domingo, 3 de novembro de 2024

Autocracia S.A. - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Livro sustenta que dirigentes autoritários de diferentes países colaboram uns com os outros como se fossem um aglomerado empresarial

Não é que exista uma sala do mal, onde tiranos inspirados em vilões de filmes de James Bond se reúnem para conspirar contra o mundo livre, mas líderes autocratas estão se organizando e colaborando uns com os outros num modelo próximo do de aglomerados empresariais. Essa é a tese de "Autocracia S.A.", de Anne Applebaum.

O que une os autocratas contemporâneos não é um projeto ideológico. Não haveria como juntar num plano coerente de ideias o nacionalismo russo, o comunismo de mercado chinês, a teocracia iraniana e o bolivarianismo venezuelano. Mas todos eles (e vários outros) têm interesses pragmáticos comuns em encontrar meios de evitar sanções e reprimendas do Ocidente, aprimorar sistemas de vigilância e repressão interna e enfraquecer regimes que possam fazer-lhes oposição.

Segundo Applebaum, essa autocracia S.A. já é uma realidade. E, em grande parte, por culpa do Ocidente, que errou ao menos duas vezes. Em primeiro lugar, acreditou, ingenuamente, que bastaria expor países como Rússia e China à economia de mercado para que se tornassem democracias.

Em segundo, não criou um ambiente de negócios e que impeça lavagem de dinheiro e a evasão de sanções, privando-se das armas que teria para enfrentar tiranos e cleptocratas. Em tese seria possível fazê-lo, mas não são poucos os atores ocidentais que ganham com a prática. A autora, que fez extensa pesquisa, mostra vários desses esquemas, dando nomes aos bois.

De modo análogo, ela faz críticas pesadas à tibieza do Ocidente na regulação de fake news e da inteligência artificial. É por meio delas que países como a Rússia interferem em eleições e estimulam o crescimento de grupos hostis à democracia.

Chama também a atenção a evolução do pensamento de Applebaum. Ela era uma autora conservadora que mantinha vínculos com políticos de direita. Continua conservadora, mas afastou-se de várias figuras da direita, que deixaram de se importar com a deterioração de democracias. Em alguns momentos, sua pauta em favor de maior regulação se aproxima da de grupos de esquerda.

 

2 comentários:

ADEMAR AMANCIO disse...

Muito bom!

Anônimo disse...

https://youtu.be/j8zzL2aBo2M?si=n5NQGAP0XlEOnwvY

Capitaneado o maior projeto econômico da história, será que a prioridade da China seria fazer parte de uma confederação ou coalizão de regimes autocráticos?
Integram o BRI (Belt and Road Initiative) dezenas de países cujo sistema é democrático.

Liderado pela China, atualmente, a Iniciativa do Cinturão e Rota (BRI) envolve mais de 150 países e cerca de 30 organizações internacionais. Desde o lançamento do projeto em 2013, estima-se que o investimento total em infraestrutura e desenvolvimento econômico alcance cerca de 1 trilhão de dólares, com previsões de longo prazo indicando que os projetos ligados à BRI podem chegar a movimentar até 8 trilhões de dólares em investimentos nas próximas décadas​.