe, logo virá a próxima. Lula da Silva tem a convicção de que esse discurso populista funciona e, para provar seu ponto, está disposto a tudo, inclusive sabotar seu próprio governo.

Isso sim é ‘lawfare’

O Estado de S. Paulo

Rusga envolvendo ministro Alexandre de Moraes no aeroporto de Roma não deveria ensejar nem indiciamentos. Denúncia oferecida pelo procurador-geral recende a perseguição

O procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, denunciou o empresário paulista Roberto Mantovani Filho, a mulher dele, Andreia Munarão, e o genro do casal, Alex Zanatta Bignotto, pelos crimes de calúnia, injúria e injúria real (quando, além da ofensa à dignidade, há emprego de violência física ou ameaça) que teriam sido praticados pela família contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes no aeroporto de Roma, em 14 de julho de 2023.

Por sua insignificância, esse caso não deveria nem sequer ter levado ao indiciamento dos envolvidos. Tendo ensejado indiciamentos, não deveria levar ao oferecimento de denúncia. Feita a denúncia, é estarrecedor que o foro escolhido pelo parquet não tenha sido a Justiça de primeiro grau, mas sim o STF. Com base em quê? A menos que se considere que um tapa no rosto de um ministro da Corte ou familiar configure uma ameaça ao Estado Democrático de Direito, prevalece o entendimento segundo o qual o foro especial por prerrogativa de função se aplica aos casos em que uma autoridade é suspeita da autoria de um crime, não vítima.

Que a Procuradoria-Geral da República (PGR) tenha se prestado a dar seguimento judicial no STF a uma simples altercação em sala “vip” de aeroporto, seguida de um tapa, sugere, no cenário mais benevolente, que tempo ocioso não falta na sede do Ministério Público Federal em Brasília. No pior cenário, autoriza a suspeita de que o procurador-geral, ninguém menos, só deu andamento a um caso que envolve crimes de menor potencial ofensivo por ser a vítima quem é. À luz da lei, Alexandre de Moraes, aliás um dos padrinhos da indicação de Gonet à PGR, parece ter sido tratado como um cidadão distinto dos demais. Se assim foi, Gonet pisoteou a Constituição em seu trecho mais precioso, a consagração da igualdade de todos perante a lei, princípio republicano elementar.

O imbróglio de Roma, como era evidente desde o início, não deveria merecer mais que um repúdio coletivo ao comportamento incivilizado da família Mantovani. Essa, aliás, foi a correta conclusão do primeiro delegado federal encarregado do inquérito, Hiroshi Sakaki. Seguindo uma norma da própria Polícia Federal (PF), Sakaki arquivou o caso sem indiciamentos por envolver crimes de menor potencial ofensivo e porque os crimes dos quais os acusados são suspeitos deveriam ser passíveis de extradição – o que não é o caso.

Por razões que ainda não estão claras até hoje, dias depois da apresentação do relatório final assinado por Sakaki, a PF decidiu incumbir o delegado Thiago Rezende de realizar novas diligências para apurar o caso, o que, na prática, significou a reabertura do inquérito ao fim do qual Mantovani, sua mulher e o genro foram, enfim, indiciados – o empresário, pelos crimes de calúnia, injúria e injúria real; Andreia e Alex, por calúnia e injúria.

Era de esperar que, uma vez na PGR, a rusga envolvendo Moraes merecesse um novo escrutínio, preferencialmente desapaixonado e desinteressado, e o caso fosse encerrado sem consequências mais gravosas. Este jornal jamais deixou de sublinhar que o sr. Mantovani e seus familiares agiram como agem os típicos vândalos bolsonaristas, que, inimigos da democracia quando o regime lhes desagrada, fazem da desqualificação moral de pessoas e instituições o seu esporte favorito – tanto nas redes sociais como nas ruas. Mas um perigosíssimo precedente se abre quando um entrevero qualquer, apenas por envolver uma autoridade, vira subitamente um ataque contra o Estado Democrático de Direito, sobre o qual deve recair, quem sabe, até a ira de Deus.

Ora, são extremamente frágeis as provas materiais das ofensas que o ministro Alexandre de Moraes alega ter sofrido. O vídeo do circuito interno de TV do Aeroporto Fiumicino não tem áudio. Não obstante, o delegado que indiciou os ora acusados não se importou com isso, prevalecendo a versão do ministro vítima.

Da forma como tem sido conduzido, esse caso, sim, parece configurar lawfare – o que já seria uma violência se todo o peso do aparato persecutório do Estado recaísse de forma desproporcional sobre gente muito poderosa. Que dirá sobre cidadãos comuns.

A transparência vai mal

O Estado de S. Paulo

Capitais falham ao divulgar dados, o que acende alerta sobre gastos em ano eleitoral

A transparência nas capitais vai mal. O Índice de Transparência e Governança Pública (ITGP), da Transparência Internacional, coloca em alerta a sociedade, enquanto os brasileiros se preparam para, nas urnas, definir seus representantes locais pelos próximos quatro anos. Em ano de eleições municipais, chamou a atenção da organização a falta de dados disponíveis sobre obras e emendas – e sabe-se que a opacidade no uso dos recursos públicos tende a beneficiar determinados candidatos ou apadrinhados por parlamentares, influenciando o processo de escolha de eleitores.

Os números compilados pela entidade em 25 cidades mostram uma realidade obscura em boa parte delas. Não foram consideradas Porto Alegre, em razão das chuvas, nem Brasília, por se tratar da capital federal.

De uma escala de zero a cem, apenas Vitória, com 99 pontos, obteve um índice “ótimo”. Em cinco capitais – Recife, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e João Pessoa –, o ITGP foi classificado como “bom”, entre 71 e 80 pontos. Do total, 13 cidades receberam o título “regular”. Na lanterna do ranking, Macapá, Teresina, Belém, Boa Vista, Rio Branco e Natal apresentaram avaliação “ruim”, sem nem mesmo atingir 40 pontos. Nenhuma cidade recebeu o carimbo “péssimo”, o que não chega a ser um alívio.

A Transparência Internacional examinou as prefeituras em seis dimensões: a legal, sobre a regulamentação de legislações como a Lei de Acesso à Informação (LAI) e a Lei Anticorrupção; as plataformas, para averiguar a existência e a qualidade da divulgação de informações; a administração e a governança, sobre a transparência no uso de emendas parlamentares; as obras públicas, em relação à transparência na execução; a transparência financeira e orçamentária; e a participação e comunicação.

Foram atribuídos pontos e pesos às mais variadas iniciativas nessas áreas, e o resultado assustador decorre da precariedade das informações. Os indicadores são ruins em quesitos como contratações emergenciais, divulgação de agenda de prefeitos, dados abertos de salários de servidores municipais e informações sobre incentivos fiscais.

Mas o pior mesmo é o registro sobre como os escassos recursos públicos são gastos. Apenas duas capitais têm plataformas com amplas informações sobre execução orçamentária, valores pagos e andamento de obras. Além disso, somente quatro dão total transparência a emendas de vereadores ao orçamento municipal e duas, às “emendas Pix”, que são verbas destinadas por deputados aos municípios sem uma finalidade específica.

Para a Transparência Internacional, essas áreas são mais vulneráveis à corrupção e impactam a percepção pública sobre a gestão municipal, o que pode se refletir na eleição. Para barrar essa flagrante deterioração da democracia, a entidade sugere que os municípios se adaptem à LAI, divulguem as emendas e que quem denuncie corrupção seja protegido, entre outras providências. Não se trata de um favor, mas de uma obrigação do poder público e um direito do cidadão.

É preciso avançar com a agenda verde

Correio Braziliense

A aprovação da Política Nacional do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono é vista como um trunfo na regulação da economia verde

A aprovação da Política Nacional do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono é vista como um trunfo na regulação da economia verde - (crédito: Imagem de Milt Ritter por Pixabay )

Ao retornar do recesso na primeira semana de agosto, o Congresso Nacional tem uma empreitada essencial a ser levada adiante: a agenda verde. A definição regulatória de várias atividades econômicas ligadas à sustentabilidade se faz urgente, pois abre oportunidade para atração de investimentos e geração empregos, além de contribuir para um posicionamento relevante do Brasil na economia mundial.

Na semana passada, antes de interromper as atividades em Brasília, a Câmara dos Deputados deu um passo importante nessa direção. A aprovação da Política Nacional do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono, conhecido popularmente como hidrogênio verde, é vista como um trunfo na regulação da economia verde. O projeto de lei estabelece as diretrizes para a produção dessa fonte de energia, além de criar incentivos federais para a indústria que se dedicar a essa inovação tecnológica. Autoridades e representantes do setor comemoraram o marco legal do hidrogênio.

Somente no âmbito do governo federal, os projetos para a produção sustentável desse elemento químico somam um aporte de US$ 30 bilhões em investimentos. O marco regulatório aguarda sanção presidencial, o que deve mitigar a insegurança jurídica nesse item específico da transição energética.

Há outros temas importantes a aguardar a deliberação dos parlamentares. O PL 528/2020, que trata dos "combustíveis do futuro", está na Comissão de Infraestrutura do Senado e, desde março, tem como relator o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB). A proposta discorre sobre as políticas para a produção de diesel verde, de combustível sustentável para aviação e de biometano. Esse projeto é fundamental, por exemplo, para a descarbonização do setor aéreo. A partir de 2027, o Brasil assumiu o compromisso de zerar, até 2050, as emissões da aviação comercial. Vê-se, portanto, a urgência de se deliberar a questão.

Outro item pendente é o projeto de lei que regulamenta as eólicas offshore. Aprovado na Câmara, o texto está no Senado — e acumula denúncias de diversos "jabutis", que desvirtuariam a intenção original. A iniciativa das eólicas tem a peculiaridade de beneficiar o Rio Grande do Sul, que precisa urgentemente de investimentos para reerguer a economia após as enchentes catastróficas de maio. O estado gaúcho acumula projetos que poderiam gerar 70 gigawatts de energia — um terço de todas as proposições em análise pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Outro estado que também reivindica avanços na produção eólica é o Ceará, igualmente com um conjunto de projetos relevantes na área. Há uma expectativa, ainda incerta, de que o Senado se debruce sobre esse tema em agosto, ao retornar do recesso.

Esses exemplos ilustram como a transição energética exige uma atuação firme, objetiva e transparente dos poderes públicos. O Estado não pode abrir mão do dever de regular atividades estratégicas para a sustentabilidade e o crescimento econômico. A definição de marcos regulatórios e a implementação de políticas públicas responsáveis e eficientes constituem passos fundamentais para o Brasil se tornar protagonista mundial na transição energética, pauta que mobiliza governos, empresas e a sociedade civil em todo o planeta.

Em agosto, espera-se que o Parlamento dê sinalizações concretas de que está comprometido com a agenda verde. Uma variável preocupante nesse processo são as eleições municipais, que tendem a sequestrar a atenção de deputados e senadores dos trabalhos legislativos. A cada dia de indefinição, o Brasil vê fechar à sua frente uma janela de oportunidades.

 

 

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